São Paulo, segunda-feira, 09 de março de 2009

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Especialistas veem no diálogo com Taleban meio de dividi-lo

Obama já abriu a porta para a possibilidade, que visaria membros dispostos a colaborar

Defendida por europeus, tática funcionou no Iraque e foi aplicada pelo governo do Paquistão, mas é vista com dúvida por alguns analistas


HELENE COOPER
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Eis uma pergunta que certamente vai dividir os americanos: os EUA deveriam tentar negociar com algumas das mesmas pessoas que deram abrigo a Osama bin Laden antes dos ataques do 11 de Setembro?
O presidente Barack Obama está mandando 17 mil soldados adicionais ao Afeganistão e encomendou uma revisão da estratégia política para o país, além de encarregar um peso-pesado diplomático -Richard Holbrooke, arquiteto dos acordos de Dayton- de tentar fazer ali o que fez na Bósnia.
Mas uma questão central paira sobre todas as revisões estratégicas sobre Afeganistão-Paquistão: qualquer conflito que já tenha sido resolvido sempre envolveu as várias partes interessadas em um acordo, e o Afeganistão, reza a teoria, não será exceção à regra.
"Está claro que é preciso uma solução política no Afeganistão, e eu não excluiria nenhuma possibilidade, inclusive conversar com setores do Taleban", disse Reuben Brigety, especialista em Afeganistão no Center for American Progress.
Esse é um ponto sobre o qual autoridades europeias, sobretudo britânicas, têm pressionado os americanos. Com o governo Bush, explicou um diplomata europeu, "havia um bloqueio ideológico a qualquer tipo de acordo com qualquer coisa que pudesse ser chamada de Taleban". "Hoje o jogo mudou", diz.
De fato, na sexta, em entrevista ao "New York Times", Obama abriu a porta à ideia de abordar elementos do Taleban se a revisão feita por seu governo assim indicar. Ele citou um argumento do general David Petraeus, chefe do Comando Central americano no Oriente Médio, segundo o qual "parte do sucesso no Iraque incluiu uma aproximação com pessoas que consideraríamos fundamentalistas islâmicas, mas que estavam dispostas a cooperar".
Obama acrescentou que "pode haver algumas oportunidades comparáveis na região do Afeganistão e Paquistão, mas a situação no Afeganistão é no mínimo mais complexa".

Explorando divisões
Isso ainda o deixa a anos-luz de iniciar um diálogo com o mulá Mohammad Omar, que era o líder do Taleban em 11 de setembro de 2001, quando o grupo governava o Afeganistão, e que hoje é acusado de fomentar o conflito no país. E, mesmo que os EUA decidissem negociar com membros do Taleban, é mais que provável que estes negociassem com autoridades afegãs, e não diretamente com os americanos.
Mas há uma crença crescente de que é importante afastar do grupo islâmico alguns de seus membros inferiores, numa espécie de estratégia de dividir para conquistar. O general Petraeus já disse que um elemento aplicável no Afeganistão é uma aproximação com o que ele descreve como "conciliáveis" entre os insurgentes, como comandantes distritais.
"Enquanto adotamos a posição de que são todos nossos inimigos, podemos estar perdendo uma oportunidade de explorar essas divisões", adverte a ex-assessora do governo afegão Clare Lockhart. "Há fissuras que podem ser exploradas."
É esse, na realidade, o raciocínio que o governo do Paquistão usou para explicar seu acordo recente com líderes locais do Taleban na região de Swat, pelo qual figuras locais do Taleban podem dominar o vale.
Já para Daniel Markey, ex-especialista no sul da Ásia no Departamento de Estado durante o governo Bush e hoje membro sênior do Council on Foreign Relations, as lições aprendidas no Iraque -onde foram recrutados milicianos sunitas como aliados, negociando com líderes tribais- não necessariamente se aplicam ao Afeganistão.
"A estrutura tribal afegã é diferente. Não há hierarquia clara. Se você fecha um acordo com um sujeito, tem um acordo com ele, não com seu clã todo."
Ele defende uma abordagem cuidadosamente calibrada para o país. "Você combate, você conversa, você combate, você conversa", afirma. "Se puder dividir seus inimigos, conversando, converse. Mas se, ao conversar, você estiver apenas dando ao inimigo um momento de alívio para recuperar o fôlego, então não converse."


Tradução de CLARA ALLAIN


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