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São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2003

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ELEIÇÕES NA ARGENTINA

Candidato é recebido por Lula em Brasília a dez dias do segundo turno das eleições argentinas

Kirchner sonha com Mercosul igual à UE

Lula Marques/Folha Imagem
O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, recebe o candidato presidencial argentino Néstor Kirchner no Palácio do Planalto


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O encontro entre o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e seu quase colega argentino, Néstor Kirchner, transcorreu em tão "buena onda", na descrição do porta-voz de Kirchner, Miguel Nuñez, que o candidato peronista permitiu-se depois, em entrevista coletiva, sonhar com uma integração igual à da União Européia (UE) entre os países do Mercosul (bloco sul-americano formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, com Chile e Bolívia como membros associados).
Kirchner defendeu ante Lula a tese que vem expondo com frequência, segundo a qual o Mercosul não pode se limitar a ser apenas um acordo de cunho comercial, como basicamente é hoje.
Teria que ser "um espaço de integração econômica e política".
Significa, na área econômica, "avanços permanentes, por meio de uma discussão madura", para chegar à integração também nas áreas de investimentos e crescimento econômico conjunto.
No âmbito político, significaria conferir aos países do bloco "uma voz muito forte e clara ante o mundo", sempre segundo o governador da Província de Santa Cruz, na Patagônia, tão remota que leva mais tempo para viajar de avião até Buenos Aires do que da capital argentina a São Paulo (cerca de três horas contra duas horas e meia).
Kirchner admitiu que sua construção teórica tem "características similares" às da União Européia, mas lembrou que, "infelizmente", os países do Mercosul estão muito atrasados na tarefa.
Sonhos à parte, no entanto, os dois lados concordaram em que se deve avançar com "muita prudência" na direção de uma integração aprofundada. Prudência tamanha que nem sequer falaram da moeda única do Mercosul, projeto para o longo prazo, mas que ganhou carimbo oficial na segunda-feira, em reunião entre os vice-chanceleres Martín Redrado (Argentina) e Samuel Pinheiro Guimarães.
A "buena onda" permitiu que, quando Kirchner mencionou o plano de obras públicas que pretende lançar se eleito, Lula brincasse com seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, também presente ao encontro:
"O Palocci não me dá o dinheiro", disse Lula, sobre o seu desejo de também fazer obras públicas.
O plano Kirchner, aliás, deve ter aumentado a irritação crescente que Lula vem revelando com o ministro dos Transportes, Anderson Adauto, por não conseguir gastar recursos já liberados do contingenciamento pela Fazenda.
Os dois presidentes falaram também do programa Fome Zero, por iniciativa de Kirchner.
Se eleito, Kirchner já avisou que sua primeira viagem será ao Brasil, como retribuição a gesto similar de Lula, que esteve na Argentina antes de tomar posse.
Lula garantiu presença na posse do novo presidente argentino, no dia 25, e brincou que reclamaria diretamente de Eduardo Duhalde, o atual presidente, por não ter cumprido promessa de mandar a Lula a costela da Patagônia que foi servida em jantar no encontro anual deste ano do Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça).
O encontro Lula-Kirchner se deu por solicitação do argentino. A Folha apurou que a data foi marcada o mais perto possível do segundo turno (dia 18) para reduzir as chances de que o rival de Kirchner, o peronista Carlos Menem, pedisse um encontro.
Como é óbvio, não houve durante a reunião comentários maiores sobre a eleição, até porque Kirchner sentiu-se constrangido em mencionar as pesquisas que lhe dão enorme vantagem.
Para a comitiva argentina, no entanto, "o gesto [de receber o candidato] foi bastante eloquente", uma maneira elegante de dizer que o Palácio do Planalto torce por Kirchner nas eleições presidenciais do país vizinho.


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