São Paulo, quarta-feira, 04 de fevereiro de 2009

Próximo Texto | Índice

Renúncias causam primeira crise de Obama

Escolhido para ser secretário da Saúde desiste após se tornar o terceiro no governo a ter problemas com o fisco expostos

"Eu estraguei as coisas", diz presidente, sobre seleção de Tom Daschle; "czarina" dos gastos governamentais abdica por motivo similar

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Menos de 24 horas depois de dizer que apoiava "totalmente" o democrata Tom Daschle para o Departamento da Saúde, o presidente Barack Obama viu seu escolhido renunciar ao cargo por problemas tributários. É a primeira crise grave de um governo que completa 15 dias.
Desde que o caso veio a público, na sexta, revelou-se que Daschle sabia do problema com o fisco há mais tempo do que disse ao governo e antes de ser convidado. Além disso, já na nova administração, ele teria feito lobby por um cargo para Leo Hindery, proprietário da InterMedia Partners, para o Departamento de Comércio.
O problema é que o empresário em questão é o mesmo que pagou mais de US$ 1 milhão em salários a Daschle e que cedeu por um ano um carro com motorista ao político, a origem dos impostos não pagos pelo ex-senador, que chegam a US$ 130 mil. No mesmo dia, outra indicada por Obama retirou candidatura por problemas com impostos de renda não pagos.
Nancy Killefer era a "czarina da performance", convidada há um mês para fiscalizar os gastos governamentais, cargo subordinado à Casa Branca. Foi indicada no dia 7, quando Obama afirmou que ela ajudaria "a restaurar a confiança do povo americano no governo".
"Eu estraguei as coisas", disse Obama em uma das várias entrevistas que concedeu na tarde de ontem, usando a expressão em inglês "screw up". "Estou aqui na TV dizendo que estraguei as coisas, e isso é parte da era da responsabilidade. Não é nunca errar, mas assumir o erro e tentar não o repetir."
A crise marca o fim da breve lua-de-mel do novo governo com Washington. O clima permeou a entrevista coletiva de ontem na Casa Branca, quando os gracejos habituais entre o porta-voz, Robert Gibbs, e os repórteres deram lugar a uma nervosa série de perguntas.
"Eu acho que ambos [Daschle e Killefer] reconheceram que não se pode estabelecer um exemplo de responsabilidade e aceitar um padrão diferente para quem presta serviços", disse Gibbs. "Ambos reconheceram que suas indicações iriam ser um desvio às metas importantes" do presidente.
Ex-líder no Senado e parte do círculo próximo de Obama, o veterano político de 61 anos acumulava dois cargos. Era não só o indicado a secretário da Saúde, um posto importante para a implantação do programa de governo do democrata, como o que Obama chamou de "czar" do setor, responsável por reformá-lo. O segundo posto o colocava na Ala Oeste da Casa Branca, onde lidaria diretamente com o presidente.

63 itens
Com a dupla de ontem, são três os indicados de Obama que revelaram ter problema com o fisco. Completa o grupo o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, que deixou de pagar o devido durante sua passagem pelo FMI. No seu caso, no entanto, a oposição avaliou que uma eventual rejeição deixaria os mercados em pânico e aumentaria ainda mais a crise econômica, e ele foi aprovado.
Agora também são três os que retiraram sua candidatura antes de passar pela aprovação no Senado. O terceiro é o governador do Novo México, o democrata Bill Richardson, indicado ao Departamento do Comércio, mas que desistiu por suspeitas de corrupção.
Os casos colocam em dúvida a qualidade do processo de checagem por que passaram os convidados por Obama, tido como extremamente rigoroso -indicados tinham de responder a questionário com 63 itens. Os cargos políticos que cada presidente aponta ao assumir somam 3.300, e um terço precisa de aval do Senado.
Todos são checados, mas, quanto mais importante o cargo, caso de Daschle, Geithner e Richardson, teoricamente mais rigorosa é a investigação. O fato de os pecadilhos do trio só terem vindo a público depois de Obama ter anunciado oficialmente seus nomes fragiliza o presidente no momento em que ele luta para aprovar no Senado seu pacote de estímulo econômico de US$ 900 bilhões.
Ontem ainda, Obama anunciou o terceiro republicano do ministério: o senador Gregg Judd, de New Hampshire, aceitou o convite para ser secretário do Comércio. Também aqui, o tiro saiu pela culatra.
Obama teria convidado Judd para reforçar um suposto espírito bipartidário, mas também para alterar o equilíbrio de forças do Senado, onde a situação têm maioria apertada. Pelas regras de New Hampshire, o governador do Estado, democrata, apontará o substituto.
Mas o republicano aceitou o convite só após obter um acordo para que o governador mantenha a vaga com seu partido. À noite, foi confirmado o nome de Bonnie Newman, ex-chefe de equipe de Gregg.


Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.