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O parto da montanha
Mais de 2.000 pessoas aguardam início do resgate de 33 mineiros, na semana que vem
LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL A COPIAPÓ (CHILE)
Bastou o governo chileno
anunciar a iminência do resgate dos 33 homens que estão confinados a 700 metros
de profundidade desde 5 de
agosto (2 meses e quatro dias
hoje), e mais de 1.000 jornalistas acorreram ao deserto
de Atacama.
Objetivo: ver o "parto da
montanha", como muitos se
referem à saída dos homens
da mina de cobre.
Somem-se aos jornalistas
todo o pessoal técnico, eletricistas, marceneiros, seguranças, suporte.
Facilmente o exército "invasor" no território da mina
atinge 2.000 pessoas. (Isso
sem contar operários, engenheiros, médicos e enfermeiros diretamente envolvidos
nos trabalhos de resgate.)
Toda essa gente está concentrada em uma área que
até bem pouco era equivalente à de 2,5 campos de futebol.
Agora, são 4,5 campos,
graças a trabalhos de terraplenagem em um morro.
O resultado é que se transformaram em figurantes as
famílias que levantaram o
"acampamento Esperanza"
na porta da mina, como forma para pressionar as autoridades a se empenhar na localização dos mineiros então
desaparecidos.
Os 33 ficaram 17 dias sem
que se soubesse se estavam
vivos ou mortos. Agora, os familiares submergiram em
um caldo de câmeras, fios,
microfones, gravadores, geradores.
20 MIL ENTREVISTAS
Lilian Ramirez, 51, mulher
do mineiro Mario Gomez, 63,
não esconde o cansaço da rotina de entrevistas ("já terão
sido umas 20 mil"), mas não
se nega a dar mais uma.
Ela está acampada há dois
meses acompanhando os trabalhos. E só viu a população
de jornalistas crescer.
"Agora, quando acordo,
tomo o cuidado de abrir o zíper da barraca aos poucos.
Porque sempre tem um jornalista esperando na porta
com um gravador."
Lilian é uma celebridade.
Foi o marido dela, Mario Gomez, o mais velho do grupo
dos mineiros, o que redigiu o
bilhete para a superfície: "Estamos bem no refúgio os 33".
A frase, escrita com um
pincel atômico, foi a primeira
prova de vida dos desaparecidos. Muitos já os tinham
por mortos.
No acampamento, a grande expectativa da tarde de
ontem era a chegada da primeira-dama chilena, Cecilia
Morel, mulher do presidente
Sebastián Piñera.
Ela iria praticar com os mineiros um intensivão de ginástica laboral, por meio de
circuito de TV. Alegava-se
que a iniciativa os ajudaria a
ficar em forma para o resgate.
No local, surgiu uma cidade em meio ao deserto empoeirado, cortado aqui e ali
por dunas de areia finíssima.
Em vez das pequenas barracas que antes abrigavam as
famílias dos mineiros (e onde
algumas, como a de Lilian,
continuam vivendo), agora
há grandes estruturas geodésicas pré-moldadas de até
seis metros de diâmetro. Fora
os caminhões e contêineres
das grandes redes de TV.
Na única rua do acampamento, um tipo frequente de
veículo são os que transportam banheiros químicos. Já
instalaram mais de cem.
No meio da tarde, uma caminhonete dessas foi impedida de seguir em frente. Assessores de Piñera não queriam que a primeira-dama
surgisse nas imagens de TV
com banheiro no fundo.
ZONA DE TRIAGEM
O governo chileno não
pretende simplesmente resgatar os mineiros e levá-los
para um hospital, a fim de
tratá-los das micoses de pele
e dos problemas dentários
que desenvolveram.
Em vez disso, está levantando o que chama de "Zona
de Descanso", uma estrutura
com cinco salas para que os
mineiros se encontrem com
suas famílias. Há ainda sala
de imprensa, aposento privado para o presidente, cozinha e banheiros. Tudo com
ar-condicionado.
Ao lado, será instalada a
"Zona de Triagem", com um
ambulatório de primeiros socorros e uma policlínica, e
mais banheiros e chuveiros.
De helicóptero, bastariam
15 minutos para levar os mineiros até o Hospital Regional San José del Carmen, de
Copiapó, equipado com UTI
e um andar inteiro reservado
para atender aos resgatados.
Ouça relato da repórter
folha.com.br/mm811814
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