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SUCESSÃO NOS EUA / DECISÃO REPUBLICANA
Imigração divide Estado de McCain
Cidade na fronteira do Arizona com o México ilustra situação de minoria latina, cobiçada por candidatos
Proposta de semi-anistia a ilegais feita pelo senador, que depois voltou atrás, leva os ultraconservadores a apoiarem Mike Huckabee
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A NOGALES
(ARIZONA)
Nogales são duas cidades,
com o mesmo nome, cidadãos
com as mesmas feições e a mesma língua predominante, o espanhol. A diferença é que uma
está no Arizona, EUA, e a outra,
no México, separadas por um
posto de fronteira.
A simbiose faz com que, nas
ruas do lado americano, os democratas, historicamente mais
próximos dos hispânicos do
país, pareçam prevalecer sobre
os republicanos, e o favorito
destes nas prévias, John
McCain, embora senador pelo
Arizona, não tenha tanto prestígio nas ruas quanto Barack
Obama ou Hillary Clinton.
No Estado (um dos quatro
dos EUA a fazer fronteira com o
México), que tem hoje prévias
democratas e republicanas, as
pesquisas dão vantagem a
McCain e Hillary. Bush venceu
lá em 2000 e em 2004.
A população latina do Arizona é a sexta dos EUA: 1,8 milhão, ou 29,2% dos habitantes
-o dobro da média nacional.
Destes, 37% estão aptos a votar.
Já em Nogales, mais de 90%
dos 21 mil habitantes têm ascendência latina. Após percorrer 300 km de carro desde
Phoenix, numa planície desértica com cactos, ranchos, shopping centers e condomínios de
casas ocres, a reportagem da
Folha visitou a cidade.
É lá que fica a maior unidade
da US Border Patrol, a patrulha
de fronteira. No escritório central, um pôster proclama, sobre
os dados de 2007: "Líder nacional: 90.559 apreensões de estrangeiros ilegais, 1,36 tonelada
de maconha apreendida".
Semi-anistia
Em tese, McCain até poderia
ter uma boa acolhida em Nogales. Foi ele quem propôs um
projeto de lei que previa uma
semi-anistia para os mais de 12
milhões de imigrantes ilegais
dos EUA, rejeitada ano passado
pelo Senado. Entre os republicanos, é visto como excessivamente à esquerda no tema.
Mas é só em tese. "McCain é
um camaleão, um híbrido de
idéias republicanas e democratas. Pressionado, é claro que ele
se voltará contra os imigrantes", afirma Teresa Leal, responsável por um museu que
conta a história dos índios pimas, os nativos da região.
Questionada sobre o recuo
de McCain, que disse semana
passada que não apresentaria
hoje o projeto, diz não se surpreender. "A imigração é uma
válvula manipulada pela política ao sabor da situação."
(A posição, digamos, flexível
de McCain fez com que o grupo
Minuteman, de milícias ultradireitistas que caçam imigrantes na fronteira, anunciasse
apoio a Mike Huckabee.)
Teresa Leal, ela própria descendente de pimas, é "residente permanente" nos EUA. Diz
que não pede cidadania, e portanto não vota, por princípio:
"Estamos aqui há 700 anos, e
nós que somos estrangeiros?".
Outros moradores, até por
receio da língua, jamais pediram cidadania. Caso do aposentado Manuel Valle, 70, que, se
pudesse, votaria em Hillary,
pois "[Bill] Clinton foi bom para os hispânicos".
E, sim, há eleitores de
McCain. "Ele é do Arizona, conhece os problemas daqui", defende Mario Córdoba, 48, de ascendência mexicana. Com duas
gerações da família nos EUA,
ele tem uma visão dura em relação à imigração. "Os ilegais estão acabando com a economia,
o resto da população é obrigado
a pagar hospital e educação para eles. Não sou contra imigrantes, mas desde que trabalhem para se legalizar."
Num dia inteiro em Nogales,
a reportagem só achou três
americanos típicos: dois patrulheiros e uma moradora desiludida com a política, mas eleitora democrata. "Estou mais para
Obama, mas estou confusa", diz
Kathy, sem dar o sobrenome.
Há nas ruas muita gente da
vizinha mexicana, conhecida
como Nogales Sonora, que
atravessa para fazer compras,
em lugares como "Tienda de
Gangas Andres".
Não foi possível ir a Nogales
Sonora -o repórter não tinha
visto. De longe dá para ver que
há favelas, fruto do inchaço da
população, que chega para arriscar o sonho americano. O
censo de 2005 registrou 195 mil
habitantes. Mas dizem na fronteira que já há mais de 300 mil.
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