São Paulo, sexta-feira, 04 de abril de 2008

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Europa apóia escudo antimísseis dos EUA

Otan aprova bases no Leste Europeu contestadas pela Rússia; em contrapartida, Ucrânia e Geórgia ficam fora da aliança

Projeto visa interceptar mísseis de longo alcance; EUA acenam com ameaça iraniana, mas tardaram sete anos a convencer aliados

Gerald Herbert/Associated Press
Bush entre dirigentes da Otan em Bucareste; promessa de ampliar "círculo da liberdade" foi adiada

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BUCARESTE

Os Estados Unidos receberam ontem o apoio unânime dos aliados da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) para a ampliação de seu polêmico sistema antimísseis na Europa Oriental, um projeto contestado com veemência pela Rússia. Mas o primeiro dia da reunião de cúpula da aliança militar, em Bucareste (Romênia), também marcou uma importante vitória de Moscou, com o adiamento do plano que abriria as portas da Otan a duas ex-repúblicas soviéticas, Geórgia e Ucrânia.
Com o respaldo da Otan, os EUA agora podem seguir adiante com o projeto de instalar dez plataformas de lançamento de mísseis na Polônia e estações de radares na República Tcheca. O sistema é considerado uma ameaça pela Rússia, que, no ano passado, chegou a dizer que apontaria seus mísseis para a Europa Oriental se o plano americano prosperasse.
Num encontro paralelo à cúpula de Bucareste, americanos e tchecos anunciaram o acordo para a instalação dos radares, que deve ser assinado no próximo mês. Segundo um comunicado dos EUA, a proliferação de mísseis balísticos (intercontinentais) é "uma ameaça crescente às forças, territórios e populações dos países aliados".

Amaciando Moscou
Os russos não acreditam no argumento americano de que o escudo antimísseis tem como objetivo um possível ataque de países inimigos, como o Irã, e se sentem ameaçados pelo sistema instalado em uma região da antiga esfera de influência soviética. Segundo o ministro da Defesa de um país da Otan ouvido pela Folha, a diplomacia americana preparou o terreno para que o apoio da aliança ao escudo não represente uma crise nas relações com Moscou.
"A idéia é propor que o escudo seja integrado ao sistema de defesa da Rússia", disse o ministro, adiantando que esse será um dos principais assuntos do encontro que os presidentes George W. Bush e Vladimir Putin terão no domingo, no balneário russo de Sochi, às margens do mar Negro.
Rivalidades à parte, Bush pode comemorar uma importante vitória nos esforços americanos de convencer seus aliados dos méritos do sistema de defesa. A idéia é combinar o novo escudo, idealizado para interceptar mísseis de longo alcance, com o sistema operado pela Otan, capaz de dar proteção contra ameaças mais próximas, que são a preocupação de países como Turquia, Grécia, Bulgária e Romênia, mais próximos do perigo iraniano.
Para ilustrar a mudança de atitude dos europeus, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, disse que, quando Bush participou de sua primeira cúpula da Otan, há sete anos, "talvez só dois aliados tenham dado apoio morno à idéia de um sistema de mísseis". Em seguida, alfinetou Moscou, dizendo que o endosso representava um marco, que isolava a Rússia na oposição à idéia.

Consolo de luxo
O apoio da Otan também serve como um consolo de luxo para Bush, que esperava deixar Bucareste com a garantia de que havia ampliado o que chama de "círculo da liberdade", com a oferta à Ucrânia e Geórgia do plano de adesão à Otan, uma espécie de ante-sala ao convite formal. Sua campanha esbarrou na firme resistência de alguns países europeus, encabeçados pela Alemanha.
Em busca de uma fórmula que não representasse uma derrota clara para nenhum dos lados, os aliados se limitaram a prometer que "um dia" os dois países se tornarão membros da aliança, rejeitando a pressão americana para que eles entrassem na rota da adesão.
"Nós concordamos que esses países se tornarão membros da Otan", disse o secretário-geral da Otan, Jaap de Hoop Scheffer. "E isso é muita coisa."
O passo adiante na integração ao sistema de defesa atlântico foi concedido a Croácia e Albânia, que receberam o convite oficial para aderir à aliança. A Macedônia, que também é candidata, teve o convite adiado devido a um veto da Grécia, que exige a mudança do nome da ex-república iugoslava.
"É um final feliz, depois de uma longa história de sofrimento", disse à Folha o presidente albanês, Bamir Topi. Além da ampliação para o leste e do apoio ao sistema americano, o comunicado da cúpula de Bucareste também ressaltará os planos da aliança de manter a operação no Afeganistão.


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