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Obstáculos à paz, colonos se negam a deixar Cisjordânia
Assentados creem em missão divina e têm em Netanyahu um de seus defensores
"Somos o futuro do povo judeu", diz um dos colonos; construções aumentaram enquanto governo Olmert negociava com palestinos
DO ENVIADO ESPECIAL
À CISJORDÂNIA
Cercado de pitorescas colinas e forte presença do Exército israelense, Beit Ein é um dos
menores assentamentos judaicos entre as centenas que salpicam o mapa da Cisjordânia. São
apenas 150 famílias, todas ultraortodoxas, que vivem à base
de agricultura orgânica e inabalável fé religiosa.
"Estamos aqui para cumprir
a vontade de Deus", diz, com
forte sotaque americano, o fotógrafo Nissan Konikov, 45,
que mora há oito anos em Beit
Ein com a mulher e os dez filhos. Para ele, qualquer processo de paz é uma inutilidade.
"Um dia os palestinos vão aceitar que somos o povo escolhido
e que esta é a nossa terra."
Nascido nos Estados Unidos,
filho de pai russo e mãe argentina, Konikov representa o lado
mais ideológico de uma população que chega perto de 300 mil
pessoas, em 120 assentamentos. Embora a maioria esteja na
Cisjordânia por ideologia, não é
um grupo monolítico.
Muitos foram morar no meio
de uma população de 2,3 milhões de palestinos por motivos
econômicos, atraídos pelas
condições favoráveis oferecidas pelo governo. Mas mesmo
entre os menos militantes, a segurança continua em primeiro
lugar no momento do voto.
Desempregado há dois meses, o programador de computadores Yoram Edri tem percorrido os assentamentos em
campanha para o partido de ultradireita Ichud Leumi (União
Nacional). Ele acha que a guerra em Gaza fortaleceu a ocupação israelense da Cisjordânia.
"As pessoas passaram a ver o
perigo de ceder terra aos palestinos", diz Edri, que viveu uma
situação invertida durante a
ofensiva em Gaza. "Nós, que
sempre fomos considerados o
"front", viramos a retaguarda.
Cheguei a receber vários parentes que moram no sul e se
refugiaram na minha casa dos
foguetes do Hamas."
Obstáculo
Os assentamentos são considerados pelos palestinos, pela
esquerda israelense e por boa
parte da comunidade internacional como o maior obstáculo
a um acordo de paz. Eles começaram a ser construídos logo
depois da Guerra dos Seis Dias,
em 1967, em que Israel conquistou terras da Jordânia, do
Egito e da Síria.
Em 2005, por ordem do então premiê, Ariel Sharon, Israel
desmantelou os assentamentos
de Gaza e se retirou unilateralmente do território. O sucessor
de Sharon, Ehud Olmert, foi
eleito prometendo seguir o modelo na Cisjordânia. Mas a ascensão do Hamas em Gaza enterrou a era do unilateralismo.
Voltou-se então à mesa de
negociações com a Autoridade
Nacional Palestina (ANP) com
base no Mapa de Caminho, o
plano de paz proposto pelo governo Bush. Um dos principais
requisitos era o congelamento
dos assentamentos.
Um relatório secreto publicado na semana passada pelo
jornal "Haaretz", entretanto,
mostrou que os assentamentos
continuaram sendo ampliados
em terras privadas de palestinos enquanto Olmert negociava com o presidente da ANP,
Mahmoud Abbas.
A provável vitória da direita
na eleição de terça-feira deve
dificultar a ambição de Barack
Obama de tirar o processo de
paz da paralisia. Binyamin Netanyahu, favorito para ser o
próximo primeiro-ministro de
Israel, defende os assentamentos e só tem admitido autonomia parcial para os territórios
palestinos.
Alheios às críticas internacionais, a maioria dos colonos
só espera uma ordem do governo para construir. No assentamento de Beitar Ilit, que abriga
quase 40 mil pessoas nas montanhas da Judeia, a prefeitura
diz que não houve expansão,
mas não nega que essa é a meta.
"Estamos estrangulados",
diz o porta-voz da prefeitura,
Eliahu Nahe, em referência ao
déficit de moradia em relação
ao crescimento da população.
Apesar das evidências, ele desfaz a impressão de que o governo não coloca freios à colonização da Cisjordânia. "Queremos
construir, mas não temos autorização. Quem sabe com o novo
primeiro-ministro?"
Deficiente físico, o fotógrafo
Nissan percorre com sua cadeira de rodas elétrica as irregulares ruas de Beit Ein com uma
de suas filhas nas costas. Questionado sobre como se sente
quando assentamentos como o
seu são considerados um obstáculo à paz, ele sorri.
"Os assentamentos não são
um obstáculo", diz, enquanto
acaricia a longa barba. "Eles são
o futuro do povo judeu."
(MARCELO NINIO)
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