São Paulo, domingo, 05 de julho de 2009

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"Kirchner perdeu eleição para construção midiática"

Filósofo compara De Narváez a Collor e Fujimori, "direita que se oferece como leve"

Ricardo Forster admite, porém, que governo Cristina cometeu erros e perdeu contato com a sua base de sustentação popular

DE BUENOS AIRES

À medida que o governo de Cristina Kirchner se enfraquece na Argentina, avança um setor da direita no país que explora a lógica dos meios de comunicação e o fim da política tradicional.
Para o filósofo Ricardo Forster, o governo cometeu erros, mas perdeu as eleições legislativas na maior Província do país para um "personagem construído midiaticamente" -o empresário Francisco De Narváez-, que compara aos ex-presidentes Fernando Collor de Mello e Alberto Fujimori (Peru).
Cabeça do grupo de intelectuais que apontava risco de uma "restauração conservadora" no país em caso de derrota do governo, Forster diz que esse processo ainda não se completou e que o governo ainda tem chance de seu recuperar -mas não a ponto de se manter no poder depois de 2011. (TG)

 

FOLHA - Por que o governo perdeu a eleição?
RICARDO FORSTER
- Pelo desgaste de um longo período. Por erros ao processar conflitos agudos da sociedade. Pelo fortalecimento de uma oposição de direita, unida na deslegitimação do governo pelos grandes meios de comunicação. O vínculo do governo com a corporação midiática se rompeu em 2007 e agora ele pagou um preço caro por isso.

FOLHA - O sr. crê que o estilo do governo está ultrapassado?
FORSTER
- Um dos triunfos do neoliberalismo foi deslocar a política para linguagens audiovisuais e publicitárias. Essa mutação permite que grandes triunfos da época sejam para os Berlusconi [Silvio, primeiro-ministro da Itália], os De Narváez, que constroem políticas a partir da espetacularização. É uma direita que se apropriou com astúcia dos meios de comunicação e das novas formas de subjetividade. Isso o governo não soube fazer.

FOLHA - Qual é a sua opinião sobre Francisco de Narváez?
FORSTER
- Parece uma figura como Collor de Mello no Brasil, [Alberto] Fujimori no Peru. Uma parte da socidade sente que ali está o poder, as luzes do espetáculo, e não importa o que haja por trás, que seja um personagem construído midiaticamente. Expressa uma visão reacionária da sociedade, de uma direita que se oferece como leve, diferente da velha direita autoritária e violenta do século passado. São produtos de fácil digestão.

FOLHA - A eleição expressa repúdio da sociedade a um estilo visto como confrontativo?
FORSTER
- O governo gestou um confronto onde as corporações econômicas querem fixar a agenda. O conflito está gerado quando se disputa renda, poder. É preciso diferenciar forma de conteúdo. O governo se equivocou em várias coisas, deveria ter revisado as estatísticas oficiais, trocado funcionários, não soube ler sinais da sociedade, perdeu contato com sua base de sustentação popular.

FOLHA - Há um fim de ciclo do kirchnerismo ou o governo pode voltar a se fortalecer?
FORSTER
- Se o governo acreditar que não houve derrota, errará. Se recuperar uma visão de maior abertura, acoplar outros atores, dizer quais são seus projetos reais, poderá se reestabilizar. Talvez não para 2011, mas para o futuro. Não me atreveria a dizer que há um ocaso. É um momento difícil, um limite a que chegou, e terá que buscar as formas de se reconstruir, para dentro e para fora.


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