São Paulo, domingo, 06 de junho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo turco vira herói para população de Gaza

Discurso anti-Israel de Ancara e ajuda de ONG causam onda de admiração

Líder do Hamas aparece em sermão ladeado por bandeira da Turquia, que toma para si papel que já foi de árabes


DO ENVIADO ESPECIAL A GAZA

Quase um século após o fim do Império Otomano, as bandeiras da Turquia voltaram a dominar a paisagem da faixa de Gaza.
Ao levantar a voz contra o bloqueio israelense ao território, o governo turco passou a ser visto como o principal patrono da causa palestina, assumindo um papel que por décadas foi desempenhado pelos países árabes.
Em seu sermão semanal, anteontem, o chefe do governo do Hamas em Gaza, Ismail Haniyeh, era ladeado por uma bandeira palestina e outra da Turquia, numa clara demonstração da aliança forjada pelos últimos eventos.
"Sua mensagem chegou de forma clara", disse Haniyeh, dirigindo-se aos integrantes da frota Gaza Livre, patrocinada pela organização de caridade turca IHH. "Vocês romperam uma fronteira política e deram início ao fim do bloqueio a Gaza."
A Turquia tem despertado admiração nos palestinos pelas críticas ferozes do premiê Recep Tayyip Erdogan a Israel e pelas ameaças veladas de romper relações diplomáticas com o país.
Em Gaza, ninguém incorpora com mais intensidade essa admiração do que o chefe do escritório local da IHH, Mehmet Kaya, que passou a receber tratamento de herói nacional aonde quer que vá.
Em entrevista à Folha, Kaya disse que sua organização tem planos ambiciosos de ajuda aos palestinos. Em 2009, a verba da IHH para projetos humanitários em Gaza chegou a R$ 45 milhões, e o montante deste ano deve dobrar. Os recursos, garante Kaya, vêm inteiramente de doações.
"Queremos melhorar a vida da população de Gaza, mas nosso principal objetivo é romper o bloqueio", diz.

TERRORISMO
Fundada em 1992 com o propósito de prestar assistência a populações atingidas por crises humanitárias, a IHH é acusada por Israel de laços com o terrorismo.
A alegação foi corroborada por Jean-Louis Bruguière, ex-chefe da unidade de contraterrorismo do Judiciário francês. Segundo ele, que investigou o grupo nos anos 90, a IHH manteve "clara ligação" com grupos terroristas, incluindo a Al Qaeda.
Hoje a IHH tem relações calorosas com os líderes do Hamas, que no passado esteve por trás de dezenas de atentados contra civis em Israel. Mesmo com os indícios apontados por Bruguière e outras fontes europeias, Mehmet Kaya diz que as acusações fazem parte da propaganda israelense.
"Estamos presentes em 112 países, mas só um país nos acusa de terrorismo", diz ele. "O maior grupo terrorista do mundo é Israel, que roubou as terras dos palestinos e os mantém presos em Gaza."
O grupo ganhou projeção atuando no vácuo de recursos em Gaza. No início do ano, quando entraram com um comboio humanitário pelo Egito, ativistas da IHH distribuíram dinheiro vivo. De uma tacada, alguns receberam mil euros, o equivalente a quatro meses de salário de um funcionário público palestino. (MARCELO NINIO)


Texto Anterior: Na faixa
Próximo Texto: Hamas admite que túneis são utilizados para tráfico de armas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.