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RELIGIÃO
População majoritariamente branca importa crenças do Brasil e do Uruguai; Buenos Aires tem mil terreiros
Argentinos adotam culto afro-brasileiro
LÉO GERCHMANN
da Agência Folha, em Porto Alegre
A influência da religiosidade
africana não se restringe aos limites geográficos do Brasil na América do Sul. Não bastasse a existência de 200 terreiros de umbanda em Montevidéu, capital uruguaia, Buenos Aires já conta com
mil deles.
Tais dados, apurados após investigação do antropólogo gaúcho Ari Pedro Oro, que escreveu o
livro "Axé Mercosul" (1999, editora Vozes), surpreendem pelo
fato de Buenos Aires ser formada
por uma população majoritariamente branca. O traço étnico minoritário na capital argentina é o
dos índios. Negros, não há.
"A implantação da umbanda,
batuque e candomblé nessas e em
outras cidades da Argentina e do
Uruguai se iniciou há cerca de 30
anos", diz Oro, que é professor de
antropologia do programa de
pós-graduação da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande
do Sul). A influência da religiosidade afro-brasileira, de acordo
com o antropólogo, parte do Rio
Grande do Sul.
A umbanda é uma religião que
nasceu no início deste século no
Brasil, do sincretismo de elementos dos cultos afro-brasileiros (como o candomblé), do espiritismo,
do catolicismo e do ocultismo.
Chegou ao Uruguai nas áreas
fronteiriças com o Brasil, e começou a crescer muito no final dos
anos 70 e início dos anos 80.
Guerras e pestes
Mesmo sendo surpreendente a
atual influência afro-brasileira,
Buenos Aires teve, no século passado, alguns traços étnicos africanos. Até o final do século 19, havia
negros entre os portenhos. Guerras e pestes dizimaram os imigrantes africanos da Argentina,
que chegaram a formar 30% da
população de Buenos Aires.
As atuais práticas religiosas africanas na Argentina se limitam às
influências gaúcha e uruguaia.
Tanto é assim que só os nomes
dos líderes religiosos já encerram
um grande sincretismo. Exemplos: Hugo Watemberger de Iemanjá, Alfredo Echegaray de
Ogum, Juan Aguirre de Oxum e
Peggy de Iemanjá.
Os primeiros templos de religião africana a se instalar na Argentina foram os de Nélida (Baños) de Oxum, em 1966, e Elio
(Machado) de Iemanjá, dois anos
depois.
Os dois templos foram registrados no Registro Nacional de Cultos em 1970. Começaram pela
umbanda e, em 1973, adotaram o
"africanismo" (batuque).
Nélida e Elio são considerados
precursores. Em 1979, segundo o
antropólogo argentino Alejandro
Frigerio, Elio de Iemanjá fundou
a Confederação Espírita Umbandista.
Outras histórias contam, por
exemplo, que a origem das religiões afro na Argentina está em
três travestis que trabalhavam na
noite de Rivera (cidade uruguaia
que faz divisa com a brasileira
Santana do Livramento) na década de 50.
Em Santana do Livramento os
três teriam conhecido a mãe-de-santo Teta de Oxalá (Hipólita Lima), que os influenciou. O travesti Santiago Paves, a "Mara de Bará", foi para Buenos Aires e manteve uma clientela fixa.
O antropólogo Alejandro Frigerio diz que realmente "Mara"
existiu e foi um dos precursores
de religiões afro em Buenos Aires.
É possível que a história dela não
seja contada oficialmente devido
ao preconceito contra o homossexualismo.
Nova imagem
De acordo com o antropólogo
argentino, o final do regime militar (de 1976 a 1983) favoreceu a
proliferação dos cultos afro na
Argentina.
Por temor à repressão, a maioria das casas de umbanda era
clandestina. A imprensa costumava se referir negativamente à
umbanda, definindo-a como "seita para gente ignorante, dos setores sociais baixos", relacionada a
"atividades criminais". Os pais e
mães-de-santo são "bruxos ou
curandeiros".
A mídia argentina passou a
aceitar melhor as religiões afro-brasileiras nos últimos anos.
Frigerio indica dois motivos
que levam os argentinos a recorrer à umbanda: a influência brasileira e a necessidade de apego a alguma fé.
A estrutura dos terreiros argentinos e uruguaios (chamados de
"templos") é semelhante à dos
terreiros brasileiros, com a utilização da casa particular do pai ou
da mãe-de-santo, normalmente
na periferia das cidades. Os preços médios das consultas são de
US$ 15 em Montevidéu e US$ 30
em Buenos Aires.
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