São Paulo, quarta-feira, 05 de julho de 2006

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Suspeita de erro adia resultado no México

Esquerdista Obrador contesta vitória de Calderón, apontada em números preliminares, e pede revisão de atas eleitorais

Vantagem de conservador é de 257 mil votos; oponente havia dito que 3 milhões de votos foram descartados e prometeu "batalha jurídica"


Tomas Bravo/Reuters
Cartaz mostra presidente do IFE, Luis Ugalde, com a frase: "procura-se delinqüente eleitoral'


RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO

O México continua sem saber quem será o novo presidente, dois dias depois das eleições. A apuração preliminar, que dá a vitória por apenas 0,64 ponto percentual ao conservador Felipe Calderón, foi contestada pelo esquerdista Andrés Manuel López Obrador. A partir de hoje, todas as atas dos 300 distritos eleitorais, com 130 mil seções, serão revisadas pelo Instituto Federal Eleitoral (IFE) para determinar o vencedor. De qualquer maneira, espera-se uma longa batalha jurídica envolvendo os favoritos.
Atas rasuradas, votos não-computados, diferença mínima entre dois candidatos e possível ação judicial. A decisão de quem será o futuro presidente mexicano cada vez está mais parecida com a polêmica que envolveu a disputa entre George W. Bush e o democrata Al Gore na apuração dos votos na Flórida, que se arrastou por mais de um mês entre novembro e dezembro de 2000.
No universo de 40 milhões de votos (há 71 milhões de eleitores, mas o voto não é obrigatório), a diferença apontada pela apuração preliminar é de apenas 257 mil votos. O IFE divulgou na noite de ontem que 2,5 milhões de votos não haviam sido contabilizados por irregularidades nas atas. Ainda assim, Calderón manteve a dianteira, e a diferença foi reduzida a 0,64 ponto percentual.
López Obrador, ex-prefeito da Cidade do México, havia acusado o "desaparecimento" de 3 milhões de votos nas totalizações preliminares anunciadas pelo IFE. Pela lei mexicana, atas que contêm irregularidades -rasura, número total de votos diferente dos eleitores que compareceram à seção eleitoral ou excesso de votos anulados- não são enviadas para a contagem preliminar.
Obrador acusou o IFE de ter divulgado o total preliminar sem revelar os 3 milhões de votos a menos. O conselheiro-presidente do instituto, Luis Carlos Ugalde, disse que os resultados preliminares não são definitivos, e que havia pedido aos partidos para esperar a contagem oficial, que começa hoje.

Excesso de cautela
Várias atitudes a partir do encerramento da votação, no domingo, despertaram suspeitas. Todos os grandes jornais e redes de televisão se negaram a revelar os resultados das pesquisas de boca-de-urna porque não traziam vencedor claro. Esperava-se que Ugalde divulgasse às 23h os resultados da contagem rápida, por amostragem, nos 300 distritos eleitorais do país. Em 2000, a vitória de Vicente Fox foi anunciada assim.
Mas Ugalde pediu paciência, disse que a diferença era menor do que a margem de erro e não revelou dados. Pediu que os candidatos esperassem até hoje, quando o IFE começasse a contagem de todas as atas.
Em seguida, o presidente Fox fez um pronunciamento em rede nacional pedindo "paciência" e respeito ao "tempo" do IFE. O pronunciamento fora gravado antecipadamente.
Desrespeitando os pedidos de Ugalde e Fox, poucos minutos depois, os dois favoritos cantaram vitória. Obrador chegou a pedir aos militantes que se dirigissem ao Zócalo, praça principal da Cidade do México, para comemorar a vitória.

Batalha jurídica
A guerra começou na segunda. Obrador acusou o IFE de manipulação. O deputado Manuel Camacho Solís, um dos assessores do esquerdista, anunciou que seu Partido da Revolução Democrática (PRD) faria protestos "pacíficos".
Já o Partido da Ação Nacional (PAN), de Calderón e Fox, começou a pressionar o IFE para que o conservador fosse declarado vencedor. O presidente do IFE afirmou ontem que "ninguém pode ser declarado vencedor com base em resultados preliminares". Germán Martinez, representante do PAN no IFE, disse que a recontagem não muda a diferença.
Pela lei eleitoral mexicana, os partidos podem pedir a impugnação da eleição ou a recontagem voto por voto, depois que o IFE divulgar o resultado da contagem das atas -o que pode ocorrer neste fim de semana. Se constatadas muitas irregularidades ou diferenças gritantes na apuração preliminar, Obrador promete iniciar "uma batalha nos tribunais".
Ao contrário dos EUA, onde a Suprema Corte deu a vitória a George W. Bush e o declarou presidente, no México existe um Tribunal Federal Eleitoral (Trife), acima do IFE, com poder de decisão. Pela primeira vez, o Trife poderia cancelar uma eleição presidencial e convocar um novo pleito.
Quarta colocada na disputa da Presidência segundo as apurações preliminares, a esquerdista Patrícia Mercado pediu respeito às regras democráticas aos dois favoritos. "Não queremos guerra midiática, nem na rua, pois ambas levam a uma cultura política do passado, de arranjos feitos no escuro ou de violência antidemocrática."


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