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Ausência de oposição esvazia voto egípcio
Candidatos do partido oficial, sem oponentes em seus distritos, já tinham garantido 70% das cadeiras antes do pleito municipal
Crise inflacionária, chamado a boicote feito por grupo islâmico e indefinição sobre a sucessão de Mubarak explicam desânimo eleitoral
KAREN MARÓN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO CAIRO
Dois dias depois da ocorrência de protestos e distúrbios, a
capital egípcia voltou à normalidade. As ruas abarrotadas de
automóveis, homens pendurados nas portas dos ônibus e ambulantes lotando as ruas do
centro, oferecendo de patas de
cordeiro a queijo de cabra.
Nenhum indício do fato de
estar sendo realizada uma eleição para os 50 mil membros
dos legislativos municipais, nas
26 Províncias do país. Medo ou
indiferença foram as reações
dos egípcios a um resultado já
anunciado: sem concorrentes
nos distritos que representam,
os candidatos do Partido Nacional Democrático, do presidente -há 27 anos- Hosni
Mubarak, já haviam garantido
70% dos cargos eletivos.
Desde cedo percebiam-se
nos centros de votação os efeitos do desinteresse e do boicote
imposto pela Irmandade Muçulmana, principal força -ilegal- de oposição. Em Bulaq,
diante da ponte que atravessa o
rio Nilo, uma escola vazia de
eleitores era guardada por militares que conversavam sob os
cartazes da candidata governista Mona Mahmud Gadasi, que
convocava os eleitores a participar com o slogan "o país se
aproxima de nós".
"Não vou votar porque as
eleições são uma fraude e há
muita violência nas ruas", declarou Gamal, envolto em sua
jaqueta negra de couro, duas
horas depois da abertura das
eleições municipais, às 8h.
Em outro ponto do centro do
Cairo, circulando por lugares
invisíveis aos turistas, por ruas
esburacadas e sob balcões dos
quais roupas ou tapetes coloridos pendurados dão a impressão de que vão cair a qualquer
momento, seis homens fumavam o tradicional narguilé.
Comentavam, tranqüilos,
que vão continuar a apoiar Mubarak, que sucedeu a Anwar el
Sadat após o assassinato deste,
em 6 de outubro de 1981. "Estou satisfeito com meu governo
e por isso fui votar", diz Mohammed, 77, que recebe pensão mensal de 700 libras egípcias (US$ 127) e minimiza a importância da tensão social provocada pela escalada dos preços, principalmente do pão.
"Os preços vêm subindo aqui
e em todo o mundo. Não é um
problema específico deste governo", defende.
Em Dokki, o bairro onde fica
o mercado de Siliman Gohor, o
nível de comparecimento dos
eleitores às urnas era semelhante ao de outros bairros da
maior capital africana: 20 pessoas até as 15h.
As eleições municipais estavam inicialmente previstas para abril de 2006. Mas, após o
desempenho da Irmandade
Muçulmana nas legislativas de
2005 -quando, concorrendo
como independentes, seus candidatos conquistaram um
quinto do Parlamento nacional-, o governo as adiou para
ontem. Por isso o grupo islâmico, qualificado como "associação ilegal, mas tolerada", conclamou os eleitores a boicotar o
pleito. Seu líder, Mohamed
Mehdi Akef, denunciou que,
dos 5.159 candidatos do partido
que tentaram registrar-se nas
eleições, apenas 438 foram autorizados a fazê-lo.
Nesta situação, os egípcios se
perguntam quem vai suceder
Hosni Mubarak. Faltando um
mês para seu 80º aniversário, o
governante ainda não nomeou
um vice-presidente -que, de
acordo com a Constituição, deveria substituí-lo em caso de
morte- nem permite que surja
figura política de peso que possa tomar seu lugar. Comenta-se
que seu filho Gamal estaria nos
planos para a sucessão.
Tradução de CLARA ALLAIN
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