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ANÁLISE
Novo rei terá
tarefa difícil
ROBERT FISK
do "The Independent", em Amã
Em meio à espessa neblina, próximo ao hospital em
Amã, dava para ouvir as vozes a meio quilômetro de
distância. "Com nosso sangue, com nossas almas, nos
sacrificamos por ti."
Vi milhares de figuras
reunidas diante do hospital,
segurando retratos do rei
que jazia morto.
Mas não havia uma única
foto do rei ao lado de seu filho. O novo rei Abdullah
não estava presente nos
pensamentos dos homens
que se lamentavam.
Abdullah passou pela academia militar de Sandhurst,
pelas universidades de Oxford e Georgetown, no Reino Unido. É general e comanda sua própria Guarda
Pretoriana.
Rei Abdullah. O nome
traz à nossa mente um outro rei, o bisavô do Abdullah de hoje, atingido por
uma bala na cabeça na mesquita de Al Aqsa, em Jerusalém, quase meio século
atrás, enquanto um rapaz
adolescente -a mesma
pessoa cujo cadáver jaz no
hospital- caía ao chão, em
estado de choque.
Bastava observar as pessoas na frente do hospital
para compreender quão pesada será a tarefa que o novo rei Abdullah terá de enfrentar. Para um ocidental,
a Jordânia não passa de um
pequeno país simpático.
Mas sua população carrega
marcas profundas: 65% de
seus habitantes têm em suas
famílias algum palestino
expulso de suas terras, e
Abdullah herdou de seu pai
um tratado de paz que muitos de seus súditos gostariam de rasgar em pedaços.
Muitos jordanianos já
voltaram para sua atitude
antiga de hostilidade e desconfiança em relação a um
Israel que continua erguendo assentamentos na Cisjordânia, em terras de muitos jordanianos.
Ontem, procurei um carro que pudesse me levar a
Amã. Quem parou foi um
palestino chamado Nidal.
No rádio, ouvia um noticiário. "Estão dizendo que Abdullah é igualzinho a seu
pai", disse. "Dizem que o
país está unido, que tudo
vai continuar como antes."
E fez com a mão direita um
pequeno gesto, indicando
uma pergunta em aberto.
"Pode ser", concluiu.
Tradução de
Clara Allain
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