São Paulo, domingo, 05 de março de 2000


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ELEIÇÃO NOS EUA
Desafio do próximo presidente será controlar o ritmo da expansão econômica norte-americana
Depois de Clinton

Na próxima terça, primárias simultâneas em 13 Estados devem definir os candidatos dos partidos Republicano e Democrata à sucessão presidencial norte-americana MARCIO AITH
de Washington

Os EUA que o presidente Bill Clinton deixará para seu sucessor são uma superpotência econômica e militar mais sólida que há oito anos, hegemônica no mundo, mas que se sustenta num frágil equilíbrio, capaz de se desfazer no primeiro erro de governo.
Esse é o consenso entre analistas que, a menos de um ano do final da era Clinton e em plena campanha eleitoral para sua sucessão, tentam entender as mudanças havidas no país desde 92.
"Quando Clinton assumiu, os EUA eram um gigante em recessão e com um dilema político. Havia ganho a Guerra Fria, mas não sabia o que fazer com essa vitória. O próximo presidente herdará um país rico, crescendo e, agora, com dois dilemas. Não sabe o que fazer com sua hegemonia nem como controlar sua expansão econômica", disse Stephen Hess, pesquisador do Instituto Brookings, em Washington.
O maior risco para o próximo presidente está no campo econômico. Na era Clinton, o PIB dos EUA cresceu ininterruptamente. Em janeiro, os EUA atingiram sua mais longa era de expansão em toda a história, ultrapassando o período de 1961-1969, durante a Guerra do Vietnã.
Caso essa trajetória se mantenha até o final do ano, caberá ao próximo presidente decidir como reduzir sua velocidade, para preservá-la sem destruí-la. Ou, nas palavras dos economistas, permitir um "soft landing" (pouso suave), impedir um crash que leve o país novamente à recessão.
Um dos dois principais instrumentos para garantir o "soft landing" não está nas mãos do presidente, mas sim do Fed (o banco central norte-americano), a quem cabe aumentar os juros no país, reduzindo a disponibilidade da moeda e o índice de crescimento.
O outro instrumento está nas mãos do presidente: como usar o superávit orçamentário do país, de quase US$ 3 trilhões nos próximos três anos.
O presidente do Fed, Alan Greenspan, pede que o próximo presidente não coloque em risco o equilíbrio das contas públicas conquistado por Clinton. Ele quer que o superávit seja usado para pagar a dívida pública dos EUA, a maior do mundo. "Tomar outra medida pode enviar uma mensagem errada aos mercados", disse ele num depoimento no Senado na semana passada.
Candidatos como o republicano George W. Bush, no entanto, pregam que o dinheiro volte para os contribuintes por meio de cortes de impostos.
"Não é o momento para cortes de impostos", disse Clinton numa entrevista recente. "Conquistamos um orçamento equilibrado. Estamos perto de conquistar o que era inconcebível até alguns anos atrás: transformar os EUA num país sem dívidas pela primeira vez desde que Andrew Jackson foi presidente em 1835."
Mas há outros desafios na área econômica, como o de democratizar esse crescimento. Apesar do "boom" da economia norte-americana, a desigualdade social aumentou na era Clinton. O crescimento foi benéfico às classes menos favorecidas, mas a diferença de renda entre os mais ricos e os mais pobres aumentou.
Na última década, os 20% que formam o grupo de famílias mais pobres dos EUA perderam US$ 587 em seu poder de compra anual. Nesse período, os 5% que compõem o grupo de famílias mais abastadas adicionaram US$ 29 mil a seu orçamento anual.
Na década de 60, os mais altos executivos ganhavam 41 vezes mais que um trabalhador médio. Em 1998, essa diferença aumentou para 190 vezes.
Clinton defende-se dizendo que o desemprego entre negros e hispânicos caiu quase que pela metade. Cerca de 13% dos negros estavam desempregados quando Clinton assumiu. Agora, são apenas 8,5%. O desemprego entre a população branca de origem européia é inferior a 3%.
No campo externo, o dilema parece ser o mesmo da década passada. Segundo o cientista político Samuel Huntington, de Harvard, o governo norte-americano não entendeu ainda o significado de ser um poder hegemônico num mundo onde há outros poderes, não tão fortes mas significativos.
"As autoridades norte-americanas tendem a agir como se o mundo fosse unipolar, como se os outros poderes fossem dispensáveis, como se não fosse mais necessário buscar consenso", escreveu ele num artigo recente.
Para ele, a suposição de que sua agenda seria aceita pelo resto do mundo, em qualquer situação, levou os EUA a se isolar em questões importantes, como as sanções contra Cuba, Irã e Iraque, o banimento das minas terrestres e a criação de um tribunal internacional para crimes de guerra.
Apesar do discurso de Clinton, seu governo isolou o país em questões importantes e num período em que a União Européia cresce em importância e influência no mundo emergente.
A campanha eleitoral nos EUA indica que esse isolamento pode piorar caso um candidato republicano seja eleito. Bush propõe o fim da política de aproximação com Pequim. John McCain, o ex-prisioneiro da Guerra do Vietnã, sugere a derrubada militar de regimes inimigos dos EUA.


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