São Paulo, quarta-feira, 06 de setembro de 2006

Texto Anterior | Índice

Argentina derruba indulto de líder do golpe militar

Jorge Videla, que governou o país de 76 a 81, poderá ser julgado por seqüestros

Decisão, que ainda será apreciada por três cortes, sai um dia depois da anulação dos perdões concedidos sob Menem a dois ex-ministros

BRUNO LIMA
DE BUENOS AIRES

Um dia depois de declarar inconstitucionais os indultos concedidos pelo ex-presidente Carlos Menem a dois ex-ministros de Estado da última ditadura militar, a Justiça argentina fez o mesmo com o benefício de que gozava o ex-ditador Jorge Rafael Videla, 81, que liderou o golpe militar e comandou a Argentina de 1976 a 1981.
Trata-se de decisão em primeira instância, que ainda será apreciada por outras três cortes até que se torne definitiva. Outros indultos já foram anulados no país, mas nenhum até agora foi apreciado por mais de duas instâncias. O processo mais importante de anulação é o dos crimes relacionados à Esma (Escola de Mecânica da Armada), a maior prisão ilegal da ditadura.
Videla, assim como os ex-ministros José Alfredo Martínez de Hoz, 81, e Albano Harguindeguy, 79, poderá agora ser condenado e punido pelo seqüestro de dois empresários em 1976.
Federico Gutheim e seu filho Miguel Ernesto ficaram cinco meses em poder do governo, durante a gestão de Videla. O objetivo era pressioná-los a aceitar um contrato de exportação para sua empresa, uma produtora de algodão, beneficiando o Ministério da Economia (então comandado por Martínez de Hoz) em um negócio em Hong Kong. Os empresários processaram o Estado argentino, e foram indenizados em US$ 16 mil em 1990.

"Um olho só"
Videla cumpre prisão domiciliar preventiva determinada em processo em que é apontado como o maior responsável no país pela "Operação Condor" -coordenação entre os serviços de inteligência das ditaduras sul-americanas nos anos 70 e 80 para perseguir supostos opositores.
Martínez de Hoz também foi processado por sua atuação como ministro na contratação da dívida externa argentina, que quadruplicou em sua gestão.
Seu filho, José Alfredo Martínez de Hoz, disse que o pai não pediu para ser indultado. Segundo ele, "hoje a Justiça argentina não é independente" e "enxerga com um olho só", sugerindo que o governo Néstor Kirchner influenciou a decisão.
A revisão da constitucionalidade dos indultos foi pedida formalmente pelo governo. Em 24 de março, em ato de repúdio pelo aniversário de 30 anos do golpe militar, Kirchner anunciou que faria o pedido.
Em 1989 e 1990, Menem concedeu o indulto a 289 pessoas -65 delas eram acusadas de subversão contra a ditadura; as demais integravam o regime.
Os indultos foram uma ampliação do perdão dado no governo do presidente Raúl Alfonsín (1983-1989), com as chamadas "leis do perdão". Aprovadas em 1986 e 1987, as duas normas livraram de processos cerca de 2.000 pessoas, entre civis e militares, e definiram que militares e policiais abaixo do cargo de coronel só cumpriam ordens ao violar direitos humanos na ditadura.


Texto Anterior: Cuba: 18 kg mais magro, Fidel diz que "momento crítico" passou
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.