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"Saddam é esperto", diz entrevistador
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ditador iraquiano, Saddam
Hussein, é um homem esperto,
que pode ter armas de destruição
em massa, mas não possui ligações com a rede terrorista Al Qaeda, de Osama bin Laden.
Foi essa a impressão, relatada
em entrevista telefônica, de Londres, à Folha, que teve o ex-deputado e ex-ministro britânico Tony
Benn, 78, após visita de três dias
ao Iraque, semana passada.
Benn, membro do Partido Trabalhista, o mesmo do premiê
Tony Blair, teve uma reunião com
Saddam transmitida pela TV britânica -a primeira entrevista do
líder iraquiano em uma década.
Opositor da guerra, ele viajou
ao Iraque para "explorar as possibilidades de paz". Diz que o encontro, em um palácio nas redondezas de Bagdá, foi "amigável".
Espécie de guru da esquerda
britânica, três vezes ministro em
governos trabalhistas nos anos 70
e deputado por 51 anos, Benn,
desde a vitória trabalhista, em
1997, vem criticando sistematicamente a conversão de seu partido
a idéias liberais e o alinhamento
automático aos EUA.
Folha - O sr. saiu da conversa convencido de que Saddam não tem
armas de destruição em massa?
Tony Benn - Eu não sei se acredito em Saddam. Acreditarei apenas nos inspetores da ONU, que
até agora não encontraram nada.
Na questão das ligações com a Al
Qaeda, não acredito que haja nenhuma relação porque há uma
teologia e uma prática completamente diferentes. A Al Qaeda segue o fundamentalismo, e o Iraque é secular.
Folha - O sr é acusado pelo governo Blair de fazer apologia de Saddam. O que acha disso?
Benn - Blair está em uma pequena minoria no Reino Unido. Ele
não deveria apoiar Bush, porque
Bush quer uma guerra por petróleo. Não tem nada a ver com armas de destruição em massa.
Folha - O Iraque sem Saddam não
seria um lugar melhor?
Benn - Não, porque seria controlado por generais americanos. E é
provável que haja o desmembramento do Iraque.
Folha - Quais seriam as consequências no Reino Unido?
Benn - A consequência de longo
prazo, muito além do bombardeio, será a desconfiança entre
cristãos e muçulmanos, como
ocorreu nas Cruzadas 900 anos
atrás. Quando Bush falou de uma
Cruzada contra o terrorismo, devia estar louco, porque todos os
muçulmanos do mundo sabem o
que as Cruzadas significaram. O
que sei é que, se eu fosse Bin Laden, iria querer muito a guerra,
porque Bush e Blair estarão recrutando pessoas para a Al Qaeda a
cada dia.
Folha - O sr. acha que a guerra pode ainda ser evitada?
Benn - Acho que Bush irá à guerra em uma questão de semanas.
Se Blair dissesse a Bush que não
pode apoiá-lo, Bush ficaria isolado mesmo nos EUA. Se Bush levasse os EUA à guerra sozinho,
muitos americanos diriam que
esse poderia ser um novo Vietnã.
Folha - O sr. é um raro ocidental
que teve contato com Saddam. Que
impressão teve?
Benn - Antes da entrevista, discutimos quais seriam os assuntos.
Ele é um advogado, não é um general, é um homem muito esperto. Não quis conhecer as perguntas antes e suas respostas eu considerei interessantes.
Folha - A imprensa britânica criticou o sr. por não ter sido duro o suficiente na entrevista.
Benn - Eu não sou jornalista. Se
todos os diplomatas se espelhassem em jornalistas, haveria uma
guerra nuclear todos os dias.
Folha - O sr. saiu com a impressão
de que o Iraque é realmente a ditadura mostrada na TV?
Benn - Saddam é um ditador
brutal e sabe que eu penso isso.
Não fui apoiá-lo. Se você mata um
país de fome e o bombardeia, as
pessoas não têm tempo para a política. A única forma de se livrar
de Saddam é deixar os iraquianos
lidarem com ele.
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