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ENTREVISTA - RONNIE BRUNSWIJK
Líder maroon vê retaliação no ataque a garimpeiros
Parlamentar surinamês afirma que brasileiros mataram 68 nos últimos anos
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
FÁBIO ZANINI
ENVIADOS ESPECIAIS AO SURINAME
Principal liderança política
dos descendentes de escravos
africanos do Suriname, o parlamentar Ronnie Brunswijk, 49,
condena, em entrevista à Folha, o ataque contra garimpeiros brasileiros em Albina, na
véspera do Natal.
Ao mesmo tempo, diz identificar no episódio uma reação a
anos de violência conduzida
por brasileiros contra os negros, conhecidos localmente
como maroons ("morenos", como são chamados pelos brasileiros radicados no Suriname).
Nos anos 80, Brunswijk liderou uma revolta militar de maroons que levou a uma guerra
civil no país. Hoje, é empresário
dono de garimpos e será candidato a presidente do Suriname na eleição marcada para maio.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
FOLHA - Como avalia o episódio?
RONNIE BRUNSWIJK - Nos últimos
anos os brasileiros mataram 68
pessoas. Não só em Albina. Lá,
foram três no ano passado. Mas
meu partido não aceita e não
apoia o que houve em Albina.
FOLHA - Foi reação a esses assassinatos de maroons por brasileiros?
BRUNSWIJK - Sim. Os negros do
mato não são fáceis. O cara que
morreu [deflagrando a crise]
era um tipo de gângster. Nem
por isso ele poderia ser morto.
Você não poderia ter queimado
casas, não pode estuprar mulheres.
FOLHA - Por que tantos estupros?
BRUNSWIJK - Não sei. As brasileiras vão lá para ser prostitutas. Talvez eles [os maroons]
tenham a ideia de que tinham o
direito de fazer isso.
FOLHA - Acha que os brasileiros poderão voltar a trabalhar em Albina?
BRUNSWIJK - Sim. Mas sei que
os brasileiros estão com medo.
Eu também estaria se fosse
eles. Ontem [anteontem], fui a
uma rádio de maroons e falei
por duas horas sobre a situação,
orientando-os a não brigar com
os brasileiros. Não há uma briga especial com os brasileiros.
Segundo o que as pessoas disseram aos policiais, cerca de 16 ou
20 pessoas brigaram. O resto
estava lá apenas para roubar,
para fazer um dinheiro fácil.
FOLHA - Muitos maroons acusam brasileiros de tomar o ouro do país.
BRUNSWIJK - Quando os brasileiros vão para o garimpo, eles
voltam e compram muitos
equipamentos, rádios, carros,
comida. Todo esse dinheiro vai
para a economia da área. O que
é preciso fazer? Um bom controle. Você tem que manter os
brasileiros aqui. Se não está legal, têm de vir para Paramaribo
e se registrar.
FOLHA - O que aconteceu em Albina pode acontecer de novo?
BRUNSWIJK - É preciso ter muito cuidado. Essa situação pode
levar muita gente a [fazer algo parecido].
FOLHA - Todos dizem que a polícia
é conivente com os maroons.
BRUNSWIJK - Não é verdade.
Talvez não haja a máxima proteção. O governo não pode proteger de maneira especial os
brasileiros. O que ele tem de fazer é proteger todo mundo.
FOLHA - Qual é a situação atual dos maroons?
BRUNSWIJK - Antes da guerra civil, os maroons eram a última
classe do Suriname. Mas, desde
que os brasileiros chegaram, a
vida melhorou. Os maroons
aprenderam a buscar ouro. Antes, não tínhamos nem sequer
um prato de arroz. E tivemos
que partir para a solução militar. Hoje, a democracia voltou.
FOLHA - Sua base política é exclusivamente de maroons?
BRUNSWIJK - A base é maroon.
Mas não é verdade que meu
partido seja étnico. Nós queremos representar todo mundo.
Queremos representar a parte
pobre, tentamos ajudá-los como Lula ajudou. Somos um
partido nacional.
FOLHA - Por que nunca houve um presidente maroon?
BRUNSWIJK - Porque os maroons nunca se importaram
com eleições. Nunca entenderam a ferramenta que é ter um
partido.
FOLHA - Na eleição, o tema dos brasileiros será discutido?
BRUNSWIJK - Alguns vão transformar isso num tema. Eu tenho medo disso. Tentam enganar os maroons e prometer mandar todos os brasileiros embora. Mas isso não é possível. Eles dizem isso para criar
problemas para mim.
FOLHA - O sr. está usando uma camisa de seu partido e calça militar. É
como o sr. se vê, 50% político e 50% militar?
BRUNSWIJK - Sou ainda um militar. Um militar, numa situação
como a de Albina, sabe o que fazer, como lidar com a situação.
Acho que todos os presidentes
devem ser militares.
FOLHA - O que aconteceu no país nos anos 80 pode se repetir?
BRUNSWIJK - Não há mais lugar
para golpes de Estado. Ninguém vai aceitar isso, internacionalmente. Tudo você tem de
fazer por eleições.
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