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COMPORTAMENTO
Problema, causa prejuízo anual de US$ 117 bilhões nos EUA, leva companhias alimentícias a rever seus produtos
Obesidade muda oferta de comida no mundo
ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK
O crescimento da obesidade começa a mudar significativamente
a oferta de comida pelo mundo.
Após anos concentrada na demanda -ou seja, em educação
alimentar das pessoas-, a pressão passa agora para o outro lado.
A reviravolta ganhou forma
com o anúncio feito na última semana pela Kraft, líder americana
no setor alimentício e segunda
maior empresa do tipo no mundo. A companhia vai estabelecer
um teto para o tamanho das porções que vende. Irá reestudar o
conteúdo de alguns produtos, de
forma a torná-los menos calóricos. Cessará todo o programa de
marketing dentro das escolas.
Enquanto outras empresas trilham os passos da Kraft, autoridades públicas e organizações internacionais introduzem barreiras à
oferta de comida.
A revolução começa já no próximo ano letivo nas escolas públicas
de Nova York, o maior sistema civil de alimentação dos EUA. Pizzas e nuggets vão encolher, doces
irão sumir, assim como os refrigerantes, que serão tirados das máquinas de alimentação.
Um deputado nova-iorquino
apresentou uma proposta para
que se cobre 1% do faturamento
com comidas gordurosas e os gastos em sua publicidade. Na Califórnia, a idéia é taxar refrigerantes
e repassar o dinheiro a escolas que
deixem de vendê-los. Já a Associação Médica Britânica propôs recentemente imposto de 17,5% sobre comidas gordurosas.
A OMS (Organização Mundial
de Saúde) encerrou em junho
uma rodada de reuniões com associações empresariais do setor.
Vai condensar o debate numa estratégia global de alimentação.
"A magnitude e a velocidade do
aumento da epidemia horrorizam autoridades de saúde; os custos serão estonteantes. E a ameaça
de processos, novas leis e hostilidade pública assustam as empresas", afirma Marion Nestle, professora de nutrição da New York
University e autora de livro sobre
o tema.
Especificamente, o anúncio
mundial da Kraft é emblemático
da discussão em andamento agora. Controlada pela Altria (ex-Philip Morris), gigante do setor de
tabaco, ela diz que tomou tal decisão porque quer participar da reação ao problema de peso.
"Queremos ser responsáveis e
dar uma resposta à questão global
da obesidade", diz Jonathan Atwood, porta-voz da empresa.
"Queremos deixar claro que o que
nós vendemos e como vendemos
é feito responsavelmente em relação à maneira que as pessoas comem e à questão do peso", afirma
Atwood.
Processos judiciais
Mas o anúncio foi seguido por
intermináveis comparações entre
a situação atual do setor de alimentos e a da indústria de tabaco
na década passada, quando foi alvo de processos judiciais e novas
regulamentações.
"O crescimento da obesidade a
proporções epidêmicas é motivo
de séria preocupação para a indústria de alimentos", escreveram
analistas do banco JP Morgan em
relatório. "Dado o custo humano
do mal, acreditamos que os governos não poderão ignorar a
pressão de organizações de saúde
para agir. Fabricantes de comida
correm o risco de aumento nas regulações. Também acreditamos
que os riscos de processos não devem ser subestimados. A indústria vai ter que rever seu marketing e se transformar."
As empresas rebatem apontando a liberdade dos consumidores
em fazer o que querem e pregam a
necessidade de reeducação física e
alimentar, algo repetido há anos
por médicos. Do ponto de vista
das empresas, o problema é que a
tentativa de regular a demanda
não tem contido o problema.
"A obesidade está se tornando
um problema em países como
China e Índia, que eram tradicionalmente tão pobres que ninguém ficava gordo. A comida ficou tão barata que qualquer pessoa pode engordar se não tiver
um trabalho que exija muita atividade física", diz Jack Calfee, do
American Enterprise Institute.
A estimativa da OMS é que os
obesos somem mais de 300 milhões pelo mundo, sendo 115 milhões em países subdesenvolvidos
-tradicionalmente mais preocupados com o problema oposto, a
subnutrição. Doenças relacionadas ao excesso de peso representam 59% das 56,5 milhões de
mortes anuais no globo.
Nos EUA, o problema já foi declarado "epidêmico" pelo governo. Em 20 anos, a obesidade dobrou entre os adultos. A perspectiva para o futuro é pior ainda, já
que os índices crescem mais rápido ainda entre as crianças -no
mesmo período, triplicaram.
Estudo do Harvard Institute of
Economic Research mostra que,
no período, o maior crescimento
no consumo de calorias se deu
nos lanches -campo dominado
por produtos industrializados.
Segundo o governo, 61% dos
americanos estão acima do peso,
e 27% deles são obesos (ou seja,
com índice de massa corpórea a
partir de 30). Há mais gente sofrendo com a balança do que fumando diariamente ou enfrentado problemas de alcoolismo.
Por ano, o prejuízo nos EUA
por causa da obesidade é de US$
117 bilhões (pouco menos que todo o PIB do Peru, por exemplo).
O número incluiu as perdas econômicas com mortes precoces,
queda de produtividade e investimento extra em saúde. Levantamento da Rand Corporation indica que obesos gastam 77% mais
em medicamentos do que quem
não tem problemas de peso.
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