São Paulo, sexta-feira, 06 de novembro de 2009

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Líder palestino diz que não tentará se reeleger

Mahmoud Abbas, que comanda Autoridade Nacional Palestina desde 2005, diz que não disputará pleito presidencial de janeiro

Político atribui decisão à frustração com a paralisia do processo de paz e com o recuo da pressão americana para Israel congelar colônias


Bernat Armangue/Asssociated Press
Abbas anuncia renúncia à candidatura em Ramallah, Cisjordânia; sucessão ainda é uma incógnita

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Num discurso em que não poupou críticas a Israel, Estados Unidos e ao grupo rival Hamas, o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, afirmou ontem que não pretende disputar a reeleição na votação convocada para janeiro de 2010.
Citando sua frustração com a paralisia do processo de paz e com o recuo da pressão americana para que Israel congele a construção de assentamentos nos territórios palestinos, Abbas disse que não tem intenção de voltar atrás, apesar das exaustivas tentativas de dissuadi-lo. Mas sua decisão de sair de cena esbarra na complexa realidade política palestina e na ausência de um sucessor claro.
Para começar, a menos de três meses da data marcada, a eleição presidencial parece longe de se tornar realidade, devido às diferenças entre as duas principais facções palestinas -o secular Fatah, de Abbas, que controla a Cisjordânia, e o islâmico Hamas, que governa a faixa de Gaza.
Abbas, 74, que substituiu o líder histórico palestino Iasser Arafat (1929-2004) como presidente da ANP, convocou a eleição unilateralmente, depois de nova tentativa fracassada de selar acordo com o Hamas.
O grupo islâmico radical rejeitou a convocação, afirmando que sem uma reconciliação boicotará as eleições.
Se a votação não ocorrer, Abbas teoricamente continua no cargo -seu mandato original já está expirado desde janeiro.
Diante desse quadro, a opinião de muitos analistas, tanto israelenses como palestinos, é de que o anúncio de Abbas tem boa dose de pressão sobre seus interlocutores. O presidente, entretanto, garantiu que não.
"Isso não é uma barganha nem uma manobra", afirmou Abbas. Ele acusou Israel de "destruir" o processo de paz com a cumplicidade dos EUA.
O presidente da ANP vive um momento de intenso desgaste, depois das críticas que sofreu por ter cedido aos apelos americanos para adiar a votação nas Nações Unidas de um relatório sobre a ofensiva israelense em Gaza no começo do ano.
O relatório Goldstone, que acusa Israel de crimes de guerra, acabou sendo aprovado na ONU, mas a pressão doméstica sobre Abbas manteve-se latente. Ela aumentou depois que a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, mostrou tolerância com a recusa israelense em congelar os assentamentos, durante visita a Israel no último fim de semana.
"Ficamos surpresos com as recentes declarações dos americanos, que parecem apoiar a posição de Israel", queixou-se o presidente da ANP.
Assessores disseram que estão insistindo para que continue ele candidato à reeleição.

Reações
O governo americano pareceu entender que a decisão de Abbas é irreversível. "Estou pronta a trabalhar com o presidente Abbas em qualquer que seja a sua nova capacidade", disse ontem Hillary.
O ministro da Defesa de Israel, Ehud Barak, disse ter esperanças de que a decisão não prejudique uma eventual retomada das negociações de paz, congeladas desde a ofensiva israelense na faixa de Gaza, em dezembro e janeiro.
O Hamas viu no pronunciamento de Abbas a comprovação de que o processo de paz está morto. "Nosso conselho é que ele encare o povo palestino e diga francamente que o caminho da negociação fracassou", disse Sami Abu Zuhri, porta-voz do grupo islâmico.
Israel reagiu com cautela, manifestando esperança de que Abbas aceite retomar a negociação sem precondições.
Abbas é um dos últimos líderes históricos da ANP, e sua saída, se confirmada, deixará um vácuo que poucos arriscam prever como será preenchido. "Não há sucessores óbvios", diz o cientista político Said Zeidani, da Universidade Beir Zeit, nos arredores de Ramallah, Cisjordânia. "A briga pela sucessão será feroz", prevê.


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