São Paulo, sábado, 05 de setembro de 2009

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Uribe não é igual a Chávez, afirma vice

Francisco Santos diz que referendo para permitir 3º mandato não equipara presidentes, já que na Colômbia há respeito às instituições

Colombiano afirma à Folha que acordo sobre bases deve vigorar já neste ano e que voos sobre outros países só ocorrerão com autorização

Rodrigo Arangua - 28.mai.06/France Presse
Francisco Santos (à esq.) e Álvaro Uribe na festa em comemoração da primeira reeleição do presidente colombiano, em 2006

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

O colombiano Álvaro Uribe e o venezuelano Hugo Chávez podem muitas vezes soar iguais, populares e autoconclamados líderes de um "processo transformador" que os torna necessários no poder por mais tempo do que prevê a lei. Bogotá admite. Mas estrila ante a sugestão de que a semelhança entre ambos exceda as palavras.
"Isso é desconhecer as instituições da Colômbia. Mostrá-los à mesma luz é fácil, mas simplista", diz Francisco Santos, vice de Uribe, em Genebra para preparar reunião em Cartagena sobre o acordo de minas terrestres, em novembro.
Estirado no sofá da missão colombiana e sem sapatos após dois dias de atividade intensa, Santos falou à Folha sobre as bases militares que os EUA usarão em seu país, alvo de dúvida dos vizinhos, e a segunda reeleição de Uribe, a ser autorizada por um referendo recém-aprovado pelo Congresso e previsto pelo vice para fevereiro. Leia os principais trechos:

 

FOLHA - Como o sr. vê as divergências na última cúpula da Unasul [União de Nações Sul-Americanas] quanto às bases?
FRANCISCO SANTOS -
Não são bases, é uma complementação do acordo de cooperação que já temos no Plano Colômbia [aliança com os EUA para combater o narcotráfico]. A cúpula é o cenário para essas discussões. Somos um grupo de amigos, e deve haver um lugar para se expor as diferenças.

FOLHA - Essa aliança vai ser bastante ampliada, não?
SANTOS -
Não. A Colômbia já autoriza cerca de 800 militares americanos no país, isso não vai ser ampliado.

FOLHA - Por que sete bases?
SANTOS -
A geografia colombiana é complexa, com só uma base muitas vezes não se pode chegar ao lugar de uma operação. A razão para tantas bases é acentuar as ações.

FOLHA - O Brasil cita preocupações quanto à Amazônia. A região concentra focos das Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia]. Como será a operação ali?
SANTOS -
Temos um acordo militar que queremos aprofundar com o Brasil, e me parece importante uma vigilância melhor das fronteiras, conjunta. E há o Sivam [Sistema de Vigilância da Amazônia]. Se chegarmos perto, o Brasil terá controle do espaço aéreo.

FOLHA - E o que foi dito sobre sobrevoos americanos?
SANTOS -
Não tenho os detalhes técnicos. Mas é certo que para utilizar o espaço aéreo de outro país tem de haver anuência dele. É sua área soberana.

FOLHA - O sr. fala em desconhecimento do acordo pelos demais. É difícil explicá-lo?
SANTOS -
Não, é um assunto em que não se deve colocar uma questão ideológica -algo fácil de explorar e que gera ruídos.

FOLHA - E com a Venezuela, vai haver plano de cooperação?
SANTOS -
Não, já tentamos tudo e não nos deram apoio.

FOLHA - E o Equador [onde a Colômbia atacou um acampamento das Farc em 2008, estopim de uma crise regional]?
SANTOS -
Já tivemos uma cooperação em 2003. Esperamos que possamos recuperá-la, mas é bom ser prudente nas declarações sobre o Equador.

FOLHA - Quando o acordo entrará em vigor?
SANTOS -
No fim do semestre, o mais tardar. Falta só uma consulta, do lado colombiano, com o Conselho de Estado.

FOLHA - Por que um novo mandato para o presidente Uribe?
SANTOS -
Isso você tem de perguntar para ele. Mas faltam dois passos, o aval da Corte Constitucional e o referendo.

FOLHA - O trâmite tem de ser rápido. A data para se dizer candidato é 30 de novembro.
SANTOS -
Não tenho certeza da data. Mesmo que a corte decida, falta o referendo.

FOLHA - E a data vai mudar?
SANTOS -
Não sei como fazer isso. O que sei é que vejo esse referendo mais ou menos em fevereiro, se a corte aprová-lo.

FOLHA - O sr. já citou a abstenção. Se o referendo coincidir com a eleição legislativa, em março, acaba o problema...
SANTOS -
A lei estatutária proíbe isso [simultaneidade]. Seria preciso mudá-la no Congresso. Por ora não há plano.

FOLHA - Não é ruim não haver alternância no poder?
SANTOS -
O [americano Franklin] Roosevelt durou 14 anos. A [britânica Margaret] Thatcher, 11. Se um [governante] respeita a institucionalidade num momento de crise ou transição como esse pelo qual a Colômbia passa, de eliminação da violência, e se faz os ajustes, não vejo por que não.

FOLHA - O sr. não vê semelhança com a situação na Venezuela? O presidente Hugo Chávez também diz que faz um bom trabalho e tem apoio popular.
SANTOS -
Não, não, isso é desconhecer as instituições e a tradição histórica da Colômbia, e todas as barreiras, um Congresso forte, um Judiciário muito forte, independente, uma imprensa absolutamente livre, que é algo que se questiona na Venezuela. Mostrá-los à mesma luz parece simplista.

FOLHA - As instituições são diferentes, mas no fim das contas os argumentos soam iguais.
SANTOS -
Soam, mas ao se examinar o cenário é distinto.


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