|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Morte de fazendeiro branco reaviva tensão racial na África do Sul
Assassinato de líder de organização supremacista AWB é uma declaração de guerra dos negros, afirma porta-voz do grupo
Homicídio, entretanto, não estaria vinculado a questão racial, indicam investigações;
episódio causa preocupação a poucos meses da Copa
FÁBIO ZANINI
NA CIDADE DO CABO
O assassinato do líder direitista branco Eugene Terreblanche, 69, anteontem em sua fazenda na África do Sul ameaça
reacender as dormentes tensões raciais no país.
Terreblanche era o principal
representante de uma ala diminuta, mas ainda influente, de
radicais africâners (descendentes de colonizadores holandeses) que nunca aceitaram o fim
do apartheid. O regime de segregação racial perdurou entre
as décadas de 40 e 90 no país.
Ele presidia o Movimento de
Resistência Africâner (AWB,
na sigla em africâner), que se
inspirava no nazismo, inclusive
no símbolo, uma referência à
suástica.
Terreblanche foi morto no
sábado na cidade de Ventersdorp (a 100 km de Johannesburgo), e a polícia suspeita que
o crime tenha sido cometido
por empregados negros de sua
fazenda em razão de disputas
trabalhistas. Ainda que tudo indique que a morte não tenha tido conotação política, um porta-voz do grupo radical ameaçou ontem com retaliações.
"A morte do sr. Terreblanche
representa uma declaração de
guerra da comunidade negra da
África do Sul contra a comunidade branca, que vem sendo
morta nos últimos dez anos",
afirmou Andre Visagie.
É uma referência aos assassinatos de fazendeiros no campo,
sobretudo brancos. A quase totalidade dos crimes, no entanto, não tem caráter político e
pode ser debitada na conta do
aumento da violência no país.
De qualquer maneira, o assassinato do líder branco vem
num momento delicado para as
relações raciais sul-africanas.
Há duas semanas, o líder da ala
jovem do partido governista, o
Congresso Nacional Africano
(CNA), Julius Malema, foi proibido por ordem judicial de cantar uma música da época da resistência ao apartheid que diz,
em um dos versos, "atire no
boer [sinônimo para fazendeiro em africâner]".
A canção, dizem líderes brancos, incita ao ódio. Malema e o
CNA estão recorrendo da decisão, afirmando que a música é
parte do legado histórico da luta contra a discriminação.
Há outros exemplos. O próprio presidente da África do
Sul, Jacob Zuma, tem como seu
"hino pessoal" uma música cujo título é "traga-me minha metralhadora", que ainda hoje
costuma entoar em eventos políticos. É uma referência à época em que ele liderava o serviço
de inteligência do braço armado do CNA, nos anos 70.
Zuma, ontem, pediu calma à
população. "É nossa responsabilidade denunciar esse crime e
nos distanciar de declarações
que possam reverter os processos de construção nacional e
coesão racial", declarou. O governo está preocupado também porque em pouco mais de
dois meses a África do Sul sediará a Copa do Mundo -ontem, o porta-voz do AWB chegou a dizer que seu movimento
instaria as seleções a não virem
disputar a competição.
O país tem cerca de 10% de
sua população formada por
brancos. Desses, dois terços são
africâners como Terreblanche,
e o restante tem ascendência
inglesa. A esmagadora maioria
hoje aceita o fim do apartheid,
mas há franjas radicais que ainda não se conformam com a democracia racial.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Frase Índice
|