São Paulo, domingo, 10 de março de 2002

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TV CBS mostra imagens inéditas do drama no WTC

CARYN JAMES
DO "THE NEW YORK TIMES"

A sensação é a de estar sendo enterrado vivo. Você está no chão, cinzas caem sobre sua cabeça como se estivessem sendo jogadas com uma pá e ouvem-se destroços caindo sobre carros como se fossem granizo.
Sob a perspectiva da câmera de Jules Naudet, você correu à rua após fugir do hall da primeira torre do World Trade Center a desabar, seis minutos antes da queda. Quando ela desaba, você é jogado no chão. Tudo fica escuro. Alguém grita: "Vamos, antes que o carro exploda".
Apesar de apenas seis meses terem se passado desde que o WTC foi atacado, parece que não conseguimos mais ficar chocados com os acontecimentos daquele dia.
Mas esse trecho, que deve passar hoje nos EUA em um programa de duas horas chamado "9/11" no canal de TV CBS, tem um caráter de urgência tão forte que nos lembra do quão inimagináveis aqueles eventos costumavam ser.
O programa é uma edição de 180 horas de filmagem realizada pelos irmãos Jules e Gedeon Naudet, que, desde junho de 2001, estavam fazendo um documentário sobre um bombeiro que trabalhava perto do World Trade Center.
Gedeon, 31, era o cineasta mais experiente. Jules, 28, estava aprendendo a filmar e, em 11 de setembro, havia seguido o chefe do batalhão para praticar. Mesmo antes de entrar na primeira torre, ele demonstrou ter um notável instinto de documentarista. Ouvindo um barulho, ele apontou a câmera para cima e filmou o primeiro avião batendo na torre.
A CBS fez um bom trabalho de edição. Robert de Niro aparece como apresentador, advertindo que o linguajar dos bombeiros é pesado. O programa é narrado por James Hanlon, um bombeiro que trabalhara com os Naudets em seu documentário, e pelos dois irmãos, que descrevem o que filmaram e porquê. Mas a maioria das imagens e sons fala por si.
Apesar de o copião do filme dos irmãos Naudet ter sido tomado emprestado pelo FBI (polícia federal dos EUA) e exibido em estações de bombeiros, mostrá-lo na TV é um passo diferente.
Se há um vídeo da execução de Daniel Pearl, é razoável temer que uma cópia acabe na internet. Mas nada em "9/11" chega perto desse tipo de exploração mórbida. Não há nada no programa que não deva ser mostrado e a maior parte do que é exibido é comovente.
A polêmica em torno do filme é que é chocante. Na semana passada, o âncora de um programa do canal Fox entrevistou o senador Jon Corzine, de Nova Jersey, que disse que famílias de vítimas estavam preocupadas com a "exibição gráfica" de mortes.
Bem, não há tais exibições. O âncora perguntou se a CBS era "irresponsável" por exibir o programa, mas não se Corzine havia visto o filme. E, quando o âncora disse que o programa havia sido feito por "cineastas franceses", conseguiu fazer com que "franceses" soasse como "membros da Al Qaeda". (Os irmãos Naudet nasceram na França e moram em Nova York desde 1989. Jules é cidadão americano e Gedeon deve obter sua cidadania em breve).
O filme é atual porque revela o quão rapidamente até mesmo as imagens mais horripilantes de 11 de setembro foram absorvidas, transformadas em algo comum: uma forma necessária de entender uma realidade terrível, mas algo que torna aqueles eventos perigosamente fáceis de esquecer.



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