São Paulo, sábado, 04 de setembro de 2010

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Iraque pede presença maior do Brasil

Ex-guerrilheiro, 1º embaixador iraquiano pós-Saddam em Brasília quer o país no "mercado da reconstrução"

Diplomata reabre posto que estava vago desde 2002 e diz que fim do impasse político no país reforçará a segurança


Sérgio Lima/Folhapress
Hussen na Embaixada do Iraque em Brasília, que passou por ampla reforma e vem aumentando número de funcionários

SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O novo embaixador do Iraque no Brasil, Baker Fattah Hussen, passou dez anos na clandestinidade, enfrentando frio e fome enquanto lutava na guerrilha contra as forças de Saddam Hussein. Perdeu em combate parte dos movimentos da mão esquerda e sobreviveu por milagre a um bombardeio com gás letal. Só voltou a pisar em Bagdá após a invasão que derrubou Saddam, em 2003.
A exemplo de muitos curdos, Hussen passou de oprimido a protagonista político. Amigo e ex-companheiro de luta do presidente Jalal Talabani, também curdo, Hussen assumiu há um mês um posto que estava vago desde 2002.
O comércio bilateral está longe dos vultosos números dos anos 80, mas as exportações brasileiras para o Iraque se recuperam bem após passarem incipientes anos 90 -US$ 700 milhões em 2009. Em entrevista à Folha, ele disse que o Brasil só terá condições de disputar o mercado da reconstrução iraquiana, avaliado em US$ 400 bilhões, quando reabrir a Embaixada em Bagdá.

Folha - Por que demorou sete anos até o Iraque pós-Saddam mandar um novo embaixador ao Brasil?
Baker Fattah Hussen
- Quisemos ampliar as relações diplomáticas do novo governo iraquiano logo após a queda de Saddam Hussein.
Mas o pós-guerra foi muito difícil. Os ministérios estavam totalmente desorganizados, tivemos que remontar toda a estrutura de governo.
Era mais fácil na época do regime antigo. Bastava uma ordem presidencial para que qualquer assunto fosse resolvido. Na passagem para o sistema democrático, o processo ficou mais complexo. Uma nomeação de embaixador precisa passar pela Presidência e pelo Parlamento até ser implementada.

Qual a sua principal missão?
Várias delegações iraquianas visitaram o Brasil desde a queda de Saddam, mas ainda não há acordos comerciais concretos. Estou aqui para convidar empresas brasileiras a visitar o Iraque, a empreender e fazer investimentos. Queremos convencer os brasileiros a participar da reconstrução do Iraque.
Mas isso só será possível se o Brasil estiver fisicamente presente no país.
Dias antes de eu embarcar para Brasília, o presidente Talabani e o chanceler Hoshyar Zebari me convocaram para reforçar pessoalmente que a reabertura da Embaixada do Brasil em Bagdá é uma prioridade. Mencionei esse tema com o presidente Lula no último dia 5, ao apresentar minhas credenciais.
Acho que até o fim do ano a embaixada estará pronta.

A segurança e o custo da Embaixada do Brasil em Bagdá geram muita preocupação...
A segurança das representações estrangeiras está sob inteira responsabilidade das autoridades iraquianas. Há várias embaixadas em Bagdá funcionando normalmente.
Prometo que faremos todo o possível para fornecer a segurança necessária aos brasileiros. As autoridades iraquianas já provaram sua capacidade de fornecer segurança às embaixadas.

Mas ainda há muitos ataques.
Houve muitos atentados em 2006 e 2007, mas a situação melhorou muito.
Isso dito, remanescentes do partido Baath e membros da Al Qaeda ainda lançam alguns ataques. E o impasse político que inviabilizou a formação de um governo nacional, sete meses após as eleições legislativas, cria um vácuo de poder perigoso.
Estamos preocupados. Mas se os partidos conseguirem formar um governo que represente toda a diversidade política do país, isso fortalecerá muito a segurança.

Como se sente, enquanto curdo, ao ser hoje um representante de todos os iraquianos?
Hoje me sinto como um cidadão normal, e não mais como um cidadão de quarta categoria. Sentir-se e ser tratado como qualquer outro iraquiano é algo muito especial para todos os curdos.


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