São Paulo, sábado, 09 de fevereiro de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA/ DISPUTA EMBOLADA

Com Bill, Hillary tenta ganhar votos no Sul

Eleitores de Nova Orleans participam de primeiras primárias pós-furacão Katrina e fazem de Obama o democrata favorito

Washington, Nebraska e Kansas também promovem hoje prévias para escolher os candidatos à Presidência na eleição em 4 novembro

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A NOVA ORLEANS (LOUISIANA)

Minutos antes de Bill Clinton assumir o púlpito da histórica capela negra Lawless na manhã de ontem, na Universidade Dillard, em Nova Orleans, assessores do ex-presidente convocavam jornalistas postados no fundo da igreja a ocupar as fileiras da frente. É que, apesar de ampla divulgação nos meios de comunicação locais, um terço do local permanecia vazio.
O contraste era evidente. Menos de 24 horas antes, Barack Obama, que briga pela indicação democrata com a mulher de Clinton, Hillary, pôs 3.500 pessoas no ginásio principal da Universidade Tulane, na mesma cidade. Cerca de 300 pessoas tiveram de voltar para casa por falta de lugar. Na manhã de ontem, esse era aproximadamente o número de espectadores do ex-presidente.
A ofensiva das duas campanhas acontece na véspera das primárias de Louisiana, ao longo do dia de hoje. É a primeira vez que a região participa do processo eleitoral para a escolha de um presidente desde que a catástrofe do furacão Katrina, em 2005, colocou o Estado em depressão econômica.
Do lado democrata, Obama é o favorito, chegando a superar Hillary -ligeiramente à frente nas pesquisas nacionais- por até dez pontos percentuais, segundo sondagens locais. Será testada a capacidade do ex-presidente de conseguir atrair o voto da comunidade negra para a senadora: Bill Clinton venceu nesse Estado nas eleições presidenciais de 1992 e 1996.

Fator melanina
Mas então não havia candidatos negros com chances reais , e 35% dos 4,5 milhões de habitantes de Louisiana são negros. Essa fatia da população foi a mais atingida pelo descaso do governo federal no pós-Katrina. Muitos ainda vivem em trailers improvisados e malconservados nas partes pobres da Grande Nova Orleans, esperando até hoje o dinheiro federal, perdido numa teia de burocracia e corrupção.
Daí o tema ter dominado o discurso tanto de Obama quanto de Bill Clinton. "A catástrofe do Katrina é uma metáfora do governo George W. Bush", disse Obama. "Ninguém fora de Louisiana fez mais pelas vítimas do Katrina do que a senadora Hillary Clinton", afirmou o marido dela, após dizer que sua lista de realizações nessa área, preparada para ele por assessores, somava sete páginas.
O argumento era reforçado por anúncios locais -na TV para a campanha de Obama, que conta com mais dinheiro no Estado, nas rádios para a de Hillary, que disse que teve de emprestar US$ 5 milhões para sua campanha. Um deles dizia: "Se eleita, Hillary colocará uma pessoa responsável pela reconstrução dos Estados do golfo [do México, que abarca Louisiana, Texas, Mississippi, Alabama e Flórida] que responderá diretamente a ela."
Bronzeado, mais magro do que durante a Presidência, Bill Clinton aos poucos vai conquistando a platéia, que começa a responder a seu argumento. Faz piadas -"É difícil deixar a Presidência; quando eu saí, por três semanas não entendia por que as pessoas não tocavam mais música ao eu entrar nos lugares"-, conta casos e bate na tecla da experiência.
"O outro candidato acha que é preciso mudar todo o pessoal e esquecer as lutas do passado", diz Clinton, inflamado. "Ele diz que os anos 90 foram um horror. Não sei o que vocês acham, mas eu não concordo." A platéia é dividida igualmente entre negros e brancos, e entre esses há a predominância de senhoras, principal base de apoio de Hillary e uma das maiores do eleitorado nacional. É como se os filhos tivessem ido ao evento de Obama no dia anterior, e as mães fossem ao de Hillary.
Clinton termina com o apelo: "Espero que vocês façam por ela amanhã [hoje] nas urnas o que ela fez por vocês". Quase convence Dewain Lee, 38, conselheira de carreiras na universidade. "Eu cheguei aqui de manhã decidida a votar em Obama", diz ela à Folha. Lee foi uma das responsáveis pelo auxílio às vítimas do Katrina em Dillard. "Agora, já não sei mais. Ele me lembrou de vários fatos de que eu havia me esquecido."
Em jogo em Louisiana estão 66 delegados do lado democrata e 47 do republicano. Dado o índice negativo recorde do presidente Bush na região, o partido da situação virtualmente ignorou essa etapa. As pesquisas apontam o ex-governador de Arkansas e ex-pastor batista Mike Huckabee à frente do senador John McCain, sobretudo nas regiões rurais do norte, com grande presença de evangélicos e ultraconservadores.
Hoje ainda o Estado de Washington, na costa oeste, faz seu "caucus" (assembléia de eleitores), distribuindo 40 delegados para os republicanos e 97 para os democratas. No mesmo dia, fazem "caucuses" Kansas (apenas republicanos, com 39 delegados) e Nebraska (só os democratas, com 31 delegados).


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