São Paulo, quarta-feira, 05 de dezembro de 2007

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Referendo revela novo centro na Venezuela

Oposição que se distancia do golpismo e racha no chavismo reduzem polarização

Mensagem contrária à reforma da Carta proposta por Chávez se espalhou por diferentes setores políticos e sociais venezuelanos

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Embora a diferença apertada no referendo da reforma constitucional reforce o estereótipo de uma Venezuela politicamente polarizada, a grande novidade do processo eleitoral é o surgimento de um comportamento politicamente mais ao centro, na opinião de analistas.
São vários os sinais: a participação de partidos de oposição nas eleições, meios de comunicação mais equilibrados, a divisão dentro do chavismo, a alta abstenção entre os simpatizantes do presidente Hugo Chávez e mesmo a calma que predominou no dia da votação e após a confirmação da primeira derrota de Chávez em nove anos.
Os principais canais de televisão do país, Venevisión e Televen, que detêm mais de 50% da audiência, alcançaram um inédito equilíbrio na cobertura, mostra o monitoramento feito pelas universidades de Gotemburgo (Suécia) e Ucab, de Caracas. Esse comportamento é diferente tanto de abril de 2002, quando participaram do golpe contra Chávez, quanto do ano passado, quando se engajaram em cobertura favorável à reeleição do presidente.
"Durante a campanha, houve dois pólos importantes [o canal oposicionista Globovisión e o estatal VTV], mas pela primeira vez se consolidou um centro", diz Andrés Cañizález, coordenador da pesquisa.
No caso dos partidos políticos da oposição, a corrente moderada em favor do voto arrastou na última semana até o radical Comando Nacional da Resistência (CNR). Essa posição menos confrontacionista deu o tom ontem a uma entrevista coletiva de Leopoldo López, um dos dirigentes do partido oposicionista Um Novo Tempo. Ele convidou Chávez e os deputados chavistas, que controlam a Assembléia Nacional desde que a oposição boicotou a eleição legislativa de 2005, a discutir uma agenda social.
O surgimento do movimento estudantil também contribuiu para esse novo centro político. Segundo analistas, a mensagem contrária à reforma teve impacto em todos os setores da sociedade e fugiu da polarização tradicional, apesar de Chávez chamá-los de "filhinhos de papai" e "peões do império".
Já o governismo viu aparecer um centro por meio do partido Podemos e do ex-ministro da Defesa Raúl Isaías Baduel, aliados históricos que romperam com o presidente. As posições contrárias à reforma, que incluía a reeleição indefinida, provocaram o surgimento de uma espécie de "chavismo sem Chávez", mais moderado.
Outro sinal de que a polarização perdeu fôlego foi a ausência de chavistas nos locais de votação, apesar do discurso plebiscitário de Chávez. Para o sociólogo Edgardo Lander, a lição mais importante do referendo é que, mesmo sendo o presidente popular, não há um eleitorado dócil.
"Para setores numericamente muito significativos do chamado chavismo, foi possível manter o apoio ao governo, mas tomar distância de uma proposta particular", avalia Lander, professor da Universidade Central da Venezuela (UCV) que neste ano se distanciou da nova agenda de Chávez.
"É uma lição de maturidade política muito importante e rompe com o imaginário de um povo que simplesmente segue um messias. Na democracia, não se pode apenas falar em nome do povo, ele tem de estar aí também."


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