São Paulo, segunda-feira, 05 de janeiro de 2009

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ENTREVISTA
EYAL ZISSER


Israel sabe que derrubar Hamas não é realista

País quer cessar-fogo com supervisão internacional como no Líbano, diz analista

"O importante é saber se o poder de dissuasão de Israel saiu fortalecido, e a ofensiva militar serviu para isso", diz professor de Tel Aviv

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A SDEROT (ISRAEL)

A intransigência do Hamas, que não dialoga com Israel nem reconhece seu direito de existir, tornou a ofensiva em Gaza inevitável. A opinião é de Eyal Zisser, para quem Israel gostaria de tirar o grupo do poder, mas sabe que isso exigiria a indesejável reocupação de Gaza.

 

FOLHA - Entre os supostos objetivos de Israel nesta ofensiva, há um declarado, a suspensão dos disparos de foguetes de Gaza, e um não-declarado, que é derrubar o Hamas. Ambos parecem inalcançáveis. Quais as metas realistas?
EYAL ZISSER
- Reocupar a faixa de Gaza é possível, mas isso não interessa a Israel. O objetivo da ofensiva é obter um acordo de cessar-fogo como no Líbano [em 2006], para colocar um fim ao disparo de foguetes. Isso incluiria algum tipo de supervisão internacional que impeça o disparo de foguetes e também controle a fronteira de Gaza com o Egito, para não permitir a entrada de armas. Acho que Israel gostaria de tirar o Hamas do poder, mas entende que esse não é um objetivo realista. Para derrubar o Hamas, é preciso não apenas entrar em Gaza. É necessário controlar o território, o que Israel não quer voltar a fazer.

FOLHA - Qual será o impacto dos ataques sobre o Hamas?
ZISSER
- O Hamas sofreu um golpe muito duro e acho que aprendeu uma lição, mas não foi destruído. O resultado é que, no futuro, será mais cuidadoso em seu confronto com Israel. Nada além disso.

FOLHA - Israel corre o risco de obter justamente o oposto, fortalecendo o Hamas politicamente, como ocorreu com o Hizbollah no Líbano?
ZISSER
- Sim, isso é o que sempre acontece nesse tipo de confronto, e só não se repetirá agora se o Hamas não conseguir sobreviver. E não vejo, no momento, uma alternativa com credibilidade, então a população continuará apoiando o Hamas. Mas é preciso lembrar também que esse é um fortalecimento ilusório. No Líbano, o Hizbollah sofreu sofreu grandes perdas. Grupo nenhum escapa ileso de mais de um mês de ataques. Foi enfraquecido, mas conseguiu vender a idéia de que ficou mais forte. Na situação atual de Gaza, deve acontecer a mesma coisa: aconteça o que acontecer, o Hamas cantará vitória. O importante é saber se o poder de dissuasão de Israel saiu fortalecido, e eu acho que, tanto no Líbano como em Gaza, a ofensiva militar israelense serviu para isso. Então, quem exatamente saiu fortalecido?

FOLHA - O governo israelense afirma que o objetivo da ofensiva em Gaza é estabelecer uma "nova realidade". Isso significa um novo cenário político?
ZISSER
- Depois de oito anos de disparos, se houver calma no sul de Israel e o Hamas não ousar fazer provocações, lançar mais foguetes, essa será uma nova realidade. Ainda é cedo para dizer se ela incluirá um novo cenário político. Se a ofensiva fosse interrompida agora, sem dúvida o Hamas sobreviveria. Numa visão mais abrangente, incluindo outros inimigos, como Irã e Síria, não vejo mudanças. Mas o fato de os regimes árabes silenciarem sobre a operação israelense significa que a maioria apóia Israel contra o Hamas.

FOLHA - O primeiro-ministro Ehud Olmert disse que a ofensiva era inevitável. Mas, olhando para os últimos três anos, desde a eleição do Hamas, Israel não poderia ter agido para evitar essa escalada?
ZISSER
- Não era possível evitar por um motivo simples: o Hamas se recusa a dialogar com Israel e a reconhecer o seu direito de existência. Foi essa intransigência que levou à escalada atual.

FOLHA - Não está claro se Israel tem um plano político para o pós-guerra. Qual deveria ser a estratégia política israelense após a ofensiva?
ZISSER
- Não sei se Israel tem um plano, mas sinceramente espero que sim. Na minha opinião, o plano político deve estar casado com o plano militar. O objetivo deve ser chegar a uma situação em que o Hamas esteja suficientemente enfraquecido para que possa haver um acordo, com a ajuda da comunidade internacional, em que o grupo não queira e não possa disparar mísseis contra Israel. Depois disso, a condição básica para que Israel possa entrar em negociações com o Hamas é que o grupo reconheça seu direito de existir. Mas isso não parece estar nos planos do Hamas.

FOLHA - Há sinais de que o Hamas poderia voltar a se unir ao Fatah para obter trégua e dialogar com Israel indiretamente. O Fatah, mesmo sendo aliado de Israel, teria legitimidade para unir os palestinos?
ZISSER
- Nenhum regime árabe é legítimo, a questão é se ele é forte. Se o Fatah servir de interlocutor confiável para os dois lados e conseguir passar a imagem entre os palestinos de que salvou a faixa de Gaza do caos, talvez isso seja possível.


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