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ARTIGO
Israel substitui Saddam por Ahmadinejad como inimigo útil
Convém a Netanyahu retratar o Irã como grande perigo à existência israelense,
mas incluí-lo no pacote da questão palestina só atrapalharia as duas soluções
ADRIAN HAMILTON
DO "INDEPENDENT"
COMENTA-SE ÀS vezes
que, se o presidente do
Irã, Mahmoud Ahmadinejad, não existisse, os israelenses teriam que inventá-lo.
Que prova melhor é preciso da
ameaça grave que o país enfrenta do que um homem que
afirma que o Estado de Israel
deveria ser extirpado do mapa
do Oriente Médio?
Israel é obcecado pelo Irã.
Basta conversar com qualquer
israelense, ouvir qualquer discurso de um político israelense
ou estudar a política de segurança que está sendo desenvolvida pelo novo governo de Binyamin Netanyahu: o Irã está
sempre presente.
Uma ameaça crescente que
intimida o país com a possibilidade de um ataque nuclear e incentiva o Hamas e o Hizbollah,
que agem com sua procuração,
a perseguir o Estado judaico.
A razão dessa obsessão é evidente. Embora o Irã possa não
ameaçar Israel diretamente
com uma invasão armada, seu
desenvolvimento nuclear desafia a segurança de Israel, como
única potência atômica na região. Some-se a isso o apoio dado ao Hamas e ao Hizbollah, e
fica fácil ver por que o Irã pode
ser visto como motivo principal
dos temores israelenses.
Por mais reais que possam
ser esses temores, também é fato que convém a Israel retratar
o Irã como grande perigo a sua
existência. Com a queda de
Saddam Hussein, Israel passou
a precisar de um rival suficientemente temível para justificar
suas armas nucleares secretas e
a alegação de que a segurança
precisa necessariamente se impor a outras considerações na
relação com seus vizinhos.
Mais ainda agora, que os
EUA avançam para tratativas
diretas com o Irã e pressionam
o novo governo israelense a iniciar conversações substantivas
com os palestinos.
"Grande barganha"
De fato, na visita que fez a
Washington nesta semana, o
presidente israelense, Shimon
Peres, utilizou o Irã muito especificamente para fazer frente
a essas pressões. Sim, disse Peres, preparando o caminho para a visita de Netanyahu ainda
neste mês, vamos falar com os
palestinos, mas vocês, em troca, terão que neutralizar o Irã.
Como "grande barganha", é
uma política inteligente.
Como maneira de realmente
avançar, o presidente Obama
erraria se sequer a levasse em
conta. Embrulhar o Irã e a Palestina num único pacote, dessa maneira, apenas tornaria
muito bem difícil solucionar
qualquer um dos problemas.
O Irã pode, de fato, representar um problema para a segurança regional.
Mesmo que desconfiemos
que possa ter a pior das intenções ao desenvolver sua tecnologia nuclear -e Teerã nega
veementemente qualquer intenção de produzir armas nucleares-, o Irã parece ser movido muito mais pelo medo de
ataque militar dos americanos
e de ser cercado por países árabes sunitas hostis
George W. Bush deu ao país
persa motivos de sobra para
preocupar-se mais com esses
dois pontos do que por qualquer ambição de atacar Israel.
Ahmadinejad certamente
acha útil intensificar a retórica
antissionista como maneira de
anunciar as credenciais islâmicas do Irã no mundo árabe.
O Irã também acha útil ajudar a financiar e armar movimentos radicais na região, em
parte pela mesma razão.
Mas Israel não é sua preocupação ou seu alvo principal
atualmente. Nem nunca o foi,
nem mesmo sob o aiatolá Ruhollah Khomeini (1900-1989).
Acusar o Hamas e o Hizbollah de serem meros agentes
que atuam com procuração de
Teerã é sinal de incompreensão
total da natureza desses grupos
e de criação de uma desculpa
conveniente para não chegar a
um acordo com eles.
Rota de colisão
Se Obama e o Ocidente quiserem dialogar com o Irã, terão
que fazê-lo nos termos deste.
Complicar a questão, levando
em conta as exigências de Israel, será contraproducente.
No momento, EUA e Israel se
encontram em rota de colisão.
Netanyahu recuou do conceito de uma solução de dois
Estados e não sinaliza mudança de rumo na expansão de assentamentos ou outras questões controversas.
O governo Obama, por outro
lado, insiste em que Israel deve
parar com a ampliação dos assentamentos e iniciar diálogo
com vistas à criação de um Estado palestino separado.
Em discurso no Comitê
Americano-Israelense de Assuntos Públicos, Shimon Peres
não sugeriu que o governo Netanyahu esteja preparado para
fazer quaisquer concessões importantes aos palestinos.
Como não houve nada no discurso do vice-presidente Joe
Biden perante a mesma audiência que indicasse que o governo americano esteja preparado para recuar na exigência
do fim dos assentamentos e da
solução de dois Estados.
Incluir o Irã nesta mistura
não vai ajudar.
Isso apenas confunde a questão, beneficiando Netanyahu.
Se a proliferação nuclear no
Oriente Médio é realmente a
preocupação primordial de Israel, talvez o país devesse pautar-se pelo exemplo de Obama
e oferecer-se a colocar em discussão seu próprio arsenal nuclear. Se o fizesse, a bola seria
devolvida para o campo do Irã.
Tradução de CLARA ALLAIN
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