São Paulo, segunda-feira, 07 de julho de 2008

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Ministro da Defesa é plano B de Uribe para continuar governo

Holofotes obtidos com resgate de reféns fazem de Santos candidato natural caso Carta não seja mudada para permitir terceiro mandato

Mais intelectualizado, rico e com trânsito no exterior, perfil do homem-forte do governo contrasta com o do atual líder, popularíssimo


Fernando Vergara-2.jul.08/Associated Press
O ministro Santos observa a ex-refém Ingrid Betancourt abraçar a mãe após ser resgatada

ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A BOGOTÁ

O consenso na Colômbia é que só há uma alternativa para as eleições de 2010: ou o presidente Alvaro Uribe será eleito para o terceiro mandato (caso queira e consiga mudar a Constituição) ou fará o seu sucessor. Neste caso, o nome mais forte, pelo cargo que ocupa, pela proximidade de Uribe e pela ambição política, é o do ministro da Defesa, Juan Manuel Santos.
A decisão de Uribe de recuar dos holofotes e delegar a Santos o anúncio do resgate da ex-presidenciável Ingrid Betancourt, de três norte-americanos e de 11 soldados e policiais colombianos foi entendida nos meios políticos como um sinal, o de que Uribe passa a testá-lo, como plano B, para 2010.
Em entrevista publicada ontem pelo jornal "El Tiempo", da sua família e que ele já dirigiu, Santos falou como quem espera as bênçãos de Uribe. Ao admitir que teve benefícios políticos pelo êxito da operação de resgate, disse que dará "apoio incondicional" a Uribe se ele decidir concorrer mais uma vez -e, se não, está disposto a apoiar quem ele indicar.
Duas pesquisas divulgadas ontem em Bogotá dão 72% e 79% para Uribe se houver re-reeleição -medida apoiada por 77% na primeira enquete.
Caso ele não dispute, uma das pesquisas, a do Centro Nacional de Consultoria, lança Ingrid Betancourt como o grande fato novo, com 31% das intenções de voto. A outra, do Instituto Ipsos-Napoleón Franco, publicada pelo jornal "El Espectador", mostra a ascensão lenta e segura de Santos, que foi de 5% para 10%.
A avaliação é que o nome de Ingrid está sendo maciçamente lembrado não exatamente como potencial candidatura à Presidência, mas pela evidência que ela conquistou em mais de seis anos de cativeiro e com a superexposição interna e externa depois da libertação, na quarta-feira passada.
As especulações sobre o futuro político de Ingrid são muitas, a última delas de que possa ser vice de Uribe caso ele dispute a re-reeleição. Se ela pode ser meteórica, sem fôlego, Santos é tido como a opção consistente.

Duro, rico e sofisticado
Juan Manuel Santos, que completa 57 anos em agosto, é o homem-forte do governo. O Ministério da Defesa é particularmente importante num país conflagrado como a Colômbia, com 6% a 7% do PIB (cerca de US$ 370 bilhões em 2007) e 400 mil homens das três Forças Armadas e da Polícia.
Ao contrário de Uribe -descrito ora como "um Bush colombiano", ora como um "matuto com muito faro político"-, Santos vem de uma das famílias mais ricas e tradicionais da Colômbia, é intelectualmente refinado, fala línguas, tem trânsito internacional e desenvoltura nos meios diplomáticos.
Exemplo: ele tem bons contatos com o embaixador brasileiro, Valdemar Carneiro Leão, a quem conheceu em Londres há décadas. "O ministro é um homem muito hábil, muito inteligente", diz o diplomata.
Uribe deslanchou a carreira política como prefeito de Medellín e faz o gênero populista, usa chapelões de vaqueiro e consome horas e horas diante das câmeras de TV forjando "entrevistas" com cidadãos sobre os temas mais comezinhos da vida colombiana.
Santos, economista e administrador de empresas, foi representante dos cafeicultores no Reino Unido por oito anos, tem pós-graduação em Londres e em Harvard e consolidou uma imagem séria, intelectual e sobretudo dura. Mas nunca disputou uma eleição popular.
Seu tio-avô, Eduardo Santos, foi presidente de 1938 a 1942, e sua família é dona há décadas do "El Tiempo", principal jornal colombiano, no qual o ministro atuou por uma década, como diretor-presidente do Conselho Editorial e jornalista. Chegou a ganhar o prestigiado prêmio Rei de Espanha ao cobrir a guerra na Nicarágua.
O principal ponto de ligação entre Uribe e Santos é que ambos são de direita, pró-Washington e linha dura no combate ao narcotráfico e às Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). E ambos são assumidamente adversários do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, apontado como o líder das esquerdas no continente.
A diferença é que Santos consegue ser mais duro ainda do que Uribe e, por exemplo, é quem mais assume a linha de frente quando se trata de guerrear verbalmente com Chávez.
Há alguns anos, Santos teve um encontro na Costa Rica com o então líder das Farc Raúl Reyes (assassinado em março numa ação militar da Colômbia em território equatoriano). A versão corrente é que ele não deixou margem de dúvidas, ao se apresentar a Reyes: "Eu represento tudo o que vocês atacam, as oligarquias, o "El Tiempo" e o Partido Liberal".
Hoje, Santos é do Partido de la U, o mais uribista, no qual o vice-presidente é o seu primo Francisco Santos. E ele não é a única opção para a Presidência. Na hipótese de Uribe fora da disputa, o mais afoito é Sérgio Fajardo, que também foi prefeito de Medellín e tenta repetir a trajetória de Uribe. Na pesquisa do "El Espectador", tem 12%, ante os 10% de Santos.
Na oposição, a situação é de quase desespero. Um dos nomes mais fortes é o do senador Gustavo Petro, do Pólo Democrático Alternativo, de centro-esquerda. Mas ele tem apenas 5%, sem Uribe no páreo, e não teve alternativa diante da libertação de Ingrid a não ser elogiá-la. Santos assumiu o risco pela missão e foi o porta-voz do êxito. A oposição ficou ainda mais sem discurso e sem rumo.


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