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ORIENTE MÉDIO
"Ele não está clinicamente morto, mas seu estado se agravou", diz o médico pessoal do líder palestino
Morte de Arafat é anunciada e desmentida
FERNANDO EICHENBERG
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM PARIS
O estado de saúde do presidente
da Autoridade Nacional Palestina
(ANP), Iasser Arafat, 75, foi objeto ontem de intensa especulação e
rumores. Arafat, que se encontrava internado em estado gravíssimo numa UTI do hospital militar
Percy, em Clamart, nos arredores
de Paris, teve sua morte anunciada por diversas fontes e negada
outras tantas vezes.
Oficialmente, no início da noite
de ontem, um comunicado lido
para a imprensa pelo médico-chefe do serviço de comunicação
de saúde do Exército francês,
Christian Estripeau, diante do
hospital, informava que Arafat
não havia morrido.
Oficiosamente, no entanto, as
informações sobre a condição de
saúde de Arafat, segundo fontes
anônimas francesas e palestinas, e
divulgadas ao longo do dia pela
mídia, foram as mais contraditórias, provocando confusões e incertezas.
De acordo com algumas fontes,
o líder palestino estaria lutando
entre a vida e a morte, em estado
de coma crítico. Outras fontes
acrescentaram que seu estado seria de morte cerebral, mantido em
vida graças exclusivamente ao auxílio de aparelhos de respiração
artificial.
Outras fontes ainda afirmaram
que ele teria perdido a consciência
por três vezes nos últimos dois
dias, e permanecido inconsciente
após a última vez.
Exame
Segundo médicos franceses,
Arafat teria sido submetido a um
eletroencefalograma ontem pela
manhã, e seu estado de coma seria
profundo e irreversível. "Ele está
vivo, não está clinicamente morto, mas seu estado se agravou",
disse à agência de notícias Reuters
o médico pessoal de Arafat, o neurologista jordaniano Ashraf Kurdi, contribuindo ainda mais para
o clima de dúvida.
Às 15h15 (horário de Paris),
uma comitiva de três veículos oficiais do governo francês adentrou, sem grande alarde, no complexo hospitalar militar. O visitante oficial era o presidente Jacques Chirac, que decidira se deslocar à cabeceira do leito do líder
palestino doente antes de viajar a
Bruxelas, na Bélgica, para a reunião dos chefes de governo da
União Européia.
Segundo o porta-voz do Palácio
do Eliseu, sede do governo francês, Chirac, que permaneceu por
cerca de 45 minutos no local, manifestou "desejos de melhora" a
Arafat, sem, no entanto, fornecer
maiores detalhes sobre o estado
de saúde do célebre paciente.
Poucos minutos antes da divulgação do comunicado oficial do
hospital, o total desencontro de
informações parecia ter chegado
ao fim com a notícia da morte do
líder palestino, anunciada por
uma emissora de rádio e um canal
de TV israelenses.
Em Bruxelas, o primeiro-ministro de Luxemburgo, Jean-Claude
Juncker, confirmou a notícia,
anunciando a morte de Arafat a
seus colegas, mas sem divulgar
sua fonte. Chirac chegou a comentar a notícia com outros dirigentes.
A apressada informação logo
chegou a Washington, levando o
presidente dos Estados Unidos,
George W. Bush, a cometer uma
gafe durante sua primeira entrevista coletiva após sua reeleição à
Casa Branca.
Ao ser informado por um jornalista da morte de Arafat, e questionado sobre sua reação a respeito,
Bush respondeu: "Minha primeira reação é: que Deus abençoe sua
alma".
Depois, aproveitou para falar do
processo de paz no Oriente Médio
-estagnado, na opinião de Washington, pela presença de Arafat.
"Minha segunda reação é: continuaremos a trabalhar para um Estado palestino livre e em paz com
Israel", disse Bush.
"O sr. Arafat não morreu"
A notícia da "morte" de Arafat
obrigou o porta-voz do Exército
francês, Christian Estripeau, a encerrar seu comunicado sobre a
saúde do líder palestino com uma
frase seca e direta: "O sr. Arafat
não morreu".
A centena de jornalistas internacionais que aguardou durante
todo o dia em frente ao hospital,
contidos por barreiras e vigiados
por dezenas de policiais da força
de segurança especial francesa, foi
surpreendida com a negativa,
pois os constantes rumores já davam conta da morte do líder da
ANP.
A nota oficial do hospital, formulada com o "respeito à discrição" solicitada por Souha, mulher
de Arafat, afirmava ainda que seu
estado de saúde se tornara mais
"complexo", e que ele havia sido
transferido na tarde da última
quarta-feira "para uma unidade
adaptada à sua patologia" -que
ninguém diz exatamente qual é.
O marroquino Abdou, 55, segurando acima da cabeça uma bandeira palestina pintada, era um
dos raros manifestantes presentes
no local.
"Vim aqui expressar minha solidariedade a Arafat. Foi um excelente presidente, e o único que
não cedeu aos americanos", disse
à Folha, já utilizando o verbo no
passado.
Os 22 minutos dedicados a Arafat pelo telejornal das 20h do canal
TF1, o de maior audiência da
França, em tom de "biografia funerária", resumindo a vida e a trajetória do líder palestino, foi mais
um sinal revelador da gravidade
de seu estado de saúde.
Mais tarde, por volta das 21h30,
impulsionados pela divulgação de
diagnósticos médicos pouco otimistas, partidários de Arafat,
igualmente portando bandeiras
da ANP, começaram a afluir ao
hospital militar Percy, como se estivessem desejando dar o último
adeus ao seu líder.
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