São Paulo, terça-feira, 03 de novembro de 2009

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Eleição manca é novo golpe para EUA

Washington precisava de 2º turno para legitimar Karzai; governo forte é chave para estabilizar Afeganistão

Após presidente afegão ser reconfirmado, Obama liga para instá-lo a combater corrupção generalizada em seu segundo mandato

Ahmad Masood/Reuters
O presidente Hamid Karzai

JANAINA LAGE
DE NOVA YORK

A recondução ao cargo do presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, após a desistência do candidato opositor, Abdullah Abdullah, dificulta a tarefa do presidente dos EUA, Barack Obama, de redefinir a estratégia para a guerra no país asiático, que vem recrudescendo nos últimos tempos -outubro foi o mês mais letal do conflito para as tropas americanas.
Depois de um primeiro turno com fraude generalizada, de acordo com análise da ONU, o segundo turno representava uma tentativa de obter alguma legitimidade para a reeleição de um governo acusado seguidamente de corrupção. O fato de Karzai permanecer no poder sem um novo aval da população reduz as chances de construção de um governo legítimo no país, uma das metas dos EUA.
Obama conversou ontem com Karzai e pressionou o afegão a combater a corrupção em seu novo mandato. Obama disse a Karzai que quer ver ações e que iria monitorar a situação para assegurar o progresso no Afeganistão.
A pressão em privado contrasta com o discurso público dos EUA. O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, disse que "Karzai é o líder legítimo do país e não há razão para crer que os afegãos vão pôr essa legitimidade em dúvida [pela não realização do segundo turno]".
Obama ainda precisa decidir se atende ao pedido do general Stanley McChrystal, comandante das forças americanas e da Otan (aliança militar ocidental) no país, de envio de cerca de mais 40 mil soldados para se unirem aos 68 mil já no Afeganistão. Ontem, Gibbs voltou a dizer que os EUA decidirão nas próximas semanas qual é a melhor estratégia para combater a rede terrorista Al Qaeda.
Independentemente do número de soldados que atuem no país, os EUA têm afirmado que a estratégia visa fortalecer as instituições afegãs e as forças de segurança para que no futuro o país seja capaz de atuar sem a interferência dos EUA. Além disso, um Estado forte representaria uma alternativa à população no lugar das forças do Taleban. Um governo acusado de corrupção, em que o presidente vence a eleição porque o candidato opositor desistiu no segundo turno não é exatamente a solução esperada.
"Karzai precisa reformar e reduzir a corrupção em seu governo ou não vai funcionar, mesmo com um acréscimo nas forças americanas", afirma Michael O'Hanlon, membro sênior do instituto Brookings. Na avaliação de O'Hanlon, o fato de Karzai permanecer no cargo não terá grandes implicações para os EUA. "O ponto-chave foi que ele aceitou ter um segundo turno. Isso foi essencial. Como ele provavelmente venceria a eleição de qualquer forma, isso é mais um detalhe, e ele vai precisar fazer uma reforma no governo mesmo com um segundo mandato", disse.
Para Max Boot, especialista em Afeganistão do Council on Foreign Relations, não há muito a fazer em relação ao processo eleitoral no Afeganistão. Ele avalia que o assunto causa mais preocupação aos ocidentais do que ao povo afegão.
"Karzai tem bastante apoio na comunidade pashtun, onde a insurgência está baseada. Ele certamente tem tanta legitimidade quanto tinha Maliki [Nuri al Maliki, premiê] no Iraque em 2007. Nós podemos trabalhar com ele como fizemos no passado. O segredo é pressioná-lo por trás dos panos e não bater nele em público como alguns funcionários do governo têm feito. O Afeganistão é importante demais para a nossa segurança -pense no 11 de setembro- para colocarmos tudo a perder porque Karzai não é um líder perfeito ou mesmo um grande líder. Temos de trabalhar com o que temos."


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