São Paulo, quinta-feira, 07 de setembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

É hora de acatar Justiça, diz novo embaixador mexicano

Para diplomata, que defende IFE, "Obrador dá a entender que só aceitaria vitória"

Valencia afirma que falta vontade política para criar aliança entre Brasil e México e que política externa do país é "muito autônoma"

RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL

Para o novo embaixador do México no Brasil, Andrés Valencia, 57, a prioridade é tentar concretizar a propalada aliança entre os dois maiores países da América Latina. Em 33 anos de carreira, Valencia já foi embaixador em Israel e na Colômbia. Leia os principais trechos da entrevista que concedeu à Folha, na qual comentou a decisão do Tribunal Federal Eleitoral mexicano de declarar, anteontem, a vitória do conservador Felipe Calderón, depois de não encontrar provas de fraude na votação de 2 de julho, como denunciara o candidato de esquerda, José López Obrador

 

FOLHA - Persistirão dúvidas sobre a legalidade do resultado eleitoral?
ANDRÉS VALENCIA
- Pode ter havido irregularidades próprias de qualquer eleição, mas a Justiça não viu razões para invalidar o resultado. Foi uma competição apertada. Na Itália também houve diferença pequena, e Berlusconi recorreu à Justiça. Como houve fraudes no passado e havia o sistema hegemônico criado pelo PRI, a reforma do sistema eleitoral foi construída para evitar qualquer desconfiança. O Instituto Federal Eleitoral é dirigido por cidadãos, não por políticos nomeados. O último processo eleitoral reuniu 1 milhão de cidadãos. Seria impossível fraudar uma eleição com tanta gente envolvida. E temos o Tribunal Federal Eleitoral, para resolver controvérsias. Agora é hora de acatar a decisão da Justiça.

FOLHA - Não seria melhor a recontagem de todas as urnas para não deixar a menor dúvida?
VALENCIA
- Isso só seria possível se a esquerda tivesse pedido impugnação em todas. Só houve denúncias de irregularidades em um número pequeno de distritos, e a Justiça mandou recontar todas as urnas onde havia denúncias. E a diferença de votos quase não mudou.

FOLHA - Obrador foi um prefeito da Cidade do México muito popular. O que o fez desconfiar do sistema e não reconhecer a decisão judicial?
VALENCIA
- Algumas declarações do Obrador dão a entender que ele só acataria uma decisão judicial se fosse favorável a ele. Ele tem desqualificado todas as autoridades.

FOLHA - Qual será o principal desafio para Calderón?
VALENCIA
- Como a vitória foi por pequena margem, o próximo governo terá que aceitar propostas da oposição e compartilhar a mesma prioridade, que é a luta contra a pobreza e a desigualdade no México.

FOLHA - Há anos fala-se de uma aliança estratégica entre Brasil e México. Os países se tratam como rivais. Há possibilidade de cooperação?
VALENCIA
- Em território, população ou tamanho da economia, Brasil e México são os dois países mais importantes da América Latina. Qualquer coisa que aconteça neles ou entre eles têm impacto regional. A relação dos dois países é significativa no comércio. Há um intercâmbio de US$ 6 bilhões, e o México é o sexto maior destino das exportações brasileiras. Há quase US$ 10 bilhões em investimentos mexicanos no Brasil. Nem nos EUA temos tantos investimentos diretos. Mas falta vontade política para aprofundar a integração. Em 2002, houve uma reunião da comissão de cooperação científica e tecnológica bilateral. Foram acordados 39 projetos. Só sete foram adiante.

FOLHA - Diplomatas brasileiros dizem que a aliança é impossível, que o México é muito dependente dos EUA, sem política externa própria.
VALENCIA
- É injusto quem exclui o México por considerá-lo muito dependente dos Estados Unidos. Não nego que nossa relação prioritária seja com EUA e Canadá, mas nossa política externa é muito autônoma. Quando ocupamos o assento do Conselho de Segurança, votamos contra a intervenção no Iraque. O México é o único membro da Organização dos Estados Americanos que jamais rompeu relações com Cuba. E condenamos as intervenções americanas na República Dominicana e no Panamá.


Texto Anterior: Oriente Médio: Ataques de Israel matam 4 palestinos
Próximo Texto: Iraque sob tutela: Governo assume hoje comando dos militares
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.