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ANÁLISE
Sinal é positivo, com "pegadinha"
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Toda iniciativa de Barack
Obama que contradiz a posição
de seu antecessor, George W.
Bush, acaba enviando um sinal
positivo. Nem sempre pelo valor intrínseco do movimento,
mas pela inevitável comparação com o período anterior
-não exatamente o mais popular, interna e externamente.
Essa comparação vale para a
nova doutrina nuclear americana, anunciada ontem.
É só lembrar os enunciados
de Bush e de Obama. Bush: "Armas nucleares desempenham
um papel crítico na capacidade
de defesa dos EUA, seus aliados
e amigos. Provêm opções militares críveis para deter um amplo leque de ameaças, incluindo armas de destruição em
massa e forças militares convencionais de grande escala".
A lista de alvos potenciais
era, portanto, alentada, mais
ainda pelo unilateralismo com
que Bush decretava quem tinha
e quem não tinha armas de destruição em massa.
Obama: "Os EUA não usarão
ou ameaçarão usar armas nucleares contra Estados desprovidos de armas nucleares que
sejam membros do TNP".
A lista de alvos potenciais cai,
portanto, a oito, que é o número de potências nucleares, fora
os próprios EUA.
O sinal positivo contém, no
entanto, uma digamos "pegadinha", que surge no complemento: não haverá uso nem
ameaça de uso contra países
não nucleares desde que "cumpram com suas obrigações de
não proliferação".
Volta-se, nesse ponto, à interpretação subjetiva e, por extensão, ao arbítrio. Até o Brasil,
em tese, pode sentir-se ameaçado, na medida em que se recusa a assinar o Protocolo Adicional ao TNP, instrumento
que permite inspeções de surpresa e, portanto, mais aptas a
detectar o cumprimento ou
não das obrigações inerentes
ao TNP em si.
Não assinar o protocolo é não
cumprir o TNP propriamente
dito? Trata-se, como é óbvio, de
questão de interpretação.
Mas é igualmente óbvio que o
alvo não é o Brasil, mas os suspeitos de sempre, Irã e Coreia
do Norte, como deixou claro, se
necessário fosse, o porta-voz de
Obama, Robert Gibbs.
Seria impensável retirar a
ameaça ao Irã, dadas as condições políticas internas nos EUA
e também a pressão de aliados
como, principalmente, França,
Alemanha e Israel. Afinal, há
um certo consenso interno de
que "se o programa nuclear iraniano continuar a avançar no
ritmo atual, Teerã poderia ter o
material nuclear necessário para construir a bomba antes de
que termine o mandato de Obama", conforme análise de James Lindsay e Ray Takeyh, do
Council on Foreign Relations.
Resta saber se manter o Irã
na lista de alvos muda algo.
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