São Paulo, sexta-feira, 04 de fevereiro de 2011

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Revolução árabe é caminho sem volta, diz analista

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Uma revolução que seria impossível sem o Google e o Twitter já transformou para sempre o Egito e o mundo árabe. Para o especialista em Oriente Médio Walid Kazziha, da Universidade Americana do Cairo, mesmo que o desfecho seja o retorno à ditadura militar, os protestos despertaram uma fome de liberdade que dificilmente poderá ser abafada. Um efeito dominó no mundo árabe, prevê, é quase inevitável.

 

Folha - Como um protesto espontâneo conseguiu em poucos dias o que anos de oposição formal no Egito não alcançaram?
Walid Kazziha - Não é que um bando de pessoas decidiu de repente protestar numa praça do Cairo. Há muito tempo jovens têm trocado ideias na internet. Inspirados na queda do regime tunisiano, eles marcaram o protesto do último dia 25 para demonstrar a insatisfação de várias partes da sociedade egípcia contra o regime.
Nem a Irmandade Muçulmana nem outros partidos de oposição tiveram parte nisso. Este é um movimento sem liderança, formado por jovens de classe média, que domina a internet e que tem objetivos sociais, econômicos e políticos muito claros. Quer mais igualdade e democracia.

A desigualdade existe há muito tempo, assim como a falta de liberdade. Porque só agora o movimento surgiu?
A internet foi crucial, pois permitiu uma comunicação rápida e ampla e deu a abertura para o mundo exterior.

Mubarak já disse que não concorrerá a mais um mandato, mas isso não terminou os protestos. Qual a saída?
Quando Mubarak fez o discurso, muitos simpatizaram com ele, até entre os manifestantes. Mas a violência de anteontem acabou fortalecendo o movimento. Agora há basicamente dois caminhos. Ele poderá sucumbir à pressão e sair, abrindo caminho para que o vice conduza o país a um novo regime, mais liberal. O outro caminho é que o Exército restabeleça uma ditadura militar. O que parece claro é que os protestos não terminarão enquanto Mubarak estiver no poder.

Para que lado o Exército tende a caminhar?
Até agora o Exército manteve uma posição neutra. Manteve-se leal a Mubarak, mas não agiu para reprimir os oponentes do governo. Se o atual impasse permanecer, o Exército terá de escolher [um lado].

A alternativa a Mubarak é uma teocracia islâmica, como teme-se no Ocidente?
Havia a mesma expectativa na Tunísia e ela não se materializou. Aqui temos uma situação semelhante. A Irmandade Muçulmana é um partido político organizado, mas com influência limitada.

Os EUA de Bush fizeram uma tímida tentativa de promover a democracia na região. Agora Obama defende a saída de Mubarak. Isso é positivo?
É pouco e tarde demais. Se os protestos mostraram algo é que a democratização não ocorre de fora para dentro, mas é um processo interno.

O sr. crê que o Egito criará um efeito dominó na região?
Se esse movimento resultar num Egito mais liberal, terá um enorme impacto regional. Afetará o conflito árabe-israelense, e as outras sociedades árabes serão inspiradas. Um efeito dominó é perfeitamente possível.


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