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São Paulo, domingo, 06 de julho de 2003

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El Paso nutre desejo de migrar e medo da insegurança

MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A EL PASO

Em cada uma de suas esquinas e em seus vários restaurantes de comida tex-mex, El Paso reflete tanto o desespero dos mexicanos que buscam entrar nos EUA quanto a paranóia em relação à segurança que tomou conta dos americanos após 11 de setembro de 2001, mas sempre existiu nessa região.
Três, quatro, cinco ou até seis cercas de metal chegam a separar o eldorado texano da vizinha Ciudad Juárez, maior cidade do Estado mexicano de Chihuahua com mais de 1,3 milhão de habitantes. Com os cerca de 700 mil de El Paso, é formada uma conurbação de 2 milhões de moradores que, de cada lado do rio, vivem situações absolutamente distintas.
O rio Grande (ou río Bravo, para os mexicanos) não impressiona, espremido entre cercas e muros de metal ou concreto. Todos os dias, milhares de mexicanos atravessam legalmente as pontes que separam as duas cidades sem preocupar as autoridades americanas. Trata-se de mão-de-obra barata para a abastada El Paso.
Todavia as centenas de milhares de pessoas que cruzam a fronteira ilegalmente por ano são idéia fixa das autoridades da cidade. Prova disso é o impressionante aparato de segurança exposto ao longo da divisa. A Border Patrol, a polícia americana responsável pela vigilância da fronteira, conta com picapes e pessoal muito bem treinado para desempenhar o trabalho.
Parte significativa de seu cotidiano é reservada à sua luta perpétua contra os "coiotes", os traficantes de migrantes, que dão falsas esperanças aos candidatos à clandestinidade e, com frequência, os abandonam no deserto. Justiça seja feita: a Border Patrol salva inúmeros clandestinos deixados pelos "coiotes", fornecendo-lhes alimentos e tratamento médico. O calor é terrível, e o clima, bastante seco na região.
Para dificultar ainda mais a entrada de estrangeiros, ela conta com a ajuda e o know-how da Força-Tarefa Conjunta Seis (FTCS), uma operação militar cuja missão oficial original é ajudar a polícia na "guerra contra as drogas". Após os atentados de 2001, ela também realiza trabalhos ligados ao combate ao terrorismo.
Sua sede fica no forte Bliss, local em que o presidente George W. Bush recebeu prisioneiros de guerra vindos do Iraque, em abril.
No que se refere à vigilância da fronteira, a FTCS levanta cercas e muros, reforma estradas e constrói pontes para facilitar o trabalho da Border Patrol. Essa política tornou as zonas urbanas bastante policiadas, compelindo os migrantes clandestinos a aventurar-se pelo deserto. A FTCS também está preparada para fornecer à polícia especialistas em diversas áreas ou professores de espanhol.
Contudo isso provavelmente não seja necessário: todo mundo fala espanhol em El Paso. Aliás, muito mais do que inglês. Em suas lojas ou em seus restaurantes, os funcionários abordam os clientes em castelhano mesmo que ele pareça ser americano.
A migração clandestina também preocupa as autoridades mexicanas. Entretanto, como disse à Folha um alto funcionário mexicano -que não quis ser identificado-, "muito mais teria de ser feito por ambas as partes". "Ciudad Juárez é muito longe da Cidade do México, e El Paso é longe demais de Washington."
"Castañeda era o único que pensava realmente nos problemas da região, mas ele não está mais no poder", lamentou o alto funcionário mexicano, aludindo ao primeiro chanceler do gabinete do presidente Vicente Fox, Jorge Castañeda, articulador da aproximação com os EUA, que deixou o posto em janeiro passado por "razões pessoais".
Todavia Steven Barracca, especialista em política mexicana da Universidade do Texas em El Paso, discorda da opinião do alto funcionário mexicano. "Qualquer político do México sonha em chegar a um acordo migratório com os EUA, pois a população é totalmente favorável a isso", avaliou.
Os problemas econômicos do Estado de Chihuahua tendem a agravar-se, segundo especialistas. Muitas "maquiladoras" (empresas que se mudaram para o México apenas para montar produtos -em busca de mão-de-obra barata) estão se mudando para a China, onde o custo do trabalho é ainda menor, o que já constitui um golpe na economia da região.
Assim, ante um quadro de pouca esperança para a população de Chihuahua, um dos mais pobres Estados mexicanos, a tendência é o aumento dos problemas na região de El Paso e Ciudad Juárez.


O jornalista Márcio Senne de Moraes viajou a convite do governo dos EUA


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