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Ingrid dá guinada e passa a atacar Uribe
Ex-refém, que antes defendeu possibilidade de terceiro mandato, adota discurso social e aponta isolamento regional do país
Ex-candidata diz que é "de esquerda", defende seu projeto político, e mostra-se incomodada com críticas
aos mediadores europeus
Jacky Naegelen/France Presse
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Ingrid com o vice-presidente do Senado francês, Roland Du Luart, e os filhos (ao fundo), durante sessão em sua homenagem
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A BOGOTÁ
Menos de uma semana depois de ser resgatada espetacularmente do cativeiro, a ex-candidata a presidente da Colômbia Ingrid Betancourt consolidou ontem a guinada iniciada
na véspera em relação ao governo de Álvaro Uribe. Se em suas
primeiras entrevistas foi pró-Uribe, admitindo até o terceiro
mandato do presidente, ontem
ela declarou que não teria votado nele e que "a Colômbia está
isolada na região".
"[A Colômbia] é o único país
que tem guerrilha e por isso estamos na extrema direita.
Quem elegeu Uribe foram as
Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, o grupo
que a fez refém]. Se não existissem as Farc, não existiria Uribe. Os colombianos votaram
em Uribe porque estão até o
pescoço com as Farc", disse ela,
numa nítida mudança de tom,
na véspera de completar sete
dias de libertação.
As declarações foram à BBC
Mundo em Paris e não chegaram a surpreender o meio político e diplomático em Bogotá,
onde ela já é vista como potencial opositora de Uribe e teve
31% de intenções de votos numa pesquisa publicada no último domingo. Mas esse percentual só existe num cenário: com
o próprio Uribe fora da disputa.
Com ele, ninguém tem a menor
chance, nem ela.
Segundo Betancourt, sua "divergência fundamental com ele
é a natureza da guerrilha: Uribe
concebe o problema colombiano como uma crise de violência,
de segurança, que cria um mal-estar social. Eu penso o contrário, que é porque há um mal-estar social que há violência".
Apesar disso, não classificou as
Farc como de "esquerda".
"Êxito ou fracasso"
Ela não descartou uma possível candidatura à Presidência:
"Os espaços têm que se abrir
naturalmente. Se vejo em algum momento que é bom para
a Colômbia que eu esteja aí, aí
estarei", disse, posicionando-se
no espectro político oposto ao
de Uribe: "Sempre serei de esquerda". Na véspera, ela dissera
que o presidente precisa "abandonar a linguagem do ódio".
Em entrevista à Folha, o assessor e ideólogo de Uribe José
Obdulio Gaviria advertiu que
Betancourt só tem chances na
política colombiana se alinhada com Uribe: "Ela precisa definir se seu programa será uma
continuidade do presidente
Uribe ou de oposição. Isso determinará seu êxito ou seu fracasso."
Na oposição, o senador e
também presidenciável Gustavo Petro, do Polo Democrático
Alternativo, disse à Folha que
a guinada de Betancourt é "natural". "Creio que havia carga
emocional enorme e até fragilidade física nos primeiros momentos da libertação [quando
ela foi simpática com Uribe].
Com o tempo, ela vai ter cada
vez mais condições de refletir
com serenidade sobre o que
acontece na Colômbia".
Pró-mediadores
Na avaliação colombiana, um
dos fatores que podem ter empurrado Betancourt para a oposição a Uribe -além das origens políticas distintas (ela era
do partido verde Oxigênio)-
foi a decisão do presidente de
romper com os mediadores
franceses e suíços empenhados
no diálogo entre o governo e as
Farc para a libertação de reféns. Ela, que tem dupla nacionalidade, colombiana e francesa, considera "muito importante" manter os mediadores.
"O problema dos seqüestrados requer o trabalho de muita
gente. Uma pessoa só não pode
conseguir [a libertação]", disse.
Ainda há 25 seqüestrados políticos e cerca de 700 comuns em
poder das Farc.
Ontem, Betancourt foi homenageada pelo Senado da
França e pediu aos congressistas que gravem vídeos pela libertação dos demais reféns para serem transmitidos na marcha prevista para o próximo dia
20 na Colômbia. Ela própria
decidiu não comparecer, a pedido da família.
Na entrevista à BBC mundo,
Betancourt fez um apelo aos
presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e do Equador, Rafael Correa: "Não me importa
que Chávez tenha contato com
as Farc, se este contato faz com
que tenha influência sobre eles
e que, através dessa influência,
possa convencê-los a libertar
meus companheiros".
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