São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2007

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Alemanha conservadora rejeita política de creches

Governo defende mais berçários para promover natalidade, mas, para alguns setores, projeto vai contra o modelo familiar de educação

Bertrand Guay/Reuters
A candidata francesa Ségolène e a premiê alemã, Angela Merkel


CÉCILE CALLA
DO "MONDE", EM BERLIM

Poucas vezes a política familiar terá suscitado tantas paixões na Alemanha quanto neste momento. Quando, há quatro semanas, a ministra da Família Ursula von der Leyden, mãe de sete filhos, propôs a criação até 2013 de 500 mil vagas em berçários e creches para crianças de até 3 anos de idade, uma verdadeira tempestade política se desencadeou. No domingo 25 de fevereiro, a própria chanceler Angela Merkel, habitualmente discreta em relação a questões dessa natureza, interveio em defesa de sua ministra -ambas são do CDU (União Democrata Cristã, na sigla em alemão)-, afirmando que "pais e mães devem ser livres para escolher em matéria de educação".
Com déficit grande no número de berçários e creches -há regiões onde só 8% das crianças de até 3 anos têm acesso a cuidados fora do lar, a ministra decidiu agir para ajudar os pais a conciliar família e carreira. Assim como o salário parental (valor pago por quantidade de filhos), que entrou em vigor em janeiro, o novo projeto se inscreve numa política ambiciosa para promover o aumento do índice de natalidade. Com uma taxa de fecundidade de 1,3 filho por mulher, a Alemanha tem uma das menores taxas de natalidade da Europa.

"Máquinas de procriar"
Mas a intervenção do Estado neste campo ainda suscita dúvidas, em especial nos meios conservadores. As primeiras reações contrárias vieram do próprio partido de Merkel. Como nos debates anteriores sobre política familiar, a ala conservadora do CDU e do CSU (União Social Cristã) criticou um projeto que questiona o modelo familiar tradicional, conhecido como "os três K: "Kinder, Kuche, Kirche" (crianças, cozinha, Igreja)", em que a mulher opta por ficar em casa para cuidar dos filhos.
Para os partidários desse modelo, as idéias da ministra Von der Leyen remetem à fórmula da antiga Alemanha Oriental, rejeitada no lado ocidental, em que as crianças eram deixadas nas creches. Compartilhando esses receios, a Igreja Católica mergulhou na discussão por meio do bispo de Augsburg, Walter Mixa, que acusou a ministra de reduzir as mulheres a "máquinas de procriar", querendo recrutá-las "como reservatório de mão-de-obra para a indústria".
Com algumas exceções, as opiniões do bispo foram rejeitadas pela Igreja Protestante, pelos dois partidos do poder e por muitos católicos. "A proposta da ministra está mais próxima do que as mulheres desejam do que está a visão do bispo", disse Magdalena Bogner, da comunidade de mulheres católicas.
Para acalmar os ânimos, o cardeal Karl Lehmann, presidente da Conferência Episcopal, elogiou os projetos, mas sem deixar de prevenir contra o "erro fundamental" que seria crer que "é o Estado quem pode cuidar melhor das crianças". Em resposta aos ataques, a ministra da Família alertou para os que desejam "ressuscitar os anos 1950 em 2010".
Enquanto isso, os social-democratas (SDP) temem que os projetos da ministra avancem sobre seu próprio terreno. A política defendida por ela permite à CDU modernizar sua concepção de família e atrair um eleitorado jovem e urbano. Os social-democratas apresentaram, na semana passada, seu próprio plano de financiamento da reforma das creches -o financiamento era ponto indefinido na proposta original. O governo se opôs. Os dois partidos vão confrontar suas visões numa reunião entre os líderes da grande coalizão, marcada para esta semana.
Tradução de CLARA ALLAIN

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