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ANÁLISE
A duvidosa dignidade de cada cultura humana
JOÃO PEREIRA COUTINHO
COLUNISTA DA FOLHA
Claude Lévi-Strauss concedeu em 1979 uma entrevista ao
"Le Monde". É um documento
notável para observarmos a cabeça de um contra-iluminista.
Para ele, o século 20 foi um
longo cortejo de horrores: genocídios, fascismos etc. Porém,
esse cortejo não poderia ser explicado por qualquer anti-humanismo. Para ele, o horror do
século 20 era consequência lógica do humanismo ocidental
levado aos extremos.
As palavras de Lévi-Strauss
interessam porque o ilustre
pensador parecia esquecer, ou
ignorar, que os horrores do século 20 não são apenas explicados pelos excessos do iluminismo continental. Os campos de
concentração seriam explicados pelos excessos do contra-iluminismo continental: esse
movimento fortemente irracionalista do qual ele foi um dos
grandes herdeiros.
Se, como afirmava o compatriota Joseph De Maistre, não
existe o "ser humano" abstratamente considerado, o que resta
são culturas particulares, dotadas de escolhas que têm de ser
respeitadas e, no caso de Lévi-Strauss, preservadas na sua
"pureza" intocada. Ao negar-se
qualquer padrão objetivo de
avaliação crítica, todas as sociedades e culturas passam a estar
no mesmo plano moral.
O mais perverso deste raciocínio é que um regime como o
da Alemanha nazista será tão
válido como uma democracia
liberal. Ao pretender evitar as
consequências nefastas do racionalismo, Lévi-Strauss caiu
na posição oposta: a defesa holística das culturas humanas e
da duvidosa dignidade de cada
uma delas.
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