São Paulo, terça-feira, 05 de fevereiro de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA / DECISÃO REPUBLICANA

Imigração divide Estado de McCain

Cidade na fronteira do Arizona com o México ilustra situação de minoria latina, cobiçada por candidatos

Proposta de semi-anistia a ilegais feita pelo senador, que depois voltou atrás, leva os ultraconservadores a apoiarem Mike Huckabee

FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A NOGALES
(ARIZONA)


Nogales são duas cidades, com o mesmo nome, cidadãos com as mesmas feições e a mesma língua predominante, o espanhol. A diferença é que uma está no Arizona, EUA, e a outra, no México, separadas por um posto de fronteira.
A simbiose faz com que, nas ruas do lado americano, os democratas, historicamente mais próximos dos hispânicos do país, pareçam prevalecer sobre os republicanos, e o favorito destes nas prévias, John McCain, embora senador pelo Arizona, não tenha tanto prestígio nas ruas quanto Barack Obama ou Hillary Clinton.
No Estado (um dos quatro dos EUA a fazer fronteira com o México), que tem hoje prévias democratas e republicanas, as pesquisas dão vantagem a McCain e Hillary. Bush venceu lá em 2000 e em 2004.
A população latina do Arizona é a sexta dos EUA: 1,8 milhão, ou 29,2% dos habitantes -o dobro da média nacional. Destes, 37% estão aptos a votar.
Já em Nogales, mais de 90% dos 21 mil habitantes têm ascendência latina. Após percorrer 300 km de carro desde Phoenix, numa planície desértica com cactos, ranchos, shopping centers e condomínios de casas ocres, a reportagem da Folha visitou a cidade.
É lá que fica a maior unidade da US Border Patrol, a patrulha de fronteira. No escritório central, um pôster proclama, sobre os dados de 2007: "Líder nacional: 90.559 apreensões de estrangeiros ilegais, 1,36 tonelada de maconha apreendida".

Semi-anistia
Em tese, McCain até poderia ter uma boa acolhida em Nogales. Foi ele quem propôs um projeto de lei que previa uma semi-anistia para os mais de 12 milhões de imigrantes ilegais dos EUA, rejeitada ano passado pelo Senado. Entre os republicanos, é visto como excessivamente à esquerda no tema.
Mas é só em tese. "McCain é um camaleão, um híbrido de idéias republicanas e democratas. Pressionado, é claro que ele se voltará contra os imigrantes", afirma Teresa Leal, responsável por um museu que conta a história dos índios pimas, os nativos da região.
Questionada sobre o recuo de McCain, que disse semana passada que não apresentaria hoje o projeto, diz não se surpreender. "A imigração é uma válvula manipulada pela política ao sabor da situação."
(A posição, digamos, flexível de McCain fez com que o grupo Minuteman, de milícias ultradireitistas que caçam imigrantes na fronteira, anunciasse apoio a Mike Huckabee.)
Teresa Leal, ela própria descendente de pimas, é "residente permanente" nos EUA. Diz que não pede cidadania, e portanto não vota, por princípio: "Estamos aqui há 700 anos, e nós que somos estrangeiros?".
Outros moradores, até por receio da língua, jamais pediram cidadania. Caso do aposentado Manuel Valle, 70, que, se pudesse, votaria em Hillary, pois "[Bill] Clinton foi bom para os hispânicos".
E, sim, há eleitores de McCain. "Ele é do Arizona, conhece os problemas daqui", defende Mario Córdoba, 48, de ascendência mexicana. Com duas gerações da família nos EUA, ele tem uma visão dura em relação à imigração. "Os ilegais estão acabando com a economia, o resto da população é obrigado a pagar hospital e educação para eles. Não sou contra imigrantes, mas desde que trabalhem para se legalizar."
Num dia inteiro em Nogales, a reportagem só achou três americanos típicos: dois patrulheiros e uma moradora desiludida com a política, mas eleitora democrata. "Estou mais para Obama, mas estou confusa", diz Kathy, sem dar o sobrenome.
Há nas ruas muita gente da vizinha mexicana, conhecida como Nogales Sonora, que atravessa para fazer compras, em lugares como "Tienda de Gangas Andres".
Não foi possível ir a Nogales Sonora -o repórter não tinha visto. De longe dá para ver que há favelas, fruto do inchaço da população, que chega para arriscar o sonho americano. O censo de 2005 registrou 195 mil habitantes. Mas dizem na fronteira que já há mais de 300 mil.


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