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É hora de acatar Justiça, diz novo embaixador mexicano
Para diplomata, que defende IFE, "Obrador dá a entender que só aceitaria vitória"
Valencia afirma que falta vontade política para criar aliança entre Brasil e México e que política externa do país é "muito autônoma"
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
Para o novo embaixador do
México no Brasil, Andrés Valencia, 57, a prioridade é tentar
concretizar a propalada aliança
entre os dois maiores países da
América Latina. Em 33 anos de
carreira, Valencia já foi embaixador em Israel e na Colômbia.
Leia os principais trechos da
entrevista que concedeu à Folha, na qual comentou a decisão do Tribunal Federal Eleitoral mexicano de declarar, anteontem, a vitória do conservador Felipe Calderón, depois de
não encontrar provas de fraude
na votação de 2 de julho, como
denunciara o candidato de esquerda, José López Obrador
FOLHA - Persistirão dúvidas sobre a
legalidade do resultado eleitoral?
ANDRÉS VALENCIA - Pode ter havido irregularidades próprias
de qualquer eleição, mas a Justiça não viu razões para invalidar o resultado. Foi uma competição apertada. Na Itália
também houve diferença pequena, e Berlusconi recorreu à
Justiça. Como houve fraudes
no passado e havia o sistema
hegemônico criado pelo PRI, a
reforma do sistema eleitoral foi
construída para evitar qualquer desconfiança. O Instituto
Federal Eleitoral é dirigido por
cidadãos, não por políticos nomeados. O último processo
eleitoral reuniu 1 milhão de cidadãos.
Seria impossível fraudar uma
eleição com tanta gente envolvida. E temos o Tribunal Federal Eleitoral, para resolver controvérsias. Agora é hora de acatar a decisão da Justiça.
FOLHA - Não seria melhor a recontagem de todas as urnas para não
deixar a menor dúvida?
VALENCIA - Isso só seria possível se a esquerda tivesse pedido
impugnação em todas. Só houve denúncias de irregularidades em um número pequeno de
distritos, e a Justiça mandou
recontar todas as urnas onde
havia denúncias. E a diferença
de votos quase não mudou.
FOLHA - Obrador foi um prefeito
da Cidade do México muito popular.
O que o fez desconfiar do sistema e
não reconhecer a decisão judicial?
VALENCIA - Algumas declarações do Obrador dão a entender
que ele só acataria uma decisão
judicial se fosse favorável a ele.
Ele tem desqualificado todas as
autoridades.
FOLHA - Qual será o principal desafio para Calderón?
VALENCIA - Como a vitória foi
por pequena margem, o próximo governo terá que aceitar
propostas da oposição e compartilhar a mesma prioridade,
que é a luta contra a pobreza e a
desigualdade no México.
FOLHA - Há anos fala-se de uma
aliança estratégica entre Brasil e
México. Os países se tratam como rivais. Há possibilidade de cooperação?
VALENCIA - Em território, população ou tamanho da economia,
Brasil e México são os dois países mais importantes da América Latina. Qualquer coisa que
aconteça neles ou entre eles
têm impacto regional. A relação dos dois países é significativa no comércio. Há um intercâmbio de US$ 6 bilhões, e o
México é o sexto maior destino
das exportações brasileiras. Há
quase US$ 10 bilhões em investimentos mexicanos no Brasil.
Nem nos EUA temos tantos investimentos diretos.
Mas falta vontade política
para aprofundar a integração.
Em 2002, houve uma reunião
da comissão de cooperação
científica e tecnológica bilateral. Foram acordados 39 projetos. Só sete foram adiante.
FOLHA - Diplomatas brasileiros dizem que a aliança é impossível, que
o México é muito dependente dos
EUA, sem política externa própria.
VALENCIA - É injusto quem exclui o México por considerá-lo
muito dependente dos Estados
Unidos. Não nego que nossa relação prioritária seja com EUA
e Canadá, mas nossa política
externa é muito autônoma.
Quando ocupamos o assento do
Conselho de Segurança, votamos contra a intervenção no
Iraque. O México é o único
membro da Organização dos
Estados Americanos que jamais rompeu relações com Cuba. E condenamos as intervenções americanas na República
Dominicana e no Panamá.
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