São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2008

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Chefe de polícia responsável por caso Jean Charles abdica

PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES

Depois de resistir firmemente no cargo por mais de três anos após o assassinato do eletricista brasileiro Jean Charles de Menezes, o chefe da polícia britânica, Ian Blair, acabou forçado a renunciar ontem por razões políticas, 16 meses antes do final de seu mandato.
Blair caiu porque o novo prefeito de Londres, Boris Johnson, do Partido Conservador, pediu a ele, "de modo agradável, porém firme", que deixasse o cargo. O chefe da Metropolitan Police é subordinado ao governo nacional (trabalhista, assim como o prefeito anterior, Ken Livingstone), mas trabalha em contato próximo com o prefeito londrino. Sem o apoio de Johnson, sua situação passou de frágil a insustentável.
Até o ultimo momento, o chefe da polícia se recusou a admitir a gravidade dos erros cometidos pela força desde que ele assumiu, em fevereiro de 2005. "Não estou renunciando por causa de nenhum fracasso da minha corporação nem por causa das pressões do trabalho. As muitas histórias sobre isso são exageradas", disse. Das 452 palavras de seu discurso, nenhuma era de desculpas.
Em nota, a família de Jean Charles se disse "chocada". Primo do eletricista, Alex Pereira usou uma metáfora: "A árvore leva um golpe grande, mas não cai. Cada pingo d'água que cai a partir daquele momento fará diferença, até derrubá-la. Mas é bom lembrar que a árvore só caiu porque tinha um golpe enorme", disse ele à Folha.

Desgaste
Blair ficou sob fogo cerrado desde os primeiros meses de seu mandato. O assassinato de Jean Charles ocorreu em 22 de julho de 2005, 15 dias depois de atentados a bomba deixarem 52 mortos em Londres. Uma investigação independente da polícia sobre a morte do brasileiro criticou duramente a desastrada operação e a conduta de Blair depois do incidente, por bloquear as investigações.
Nos últimos meses, Blair estava desgastado também por questões internas e administrativas. Era acusado por alguns de seus mais graduados auxiliares de manter uma política racista na corporação. Ontem, um jornal divulgou que ele pagou a um amigo para melhorar sua imagem, antes de assumir o cargo. Blair nega que tenha feito alguma coisa errada.
Na semana passada, a pressão cresceu, com o início da mais ampla e transparente investigação sobre o assassinato do brasileiro, que deve durar até dezembro. "Sua saída não muda nada", diz a família.
Na tarde do dia em que Jean Charles morreu, Blair dissera que a morte tinha "ligação direta com a operação antiterrorismo" e que "o homem se recusou a obedecer". Depois, a polícia ainda divulgou que o brasileiro usava roupas pesadas que poderiam encobrir bombas -o que era mentira- e que agia de modo estranho -o que imagens não confirmaram.
Durante seu tempo à frente da polícia, houve uma queda nos índices de criminalidade, mas um surto na morte de jovens em brigas de gangue espalhou uma sensação de insegurança em várias cidades britânicas. Blair deixa o cargo no dia 1º de dezembro, quando já deve ter sido escolhido seu sucessor.


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