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Britânico quer se distanciar dos EUA, mas na verdade faz favor a George W. Bush
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
A primeira leitura, óbvia, é
que Gordon Brown não é Tony
Blair -e faz todo o esforço para
se descolar da figura de seu antecessor e amigo de longa data.
Como decidiu a imprensa britânica, se o segundo foi apelidado (pela mesma imprensa) de
"o poodle de Bush", pela subserviência à política externa do
presidente norte-americano, o
segundo está mais para um
"buldogue" independente.
No encontro dos dois líderes,
há uma semana, em Camp David, o premiê rebatia tentativas
de intimidade ao chamar George W. Bush de "senhor presidente" ou "o presidente Bush"
-embora esse tenha tentado
emplacar um ou outro "Gordon". Na coletiva de imprensa,
o britânico chegou até a usar o
jargão diplomático para discussão acalorada -tiveram "uma
conversa franca", disse.
Mas ao pedir ontem que sejam soltos os cinco estrangeiros com permissão para viver
no Reino Unido que ainda se
encontram na prisão militar da
base norte-americana em
Guantánamo, Cuba, o recém-empossado premiê na verdade
faz um favor a seu colega.
O "arquipélago Gulag" do
presidente republicano, como
chamou a colunista Maureen
Dowd, do "New York Times",
tornou-se um elefante no meio
da sala do atual governo, uma
aberração jurídica criticada por
ambos os lados do espectro político. Seu fechamento já foi sugerido até pelo atual ministro
da Defesa, Robert Gates.
O senador republicano John
McCain, um dos mais convictos
apoiadores da Guerra do Iraque, foi além. Disse que, se eleito presidente, fechará "imediatamente" Guantánamo, transferirá todos os prisioneiros para a base militar Fort Leavenworth, no Kansas, e agilizará o
processo judicial dos detidos.
Esses são cerca de 370 e se
encontram numa espécie de
limbo jurídico. O presidente
Bush declarou alguns deles
"combatentes inimigos ilegais"
e, no ano passado, conseguiu
que fossem aprovadas comissões militares especiais para os
julgar. Em junho último, no entanto, dois juizes militares anularam as acusações contra dois
prisioneiros, abrindo um precedente que torna o lugar mais
e mais kafkaniano.
Para os juizes, o Pentágono
conseguiu provar que ambos
eram "combatentes inimigos",
mas não "ilegais", pois usavam,
por exemplo, uniforme e armas
no momento da prisão. Hoje há
ali menos de dez prisioneiros
com atuação importante em
grupos terroristas. É provável
que o resto não saiba nem venha a saber do que é acusado.
Burocracia
Dos 370, 80 já foram liberados pelos EUA -um deles está
entre os que Brown pede que
sejam soltos. Só que não conseguem deixar a ilha, seja por burocracia, seja por se recusarem
a voltar a seus países de origem,
onde temem a tortura, ou por
esses os recusarem de volta.
"Não mantemos detentos
presos além do tempo necessário e não temos o desejo de ser a
prisão do mundo", disse à Folha, por e-mail, o porta-voz da
Marinha dos EUA, J.D. Gordon. "Embora digamos há muito tempo que gostaríamos de
fechar Guantánamo, há alguns
presos altamente perigosos
que, se soltos, representariam
grande perigo para a segurança
pública internacional."
"A nenhum presidente deveria ser dado o poder unilateral
de classificar pessoas como
combatentes inimigos e trancafiá-los indefinidamente sem
a perspectiva de serem acusados ou julgados", escreveu Anthony Romero, do grupo de defesa dos direitos civis ACLU.
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