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Colômbia não está só, diz chanceler
Para María Consuelo Araújo, aliança política com os EUA não impediu consolidação das relações regionais
Desafio para o segundo mandato de Álvaro Uribe será combinar a ofensiva de segurança à negociação com grupos armados ilegais
CAROLINA VILA-NOVA
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA
Longe de estar isolada na região devido à sua forte aliança
com os EUA, a Colômbia vem
fortalecendo seus vínculos com
os vizinhos e diversificando
seus interlocutores políticos e
econômicos. A avaliação é de
María Consuelo Araújo, 35, que
assumiu em julho a Chancelaria colombiana e fez visita oficial ao Brasil nesta semana.
Leia os principais trechos de
sua entrevista à Folha.
FOLHA - Em seu discurso de posse,
o presidente Álvaro Uribe falou do
temor de fracassar nas negociações
de paz. O governo vai negociar com
as Farc e em que condições?
MARÍA CONSUELO ARAÚJO - O presidente falou de seu temor de
ficar sem segurança e sem paz.
O que não se quer perder é o
avanço da política de segurança
democrática nesses quatro
anos. A democracia se fortaleceu graças ao fato de que hoje é
possível percorrer o país livremente com o apoio da força pública. E pela primeira vez a violência que marcou toda uma
geração começou a se reverter.
Isso tudo requer continuidade.
E por isso o presidente disse: eu
tenho de garantir que a política
de segurança não decaia ao
abrir um espaço para o diálogo
com os grupos ilegais.
O grande desafio desse governo que começa é manter a
segurança de modo sustentável
e criar condições para um diálogo com os grupos ilegais. De
fato, começamos a estabelecer
contatos e esperamos que isso
gere frutos. A condição é simplesmente que não haja um retrocesso na política de segurança democrática, que não haja
uma desmoralização da força
pública e que haja gestos que
demonstrem o interesse de um
diálogo construtivo.
FOLHA - Negociar com as Farc significa reconhecer o fracasso da ofensiva militar contra a guerrilha?
ARAÚJO - As duas coisas devem
caminhar paralelamente. Temos uma cooperação importante na luta contra o narcotráfico e o terrorismo, e isso requer perseverança e continuidade. Mas o espaço para diálogo segue. Já há na Colômbia 40
mil pessoas desmobilizadas, e a
porta está aberta para que outros o façam. O ritmo com que
os resultados são obtidos pode
variar. Mas quando se vê um retrato da Colômbia de 2006 e
um de 2002, há uma melhora.
FOLHA - Uribe considera a desmobilização dos paramilitares um de
seus maiores êxitos. Mas houve denúncias de chefes paramilitares dirigindo carros caros, freqüentando
festas, fazendo compras em lojas
exclusivas. Como a sra. explica isso?
ARAÚJO - Há uma lei que tem o
aval do Congresso [a Lei de Justiça e Paz, que regula o processo
de desmobilização] que passou
por todas as discussões democráticas e que é o instrumento
que se aplica a quem queira
participar. Já a execução e a gerência desse instrumento está a
cargo da Justiça, e na Colômbia
se respeita a separação de poderes. Cada juiz deve analisar a
situação de cada uma dessas
pessoas e fazer cumprir a lei.
FOLHA - Há controvérsias sobre o
número de desmobilizados. Fala-se
que narcotraficantes se infiltraram
para poder se beneficiar da lei.
ARAÚJO - Na Colômbia não há
uma fronteira clara entre um
delito e outro. Os grupos ilegais
justamente tiveram um alcance tão grande porque se financiam do narcotráfico. Todos,
tanto os grupos de extrema direita como as Farc e o ELN, obtêm do narcotráfico seus recursos para armas e para gerar violência. Há uma conectividade
entre os delitos. O governo
criou o instrumento, e cabe à
Justiça determinar o que se imputa em cada caso.
FOLHA - Uribe é o mais forte aliado
dos EUA na região. A Colômbia não
se sente isolada dos vizinhos?
ARAÚJO - Não. Temos uma
aliança com os EUA que parte
de objetivos e interesses comuns, como a luta contra as
drogas e o terrorismo, e temos
no Plano Colômbia uma ferramenta de cooperação muito valiosa. Mas a Colômbia é consciente de seu papel como articuladora do continente e de fato está fortalecendo os vínculos
com os países da região e buscando alternativas e a diversificação de sua interlocução. A
CAN [Comunidade Andina de
Nações] fez um acordo com o
Mercosul, e queremos que essa
seja a semente de uma comunidade sul-americana. Há um
projeto de gasoduto, de venda
de combustíveis e de interconexão elétrica com a Venezuela, e vemos a possibilidade muito próxima de firmar um acordo bilateral de comércio entre
Colômbia e Venezuela. Também queremos que a face do
país para o Pacífico seja uma alternativa real de desenvolvimento. E queremos que as interlocuções políticas se traduzam em resultados comerciais.
FOLHA - A Colômbia continua sendo o maior produtor mundial de coca, e em 2005 essa produção cresceu
8%, segundo a ONU. Haverá mudança na estratégia antinarcóticos?
ARAÚJO - Essa cifra não pode
ser vista separada do aumento
do consumo nos países europeus. Por isso pedimos um debate que inclua os países produtores e os consumidores. Na
medida em que isso se traduza
em uma política de responsabilidade compartilhada, vamos
garantir que os sacrifícios que
fazemos na Colômbia tenham
resultados mais contundentes.
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