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MÉXICO-EUA
Fronteira em transe
Morte de imigrantes ilegais no
deserto do Arizona relança
a discussão sobre o futuro da
fronteira entre México e EUA
RODRIGO PENA MAJELLA
DA REDAÇÃO
A fronteira entre as Américas rica e pobre está novamente em xeque. A morte de 14 imigrantes ilegais no deserto do Arizona, em
maio, colocou de novo na berlinda o futuro da linha divisória entre Estados Unidos e México.
O sofrimento dos migrantes é
aviltante, e a dependência mexicana é notória -as remessas de
seus cidadãos trabalhando no território vizinho, que no primeiro
trimestre de 2001 somaram US$
2,1 bilhões, são atualmente a terceira fonte de renda do México.
Mas a força motriz das negociações binacionais, que ganharam
novo impulso a partir da tragédia,
é o fato de que a economia americana estreita sua parceria com o
vizinho do sul e está cada vez mais
dependente da mão-de-obra mexicana. Há 20,6 milhões de pessoas de origem mexicana nos
EUA -até 11 milhões estão como
ilegais-, uma comunidade que
constitui 7,3% da população total.
O que se questiona agora é se a
Casa Branca pretende tratar os integrantes desse enorme contingente de trabalhadores apenas como braços ou dar-lhes a chance
de serem cidadãos.
Conforme haviam prometido
em suas campanhas eleitorais, os
presidentes George W. Bush e Vicente Fox, eleitos no ano passado,
colocaram seus funcionários para
discutir projetos sobre meios de
regular o fluxo migratório, evitar
novas mortes na fronteira e empregar a mão-de-obra mexicana.
Por enquanto, porém, o que resultou desse debate não agradou
nem representantes dos migrantes nem especialistas na questão.
As propostas são apontadas como
inócuas pelos mais moderados ou
como insidiosos subterfúgios pelos mais exaltados.
O Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte, bloco econômico formado por EUA,
Canadá e México) produziu um
grande intercâmbio entre mexicanos e americanos. O enriquecimento do norte do México não
cumpriu, porém, a expectativa de
que o comércio seria capaz de
produzir riqueza suficiente para
manter os mexicanos em seu país.
Ao mesmo tempo em que foi liberada a circulação de bens e serviços, foi fortificada a barreira contra o trânsito humano.
Os EUA gastam hoje cerca de
US$ 2 bilhões para impedir que os
mexicanos entrem no país. O contingente policial foi aumentado, e
a fronteira incorporou tecnologias de ponta. Os ilegais continuam a avançar, entretanto.
Só no ano passado, 491 mexicanos morreram tentando atravessar desertos e rios americanos.
Uns morreram no caminho, por
cansaço, desidratação ou frio. Outros foram abandonados no meio
do nada pelos chamados coyotes,
homens que cobram até US$
2.500 de cada migrante pelo trabalho de conduzir as pessoas através da fronteira. Até 22 de junho
deste ano, mais 157 morreram.
Mais do que as dificuldades e os
altos custos da vigilância fronteiriça, o que tem levado os EUA a
discutir a entrada de mexicanos é
a dependência em relação a eles.
Empresários americanos têm até
cruzado a fronteira em busca de
empregados. Não são poucos os
que ainda prevêem uma apocalíptica "mexicanização" dos EUA,
mas o pragmatismo está se sobrepondo ao preconceito.
"A mão-de-obra mexicana é um
fator fundamental em várias áreas
da economia dos EUA, tais como
agricultura, construção, processamento de alimentos, jardinagem,
serviços de vigilância e manutenção em prédios, fabricação de tapetes e tecidos etc.", afirma Wayne Cornelius, professor da Universidade da Califórnia, em San
Diego, e uma das maiores autoridades sobre imigração de mexicanos para os EUA. "Mas são também uma parte essencial na força
de trabalho em muitas empresas
de alta tecnologia."
"É uma estratégia econômica,
que aproveitou a comoção causada pelas mortes no deserto do
Arizona. Os EUA têm necessidade de trabalhadores, e o México,
de empregos", afirma Joel Magallán, presidente da Coalizão Nacional pela Dignidade e pela Anistia dos Imigrantes Indocumentados, uma das principais representantes dos imigrantes mexicanos.
Os projetos para o futuro funcionamento da fronteira, além de
controversos, são ainda muito incipientes. Fox manifestou o desejo de que houvesse livre circulação de pessoas, como ocorre na
União Européia. A idéia é apoiada
pelo jornal econômico "Wall
Street Journal", por exemplo, mas
conta com pouquíssimo respaldo
no Congresso americano.
"Será gradualmente aberta, mas
não completamente. Existem poderosos políticos que se opõem à
imigração e pessoas que ainda
vêem a fronteira meridional como uma área perigosa que precisa
ser controlada", diz Nestor Rodriguez, professor da Universidade
de Houston.
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