São Paulo, sexta-feira, 05 de fevereiro de 2010

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Brasil quer que Turquia receba urânio do Irã

Possibilidade de que o próprio Brasil seja o depositário do estoque iraniano não está descartada, mas não é a preferida do Itamaraty

Chancelaria acredita que papel brasileiro pode ser mais de interlocução, devido a relações próximas com Teerã e potências do P5+1

CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

Apesar de ser aventado publicamente pelo Irã como possível eixo de um acordo patrocinado pela AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) pelo qual Teerã enviaria seu urânio pouco enriquecido para o exterior e receberia o elemento com o nível de enriquecimento adequado para fins medicinais, o Brasil trabalha para que a Turquia seja depositária do urânio iraniano, como uma forma de atender à demanda de Teerã de garantia de que o material será devolvido.
A ideia de que o Brasil possa ser depositário do urânio iraniano não é descartada, mas não é a preferência do Itamaraty. Já a possibilidade de o país enriquecer urânio para o Irã nunca foi cogitada nas conversações entre os dois países, afirma a assessoria do chanceler Celso Amorim.
A ideia brasileira é que, após a escala na Turquia, o enriquecimento seja feito principalmente pela Rússia, como previa a proposta original do P5+1, grupo que reúne as cinco potências com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU (EUA, Rússia, França, Reino Unido e China) mais a Alemanha e lidera as negociações sobre o programa nuclear iraniano.
A proposta de que o Irã entregue 85% do seu estoque de urânio com enriquecimento de 3% a 5%, usado em usinas de energia, para ser enriquecido no exterior a 20%, nível exigido na utilização médica, foi feita em 2009 por intermédio da AIEA.
A sugestão partiu do P5+1, depois que o Irã pediu autorização à AIEA para repor o combustível do reator de Teerã que produz isótopos médicos. O objetivo do grupo é impedir que o país tenha estoque de urânio suficiente para enriquecimento a 90%, necessário para produzir a bomba.
O Irã teve reação inicial positiva, mas em seguida recuou, argumentando temer que seu urânio não fosse devolvido. As potências ocidentais passaram então a cogitar novas sanções contra Teerã.
Nesta semana, o presidente Mahmoud Ahmadinejad voltou a afirmar que está disposto a enviar o urânio ao exterior. EUA e aliados veem a declaração como parte de manobras protelatórias iranianas, e pedem que o país formalize sua intenção na AIEA.
Até ontem, isso não havia sido feito pelo embaixador iraniano na agência, Ali Asghar Soltanieh. Ele disse, no entanto, que não deveria haver "prejulgamentos", já que Ahmadinejad "mostrou que o Irã tem a vontade política de facilitar a cooperação, em lugar da confrontação".
A Turquia, que é membro da Otan (aliança militar ocidental), vem nos últimos anos ampliando relações com seus vizinhos no Oriente Médio. A ideia de que atue como intermediária entre Irã, Rússia e França, outra possível enriquecedora do urânio iraniano, é cogitada desde novembro.
Anteontem, Amorim falou por telefone sobre o tema com o ministro do Exterior turco, que ontem recebeu em Ancara o chanceler iraniano, Manoucher Mottaki -que por sua vez, se reunira na semana passada em Davos com Amorim. O chanceler brasileiro crê que pode ter um papel de interlocução porque o Brasil tem a confiança dos iranianos e boas relações com EUA e aliados.
As novas sanções cogitadas por EUA, França e Reino Unido têm pouca chance de aprovação no Conselho de Segurança, em especial devido às rusgas entre EUA e China, por sua vez cliente do petróleo iraniano.
O voto da Rússia seria mais imprevisível. Embora coopere com o Irã na área nuclear civil, Moscou está em fase de recomposição da relação com os EUA, após Washington cancelar projeto de instalação de sistema antimísseis no Leste Europeu.


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