São Paulo, quarta-feira, 04 de fevereiro de 2009

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Eutanásia de italiana opõe Justiça a governo e Vaticano

Eluana Englaro, em coma há 17 anos, foi transferida ontem para clínica particular que aceitou desligar sua sonda de alimentação

DA REDAÇÃO

A iminência do desligamento da sonda que alimenta, hidrata e mantém viva em estado vegetativo, há 17 anos, a italiana Eluana Englaro, 37, levou o Vaticano a classificar ontem como um "assassinato" o procedimento que deve permitir a sua morte, após meses de batalhas jurídicas e tentativas do governo conservador do primeiro-ministro Silvio Berlusconi de dificultar o cumprimento da decisão judicial.
Ontem a paciente foi transferida para uma clínica particular em Udine (nordeste da Itália) que se dispôs a desligar o tubo de alimentação, sob o protesto de ativistas contra a eutanásia que cercaram a ambulância que saía de Lecco, cidade próxima a Milão, com gritos de "Acorde, Eluana" e "Não a matem!".
O pai de Eluana, Beppino Englaro, havia obtido, em julho de 2008, uma liminar do Tribunal de Apelação de Milão permitindo que sua filha -em coma desde que sofreu um acidente de carro- parasse de receber alimentos artificialmente.
A Promotoria italiana apresentou em seguida recurso ao Tribunal Constitucional da Itália. Uma decisão de última instância favorável à família foi dada pela Justiça em novembro último. A legislação italiana não reconhece o direito à eutanásia, embora a jurisprudência autorize aos pacientes o direito de não se alimentar.
Há um mês, seguindo-se à decisão do Tribunal Constitucional, o ministro do Bem Estar italiano (responsável pela área de saúde), Maurizio Sacconi, criou normas que ameaçavam com sanções os hospitais públicos que não garantissem a continuidade da vida de pacientes em estado vegetativo.
Com a transferência para a clínica particular em Udine e o desligamento da sonda de alimentação, espera-se que Eluana venha a morrer em algumas semanas.
Em entrevista ao jornal "La Reppublica", o presidente do Pontifício Conselho para a Saúde, o cardeal mexicano Javier Lozano Barragán, declarou que a decisão tomada sobre o caso é "um abominável assassinato".
O ministro Sacconi afirmou que "se trata de uma pessoa em estado vegetativo, não em condições de morte cerebral, que não sofre de "obstinação terapêutica", mas que está submetida a hidratação e alimentação".
O termo "obstinação terapêutica" está no centro de uma distinção crucial para a Igreja Católica em casos como esses. Para a igreja, tanto quanto a eutanásia, é em princípio condenável a extensão da vida por meios "desproporcionais", que neguem a "inevitabilidade e inelutabilidade da morte".
Em decisão sobre o tema, a Academia Pontifícia para a Vida (grupo criado pelo papa João Paulo 2º para estudos de problemas bioéticos) afirmou há dez anos que "o respeito pela pessoa em processo de morte exige mais que nunca o dever de evitar toda a espécie de "obstinação terapêutica" e de favorecer a aceitação da morte".
Para Francisco Borba, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, "esse é um problema crítico", mas, na dúvida, "deve-se optar por uma solução de esperança". "De modo geral, a igreja é contrária ao desligamento de aparelhos", ele diz.


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