São Paulo, sexta-feira, 06 de agosto de 2010

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"Pressão no Irã é insuportável", afirma o advogado de Sakineh

Defensor de "adúltera" condenada a morrer apedrejada agradece a Lula pela oferta de asilo

Da Turquia, onde busca asilo, iraniano diz que sua mulher, presa desde o dia 24, é uma "refém" das autoridades do país


Arquivo pessoal
O advogado, foragido do Irã

GABRIELA MANZINI
DE SÃO PAULO

Notório defensor dos direitos humanos no Irã, o advogado Mohammad Mostafaei, 36, fugiu do país na semana passada depois de ser interrogado e de ter a mulher e o sogro presos.
Na Turquia, Mostafaei foi levado à cadeia pelas autoridades. Da prisão em Istambul ele falou à Folha, por telefone. "Tenho muito amor pelo Irã e pelo meu trabalho. Infelizmente, a pressão que sofro é insuportável", disse.
Mostafaei tem sido especialmente incômodo ao regime dos aiatolás pela defesa de Sakineh Ashtiani, condenada à morte por apedrejamento pelo "crime" de adultério e atual pivô de campanha global por sua soltura.

Folha - Quando você concluiu que precisava fugir do Irã?
Mohammad Mostafaei
- Há mais de dois anos, sofro uma pressão muito grande. Meus casos tinham importância internacional, sendo o mais recente o de Sakineh. A gota d'água foi pegarem como reféns minha mulher e seu pai. Tenho muito amor pelo Irã e pelo meu trabalho. Posso dizer que já ajudei a salvar a vida de mais de 50 pessoas. Eu quero atuar no Irã, mas, infelizmente, a pressão que sofro é insuportável.

Qual é a situação de sua mulher [que segue presa] e filha?
Minha mulher está em uma solitária há 12 dias, na cela 209 da prisão de Evin. Minha mulher não cometeu nenhum crime e está numa situação muito difícil. Minha filha, agora, não tem a atenção nem do pai nem da mãe.

E sua fuga do Irã, como foi? Como você chegou à Turquia?
Depois que eu decidi abandonar o Irã, soube que havia um alerta às fronteiras e aeroportos para me prenderem. Fui à fronteira de carro e andei duas horas até chegar à Turquia. Paguei para ir de cavalo a uma cidadezinha e, de carro, fui a Van. Lá informei as autoridades.

E você foi preso?
Estou sob custódia por questão de segurança. Eles disseram: "Vamos ter de tomar conta de você". Mas é como se estivesse preso. Esse telefone que eu estou usando entrou de forma clandestina.

Houve ofertas de asilo?
Muitos países europeus já mandaram representantes. A chance maior é de ir à Noruega. Mas devo ficar mais quatro ou cinco dias aqui.

Qual é a situação de Sakineh?
Primeiro eu gostaria de agradecer ao presidente do Brasil pela intenção de proteger a minha cliente ao anunciar que aceitaria o seu asilo. Essa atitude humanitária deveria ser repetida por todos os países e todos os chefes de Estado do mundo. Quando o presidente fez o convite, repercutiu no mundo inteiro. E deu forças para Sakineh e sua família. Permitiu que ela aguentasse melhor essa provação.

Ela cometeu algum crime?
Ela não cometeu crime nenhum. O caso não tem nada a ver com as acusações feitas a ela. Os filhos cuidam do bem-estar dela. Se tivesse havido crime [participar da morte do marido], os filhos seriam os primeiros a se manifestar. Para provar adultério, precisam existir testemunhas de quatro ocasiões [relações sexuais] ou quatro testemunhas de uma mesma ocasião. E não há testemunha. Esta é a maior prova de que o processo não está correto.

O que acontecerá com ela?
Por enquanto, é incerto, mas, por sua exposição, não acredito que será executada, muito menos apedrejada.

Tradução de FLAVIO AZM RASSEKH



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