São Paulo, sábado, 08 de dezembro de 2007

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Doação ilegal a trabalhistas afeta Brown

Em mais um revés para o premiê britânico, seu partido admitiu ter recebido dinheiro à margem da lei

RAFAEL CARIELLO
DE LONDRES

O Partido Trabalhista do Reino Unido admitiu na semana passada ter recebido doações ilegais, que somam pelo menos 650 mil libras, por meio de laranjas de um empresário da construção civil ligado à legenda. A admissão gerou investigações da polícia local e uma crise definida pela revista "The Economist" como "potencialmente devastadora" para o primeiro-ministro Gordon Brown, líder do partido.
A legislação britânica sobre o assunto proíbe explicitamente a contribuição partidária por meio de "agentes do doador", sem que a origem dessas transações financeiras seja identificada. Os "agentes" -ou laranjas- usados pelo empresário David Abrahams nessas operações desde pelo menos 2003 foram, entre outros, dois funcionários de suas empresas e a mulher de um terceiro empregado. Abrahams alega que lançou mão do procedimento para manter sua privacidade.
No ano passado, uma agência governamental suspendeu uma proibição anterior para a construção de um centro comercial no nordeste da Inglaterra, projeto que é realizado por uma das companhias do empresário. O governo nega que haja ligação.
O premiê Gordon Brown afirmou que as doações usando supostas brechas na lei eram "inaceitáveis", abriu uma sindicância interna no partido e prometeu devolver o dinheiro. O secretário-geral trabalhista renunciou e foi apontado por correligionários como o único integrante do partido a ter conhecimento das transações.

Acusações mútuas
O jornal "The Guardian", porém, publicou recentemente uma reportagem afirmando que membros do Partido Trabalhista ajudaram advogados do empresário a configurar meios para achar brechas na legislação e permitir as doações indiretas. Segundo o diário britânico, o acerto foi feito na sede do partido, em Londres.
Para o "Guardian", "detalhes do pacto legal levantarão novos questionamentos sobre quem no Partido Trabalhista sabia o que estava acontecendo".
As revelações geraram acusações mútuas entre os dois principais partidos do país. Os trabalhistas afirmam que o principal doador individual do Partido Conservador, o milionário Lord Ashcroft, não esclarece a sua situação fiscal, mantendo dinheiro e pagando impostos (mais baixos) fora do país.
David Cameron, líder dos conservadores, disse que a única conclusão que se pode tirar do recente escândalo de uso de laranjas pelos trabalhistas é que ou o partido é "extremamente disfuncional" ou mente.
O Partido Trabalhista enfrentou uma série de acusações ligadas a doações financeiras nos últimos anos. Na década de 90, o então primeiro-ministro Tony Blair teve que se desculpar por uma doação de 1 milhão de libras recebida pelo seu partido de Bernie Ecclestone, que controla a Fórmula 1. A doação foi descoberta após o governo suspender o proibição de propaganda de cigarros no caso específico de grandes prêmios da categoria. Os trabalhistas também foram recentemente acusados de indicar para a Câmara dos Lordes grandes contribuintes financeiros do partido.
Brown prometeu no início da semana trabalhar por novas reformas na Lei de Financiamento de Partidos no Reino Unido. Disse que a atual legislação, proposta e aprovada sob o governo Blair, é "inaceitável" -embora proíba transações como a realizada por Abrahams.
"É triste e me deixa irritado que esse tipo de coisa tenha acontecido, mas penso que é positivo que problemas como esse apareçam para que se possa lidar com eles", afirmou. Uma nova legislação deve ser produzida em breve, disse Brown, pedindo apoio de todos os partidos à sua elaboração.

Revezes
O primeiro-ministro tem sofrido uma série de revezes políticos nos últimos meses. Ele foi acusado de oportunismo ao ameaçar lançar eleições antecipadas quando as pesquisas indicavam vantagem do seu partido -para em seguida ter que recuar da idéia, ao ver o cenário político virar a favor dos conservadores. Os reflexos internos da crise global dos mercados financeiros e o vazamento recente de dados confidenciais de 25 milhões de contribuintes britânicos também contribuíram para o desgaste da imagem de Brown.
"Sua reputação para a competência sofreu terrivelmente", afirmou na semana passada a "Economist". "Ele não pode se dar ao luxo de perder também sua reputação moral."


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