São Paulo, quinta-feira, 07 de setembro de 2006

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11/9 - CINCO ANOS DEPOIS

Bush admite existência de prisões secretas

Presidente anuncia transferência de suspeitos em poder da CIA para Guantánamo e pede criação de tribunais militares especiais

Para americano, detenções clandestinas denunciadas no ano passado são "cruciais"; Pentágono divulga novo manual

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

. George W. Bush admitiu ontem a existência no exterior de prisões secretas da CIA, a agência de inteligência norte-americana. Chegou mesmo a chamar de "crucial" a manutenção do artifício, amplamente criticado pela comunidade internacional e por entidades de direitos civis. É a primeira vez que o presidente norte-americano reconhece tais prisões desde que o jornal "The Washington Post" revelou sua existência, em novembro passado.
Em discurso na tarde de ontem na Casa Branca, Bush anunciou ainda a transferência de 14 suspeitos de pertencerem à organização terrorista Al Qaeda da custódia da CIA para a prisão da base militar de Guantánamo, em Cuba. Entre eles, Khalid Sheikh Mohammed, que seria o autor intelectual do 11 de Setembro. Disse também que enviaria ao Congresso proposta de legislação para a criação de tribunais militares "especiais", nos quais os suspeitos serão julgados.
Horas antes, o Pentágono divulgara seu novo manual de conduta militar. Intitulado "Human Intelligence Collector Operations" ("operações do coletor de inteligência humana"), proíbe que seus interrogadores usem contra os prisioneiros, entre outras táticas, surras, humilhações sexuais, ameaças com cachorros, falsas execuções, afogamentos e nudez forçada. Permite, porém, que escondam ou mintam sobre sua verdadeira identidade.
Recentemente, a Suprema Corte do país decidiu que também os suspeitos de terem praticado atos de terrorismo detidos pelos EUA devem ser tratados segundo a Convenção de Genebra sobre prisioneiros de guerra. A posição do Pentágono era a de que os artigos da convenção internacional seriam respeitados como "política" -mas não como "lei", pois os "combatentes inimigos" não estariam sob o comando de um governo, mas de uma organização terrorista.
A proposta enviada pelo presidente ontem propõe a criação de "comissões militares" que julgarão tais suspeitos por crimes de guerra, mas mantém o status destes como "detidos de alto valor", rejeitando de novo o conceito de "prisioneiros de guerra". "Bush quer mudar as regras do jogo para que ninguém de sua administração fique vulnerável a processos no caso provável de o Congresso trocar de comando", disse à Folha Juan Cole, professor de história da Universidade de Michigan e dono do blog liberal Informed Comment.
De qualquer maneira, é pouco provável que este Congresso aprove qualquer lei sobre o assunto até novembro, quando será parcialmente renovado e pode cair no controle da oposição. Tanto o discurso quanto as medidas anunciadas ontem, no entanto, fazem parte de nova estratégia da Casa Branca. A tática, mais agressiva, é retomar o mando do tema "guerra ao terror", que domina tanto o quinto aniversário do ataque terrorista do 11 de Setembro quanto a campanha de republicanos e democratas para as eleições do final do ano.

"Homens perigosos"
"Esses são homens perigosos com conhecimento sem paralelo sobre as redes de terror e seus planos de ataques", disse Bush sobre os detidos. "A segurança de nosso país e as vidas de nossos cidadãos dependem de nossa habilidade de conhecer o que estes terroristas sabem."
Ao defender a existência das prisões clandestinas da CIA, Bush disse que a agência continuaria a deter e interrogar prisioneiros, embora ninguém esteja atualmente sob custódia do departamento, segundo o presidente. Sobre as técnicas de interrogatório, alvo maior das críticas, ele as definiu como "duras, seguras e necessárias".
O presidente referiu-se especificamente ao caso de Abu Zubaydah, ex-ajudante de Osama bin Laden, cujo interrogatório teria levado à prisão de Khalid Sheikh Mohammed, que teria levado à prisão de outros suspeitos de terrorismo. É a primeira vez que o presidente cita casos específicos na defesa de sua política, assim como entra em detalhes sobre técnicas.
Durante seu discurso, de 36 minutos, o segundo da semana sobre a guerra ao terror, o presidente foi interrompido quatro vezes por aplausos da platéia, que contava com parentes de vítimas do 11 de Setembro. O Departamento da Defesa foi citado duas vezes; seu titular, nenhuma. Ontem, democratas iniciavam manobras para pedir a cabeça de Donald Rumsfeld.


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