|
Próximo Texto | Índice
Bogotá usou mediadores para enganar Farc
Ministro diz que divulgação da presença no país de enviados suíço e francês compôs "roteiro" igual ao das ações de Chávez
Rádio pública da Suíça afirma que guerrilheiros receberam US$ 20 milhões; ministro da Defesa nega pagamento e mostra vídeo
DA REDAÇÃO
Reportagem da Rádio Suíça
Romanda (RSR) afirmou ontem, citando "uma fonte confiável", que a operação de resgate de Ingrid Betancourt foi
encenada e que a libertação dos
seqüestrados custou US$ 20
milhões, pagos ao carcereiro. A
versão enfureceu Bogotá, que
disse não ter pago nem "um
centavo" e divulgou um vídeo
com cenas da ação.
Ao negar a reportagem suíça,
porém, o ministro da Defesa da
Colômbia, Juan Manuel Santos, acrescentou detalhes na
versão inicial da operação que
podem causar à Colômbia problemas diplomáticos: ele admitiu que a operação imitou as
missões do venezuelano Hugo
Chávez para libertar reféns das
Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), em janeiro e fevereiro deste ano.
Também para dar verossimilhança à ordem falsa de trasladar os reféns, Santos disse ter
orientado a divulgação na imprensa de um encontro entre
um mediador suíço e um francês com integrantes da cúpula
das Farc.
Como a Folha publicou anteontem, o governo Álvaro Uribe, divulgou, na terça-feira, que
havia autorizado uma reunião
entre os mediadores estrangeiros e as Farc. Antes, com base
em informações vazadas pelo
governo, o tema já havia sido
destaque no principal jornal do
país, o "El Tiempo".
"Ocorreu-me que essa informação, verídica, devíamos vazá-la, porque de certa forma
corroborava a novela [...] Se César [responsável pelos reféns]
ouvia que esses senhores estavam com Cano, isso reafirmava
um pouco a novela", disse.
Santos disse que foi dito aos
guerrilheiros que a transferência dos reféns iniciaria "um
processo de intercâmbio humanitário, uma negociação".
"Por isso, chegamos de forma
bastante parecida à das libertações unilaterais [as de Chávez]", continuou.
Bogotá não admite ter usado
os nomes de Venezuela, França
e Suíça. Santos disse que os
participantes do resgate se passaram por estrangeiros, mas
não dessas nacionalidades.
O vídeo
O vídeo liberado pelo ministro, de 3min36seg, começa com
imagens de guerrilheiros em
um descampado, reféns ao fundo. Um agente de colete e camisa vermelha, fazendo as vezes
de repórter, se aproxima do
guerrilheiro César. "Comandante, só uma pergunta?" (Nas
ações de Chávez, a emissora estatal Telesur tinha direito a fazer imagens.)
César, sorridente, responde
que as regras o impedem de falar. Um dos reféns se oferece à
câmera, diz que ficou preso por
dez anos. É interrompido. "Por
política do canal não podemos
transmitir [...] mas sabemos o
sofrimento", diz o "repórter".
Na versão divulgada, a
2min23s o vídeo perde o áudio.
Vêem-se os reféns, alguns irritados por terem de usar algemas de plástico, subindo no helicóptero. Não há cenas sobre a
rendição de César. Há um corte
e cenas do interior do aparelho:
"Estão livres, já passou!", diz
um agente aos reféns, que comemoram. Faz-se um close em
Ingrid Betancourt, que chora.
Encenação
O vídeo, diz o governo colombiano, é a prova de que não
houve encenação na rendição
dos guerrilheiros no helicóptero, como sustenta a reportagem
da Rádio Suiça Romanda
(RSR). Pelo texto do repórter
Frédéric Blassel, que diz consultar a mesma fonte há 20
anos, o trato para a entrega dos
reféns foi feito com César, codinome de Gerardo Aguilar, responsável pela escolta dos reféns. O contato para a entrega
dos US$ 20 milhões teria sido
feito pela companheira de César, presa em fevereiro.
O vídeo mostra um "repórter" hesitante, mas os reféns
reagem à seqüência dos fatos.
"Mesmo os reféns foram enganados [no resgate], ao que parece", diz o texto suíço.
A reportagem da RSR, que é
uma emissora pública, enfureceu o comandante do Exército,
Fredy Padilla de León, e o ministro da Defesa, Juan Manoel
Santos. Por isso Bogotá resolveu divulgar o vídeo -a RSR
questionava porque não havia
imagens. "É absolutamente falso [que tenham pagado resgate]", disse Santos. Segundo ele,
a companheira de César "não
teve nada a ver, não foi contatada para a operação, não se pagou a ela nem um só centavo".
"Juro como comandante,
dou minha palavra de honra, de
que era mais benéfico que César tivesse recebido US$ 20 milhões. Teria sido demolidor para as Farc", disse Padilla.
A França negou ter pago pelos reféns. O EUA não comentaram -na ação, foram soltos
três americanos. "Francamente, não creio que possam me
enganar facilmente. Não. Não
creio que foi uma farsa", disse
Ingrid, na França.
(FLÁVIA MARREIRO)
Com agências internacionais
Próximo Texto: Suíço se reuniu com emissário da guerrilha Índice
|