São Paulo, segunda-feira, 07 de junho de 2010

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Arca de Noé moderna aproxima ditaduras

Zimbábue vai mandar à Coreia do Norte carregamento com 12 animais

Negócio deve render no mínimo US$ 23 mil ao governo Mugabe; venda é criticada por ONGs ecológicas zimbabuanas

FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A HARARE

Dois bebês elefantes, duas girafas, duas zebras, dois macacos, duas hienas, dois chacais.
A lista de compras do ditador norte-coreano Kim Jong-il para o zoológico de Pyongyang foi apresentada a seu colega ditador Robert Mugabe, do Zimbábue, no início do ano. Negócio fechado, começaram os protestos.
"A Arca de Noé de Mugabe", como vem sendo chamada, renderá US$ 23 mil para o Zimbábue, segundo a informação oficial do governo. Ou pelo menos o dobro disso, de acordo com ONGs.
Mas o verdadeiro custo, segundo ambientalistas, é para o frágil ecossistema do Zimbábue, já ameaçado pelo crescimento desordenado de fazendas.
"Não faz sentido tirar esses animais de seu habitat, onde poderiam ser vistos por turistas, e jogá-los num país de clima frio como a Coreia do Norte", diz Johny Rodrigues, diretor da ONG local Zimbabwe Conservation Task Force.
Bobagem, diz o governo. A exportação de animais selvagens para zoológicos ocorre em diversos países africanos, e o Zimbábue tem contratos semelhantes com países como Espanha e Japão.
"Não é uma doação, é um negócio que fazemos sempre para arrecadar recursos para a preservação ambiental no país. A diferença é que nesse caso a venda está sendo politizada", afirma Vitalis Chadenga, diretor-geral da Autoridade Zimbabuana de Parques e Vida Selvagem, estatal responsável pelo negócio.

ALIANÇA
Há motivos para a "politização". Zimbábue e Coreia do Norte, além de integrarem o clube das ditaduras, têm relações bastante próximas. A começar por um memorial em Harare em homenagem aos heróis zimbabuanos, projetado pelos norte-coreanos. De arquitetura tipicamente stalinista, com gigantescas estátuas douradas de trabalhadores olhando para o infinito, abrigará um dia o mausoléu de Mugabe, 86.
Há aspectos mais sinistros da parceria. Nos anos 80, o Exército norte-coreano treinou a Quinta Brigada do Exército zimbabuano, responsável pelo massacre de 20 mil pessoas no sul do país.
Segundo o governo do Zimbábue, os norte-coreanos deram garantias de que os animais serão bem tratados. Uma equipe viajou à capital, Pyongyang, para checar as instalações do zoológico.
Por enquanto, a arca de Mugabe segue "estacionada". Até o fim do mês, os animais, já capturados, ficarão em quarentena numa reserva no oeste do país. Depois disso, no entanto, devem partir -não de barco, como na Bíblia, mas de avião.


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