São Paulo, terça-feira, 09 de maio de 2006

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"EIXO DO MAL"

Mensagem enviada por Ahmadinejad em meio a impasse nuclear é a primeira do país aos EUA desde 1979

Em carta a EUA, Irã sugere melhorar relação

DA REDAÇÃO

Em um gesto inesperado, o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, enviou ontem uma carta ao presidente americano, George W. Bush, sugerindo "novas soluções" para melhorar as relações entre Teerã e os Estados Unidos, que ganharam um grau de tensão além do normal nos últimos meses devido ao programa nuclear desenvolvido pela república islâmica. Foi o primeiro comunicado conhecido de um líder iraniano a um presidente americano desde o rompimento diplomático entre os dois países, em 1979.
O conteúdo da carta não foi revelado, mas o simples fato de ter sido enviada, no dia em que as seis principais potências nucleares se reuniram em Nova York para discutir as possíveis ações a serem tomadas no âmbito das Nações Unidas em relação às ambições atômicas do Irã, representa um fato político importante.
Ao anunciar o envio da missiva, o porta-voz do governo iraniano não mencionou a controvérsia nuclear, afirmando que ela tratava de forma geral das divergências entre os dois países não só desde a a Revolução Islâmica e a crise dos reféns da embaixada americana em Teerã, em 1979, mas regredindo até o golpe de 1953, apoiado pelos EUA, que derrubou o presidente Mohammed Mossadegh.
À agência de notícias Associated Press, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, disse que a carta, de 17 ou 18 páginas, trata de história, filosofia e religião, mas não representa o início de uma negociação. "[A carta] não fala dos assuntos com os quais estamos lidando de forma concreta", disse Rice, na mais detalhada reação da Casa Branca à iniciativa. "Não há nada que sugira que estejamos num caminho diferente daquele em que estávamos antes da carta."

Pressão
Para Rice, a carta do presidente iraniano pode ser uma tentativa de "mudar de assunto". Ela reiterou que os EUA continuarão a defender uma reação dura do Conselho de Segurança. "Precisamos colocar pressão sobre os iranianos para que eles entendam que haverá um custo para seu desafio contínuo ao sistema internacional", disse a secretária.
O surpreendente gesto de Ahmadinejad, que passou as últimas semanas desafiando as advertências americanas e afirmando que o projeto nuclear iraniano não seria interrompido, foi visto por observadores internacionais como uma tentativa de dividir ainda mais o Conselho de Segurança da ONU. Uma proposta de resolução prevendo a possibilidade de sanções, apresentada na semana passada por EUA, Reino Unido e França, foi rejeitada por Rússia e China, os outros dois membros com direito a veto no CS.
A carta foi enviada por meio da Embaixada da Suíça em Teerã, que abriga uma seção de interesses americana. Um diplomata informou que ela só deveria chegar aos EUA hoje.
John Bolton, o linha-dura que representa os EUA na ONU, reagiu com ceticismo, afirmando que "o paradigma" do comportamento iraniano é o dar a impressão de que está cedendo quando a pressão internacional aumenta, para em seguida "voltar à busca de armas nucleares".
Na Turquia, o principal negociador nuclear do Irã, Ali Larijani, manifestou esperança de que a iniciativa de Ahmadinejad possa ter efeito positivo na crise, advertindo que ela não representa um recuo no programa nuclear. "Talvez isso leve a uma nova abertura diplomática. Mas é preciso dar tempo", disse.
A expectativa era de que a nova iniciativa iraniana fosse abordada na reunião de ontem, em Nova York, entre os chanceleres de EUA, Reino Unido, França, China e Rússia, membros permanentes do CS, da qual também participariam os chefes da diplomacia da Alemanha e da UE. O embaixador da China na ONU, Wang Guangya, disse que encontro se ocuparia "do futuro e do pensamento estratégico sobre como lidar com Irã", reforçando a impressão de que os planos dos EUA de acelerar as discussões práticas em torno de possíveis punições receberiam um banho de água fria.
Rússia e China se opõem à proposta de fazer referência ao Capítulo 7 da Carta da ONU, que abriria caminho para sanções.


Com agências internacionais


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