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Pobre e isolado, Níger organiza referendo sob temor de violência
Presidente busca reeleição ilimitada e aumento de poder em votação hoje
ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO
Em região semidesértica,
paupérrima e quase sem infraestrutura, o Níger entra hoje
para o crescente grupo dos países cujos mandatários puseram
em marcha referendos a fim de
permitir a reeleição ilimitada.
Para isso, o presidente Mamadou Tandja, 71, passou por
cima do Parlamento e do Tribunal Constitucional. Ambos
se opuseram à votação e foram
sumariamente dissolvidos.
Nas últimas semanas, milhares de pessoas tomaram as ruas
da capital nigerina, Niamey, em
manifestações contra o referendo e a abolição das instituições democráticas. Em 15 de julho, um ato terminou em confronto com a polícia.
Há temores de mais violência. A Frente para a Defesa da
Democracia (FDD), grupo que
uniu 20 ONGs e partidos de
oposição, considera o presidente culpado de "alta traição" e
promete fazer de tudo para bloquear a votação de hoje.
O risco de instabilidade preocupa não só vizinhos como a
Nigéria, já ocupada com seus
próprios conflitos internos, como parceiros comerciais como
a França, ávida consumidora
das reservas de urânio locais.
Os EUA exortaram norte-americanos a não viajar ao Níger por enquanto. "Cidadãos
americanos devem estocar
água, comida e artigos de necessidade básica devido a possíveis interrupções na distribuição de suprimentos e serviços",
informou o governo em nota.
O referendo visa aprovar
uma nova Constituição, que daria a Tandja mais três anos no
poder -em período de transição-, eliminaria limites para
reeleição e concentraria poder.
O Níger já foi alvo de três golpes de Estado desde a independência, conquistada da França
em 1960, e opositores afirmam
que Tandja está lentamente
preparando o quarto.
Condenação externa
Os defensores do presidente
afirmam que Tandja, eleito em
1999 e reeleito em 2004, merece continuar governando por
ter trazido crescimento econômico ao país. Mesmo com crescimento do PIB esbarrando 5%
ao ano, o Níger ocupava em
2008 a 174º posição no Índice
de Desenvolvimento Humano
da ONU, que avaliou 177 países.
A União Europeia (UE), a
ONU e organismos africanos
têm visto a situação com preocupação e tentam, com ameaças de sanções, evitar o referendo. A UE suspendeu parte da
ajuda ao Níger.
Mas críticos temem que o comércio de urânio (do qual o
país é o quarto produtor mundial) enfraqueça a condenação.
Um terço do urânio usado para
energia nuclear da França, por
exemplo, é originado no Níger.
Tandja também tem acordos
com a China no valor de mais
de US$ 5 bilhões para a exploração de petróleo no país.
Apesar da tensão, um diplomata estrangeiro que falou à
Folha em condição de anonimato afirmou que o clima nas
ruas da capital nigerina é calmo. "Não há presença anormal
de policiais nas ruas", disse, por
telefone, de Niamey.
A expectativa geral é que o
referendo será favorável ao
presidente. Segundo o diplomata, os críticos têm sido incapazes de engajar a população.
"A oposição já é conhecida do
povo desde eleições passadas, e
historicamente tem pouco poder de convencimento."
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